Depois de ferir de morte caciques de todos os grandes partidos e jogar na lona a imagem do presidente da República, a Lava-Jato acirrou as contradições, disputas políticas e idiossincrasias no Supremo
O vetor da crise ética continua sendo uma força dominante no processo político, com reflexos eleitorais de ordem objetiva. A Lei da Ficha Limpa promove um expurgo de milhares de políticos impedidos de disputar as eleições de 2018, em todo o país, a começar pelo mais popular, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas de opinião para a Presidência. Não há um só dia em que o noticiário não seja impactado pela Operação Lava-Jato, seja em razão de novas operações, como a de ontem, que defenestrou e prendeu um dos delegados da Polícia Civil mais poderosos do Rio de Janeiro e desmantelou um esquema de desvio de recursos do sistema prisional fluminense, seja em decorrência dos processos em curso no Judiciário, com a iminente prisão de Lula em decorrência de sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, a 12 anos e 1 mês de prisão.
Depois de ferir de morte caciques de praticamente todos os grandes partidos e jogar na lona a imagem do presidente da República, a Lava-Jato acirrou as contradições, disputas políticas e idiossincrasias no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, enquanto a Primeira Turma do STF, por unanimidade, recebeu a denúncia e tornou réu o senador Romero Jucá (RR), líder do governo no Senado e presidente do MDB, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, a Segunda Turma do STF decidiu que duas ações que tratavam da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância não serão mais julgadas pelo plenário do tribunal. Voltarão a ser julgadas na própria Turma.
Foi uma resposta da maioria de seus integrantes à decisão da presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, que se recusa a levar o assunto à rediscussão do plenário. Se compararmos o Supremo a uma embarcação em meio à tempestade, diríamos que se trata de um motim a bordo, que pode causar um grande naufrágio à Lava-Jato. A Turma é formada por Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Celso de Mello e Edson Fachin. A decisão foi tomada por 3 a 1 (Lewandovski, Gilmar e Toffoli contra Fachin), em reposta à presidente do Supremo, que ontem, em São Paulo, voltou a dizer que não se submete à pressão de políticos que querem que a Corte revise o entendimento sobre cumprimento da pena após condenação em segunda instância. “Eu não lido, eu simplesmente não me submeto à pressão”, declarou Cármen Lúcia.
Estupro
Uma das ações em análise no STF sobre prisão após condenação em segunda instância é relacionada diretamente ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os advogados do ex-presidente Lula questionam a prisão, com o argumento de que, segundo a Constituição, “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. O ministro Fachin havia negado o pedido e decidido que a palavra final sobre o caso caberá ao plenário do STF, no qual já aguardavam julgamento um habeas corpus e outras duas ações que poderão reverter o atual entendimento do STF.
Ontem, Ricardo Lewandowski, sugeriu a retirada de dois casos dos quais é relator. A recomendação foi aceita pela maioria dos demais colegas. No primeiro caso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidira soltar o condenado, substituindo a pena de prisão por prestação de serviços à comunidade, o que provocou a perda de objeto da ação. No segundo habeas corpus, o ministro considerou que a situação era diferente: a decisão de primeira instância permitia que o condenado recorresse em liberdade até o trânsito em julgado, isto é, até a última e quarta instância. Lewandowski alegou que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), de segunda instância, havia contrariado a sentença do juiz e mandou prender o réu sem que houvesse pedido por parte da acusação.
Nesse caso, seria uma situação diferente e, por isso, deveria ser analisada pela própria Segunda Turma. O ministro adiantou que votará pela libertação do preso, condenado por estupro. Fachin votou contra por causa da semelhança com as outras ações sobre prisão após segunda instância, principalmente a de Lula, mas foi vencido. A decisão acirra ainda mais os ânimos na Corte. Porque força a rediscussão da jurisprudência sobre execução imediata da pena por presos condenados em segunda instância, caso do ex-presidente da República. É tudo o que Fachin e Cármen Lúcia não querem.
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