Nas entrelinhas: Uma agonia a cada dia

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O discurso de Lula é uma vacina contra o que ainda está por vir contra o ex-presidente da República e o PT por causa da Lava-Jato e de outras investigações

Detrás da narrativa do golpe contra a presidente Dilma Rousseff existe um país arrasado, no qual ninguém sabe o que vai acontecer depois do impeachment, cujo curso segue de acordo com um cronograma preestabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É difícil apartar a crise econômica, que já registra mais 10 milhões de desempregados, da crise ética e política. Mas será preciso fazer um inventário de perdas e danos, ou seja, abrir a caixa-preta das contas do Tesouro, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e dos fundos de pensão controlados pelo governo, que ameaçam quebrar o nosso sistema financeiro, porque o rombo é muito grande e pode arrastar também alguns bancos privados.

Essa megapedalada é a herança maldita dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que está sendo desnudada pelos órgãos de controle do país — o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público Federal e a Polícia Federal —, em investigações que não se restringem mais à Operação Lava-Jato. O modelo de capitalismo de Estado adotado pelo PT, cujo vértice era ocupado pelo “cluster” liderado pela Petrobras, entrou definitivamente em colapso. Depois das maiores empreiteiras do país, as “campeãs nacionais”, favorecidas por empréstimos camaradas, estão sendo arrastadas para o olho do furacão da crise.

“Cada dia será uma agonia”, previu o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, durante palestra promovida pela Universidade de Harvard no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos, a respeito do impeachment e da possibilidade de um governo encabeçado pelo vice-presidente Michel Temer. “Estou convencido, com as circunstâncias de fato que existem hoje, que não existiu um mensalão e não existiu uma Lava-Jato. É toda uma operação conjugada. O mensalão foi parte do iceberg, que ainda tem parte submersa”, disse. Janot corroborou a existência de um “projeto político” por trás do esquema de corrupção da Petrobras.

A agonia já começou. Ontem, foi eleita a comissão especial do Senado que vai examinar o pedido de afastamento; hoje, a comissão será instalada, com a eleição de seu presidente e a indicação do relator. O PT e seus aliados tentam retardar o afastamento da presidente Dilma do cargo, o que deve ocorrer tão logo a comissão conclua seu trabalho e o pedido de admissibilidade seja aprovado em plenário, por maioria simples, o que deverá correr até 10 de maio, segundo as previsões mais otimistas. O cavalo de batalha do momento é para impedir que senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) seja o relator, escolha prevista para hoje, na primeira reunião da comissão.

São combates inglórios para os governistas, mas que servem para reforçar a narrativa do golpe e tentar ampliar as adesões de personalidades e mobilizações contra o impeachment. Ontem, por exemplo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou do seminário da Aliança Progressista, organização que reúne partidos e movimentos de esquerda de vários países, como Itália, Israel, Argentina, Nepal e Alemanha. Lula disse que “o que está em jogo nesse momento é a continuidade do processo democrático no Brasil e em toda a região”.

Oposição dura
Segundo Lula, “a oposição, derrotada nas urnas pela quarta vez consecutiva, optou pela estratégia golpista para voltar ao poder”. Para o petista, os que se opõem ao governo querem implantar “por caminhos autoritários, a agenda neoliberal derrotada nas urnas; a agenda de desconstrução das conquistas sociais e de entrega do patrimônio nacional”. Formou-se “uma aliança oportunista entre a grande imprensa, os partidos de oposição e uma verdadeira quadrilha legislativa, que implantou a agenda do caos”, disse.

O discurso de Lula é uma espécie de vacina contra o que ainda está por vir contra o ex-presidente da República e o PT por causa da Lava-Jato e de outras investigações. Ao se passar por vítima, coesiona os militantes petistas sem fazer autocrítica dos erros cometidos. Sabe que as mobilizações petitas não têm força para impedir que a presidente Dilma seja afastada pelo Senado, mas prepara o terreno para uma dura oposição ao governo de transição que será formado pelo vice-presidente Michel Temer, até as eleições de 2018. O passo seguinte será responsabilizá-lo pelo agravamento da situação da economia, propor o seu impeachment e a convocações de eleições presidenciais com as municipais. Essa é uma bandeira de fácil sustentação, embora a decisão caiba ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dependa da renúncia ou cassação do mandato de Temer.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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