Nas entrelinhas: Rito de passagem

compartilhe

O resultado das eleições no Congresso é favorável à aprovação das reformas da Previdência e trabalhista, eixo do ajuste fiscal e da retomada do crescimento

A reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a Presidência da Câmara dos Deputados, em primeiro turno, muito mais do que uma vitória do presidente Michel Temer, foi um sinal de que o país recuperou a estabilidade política, mesmo diante da crise ética. Uma espécie de rito de passagem para as eleições de 2018, para o qual colaboraram o Palácio do Planalto, ao isolar e derrotar os dissidentes de sua própria base, adversários declarados da Operação Lava-Jato, e o Supremo Tribunal Federal (STF), cujo decano, ministro Celso de Mello, rechaçou a tentativa de judicializar a disputa. Nada disso, entretanto, ofusca o brilho da vitória pessoal de Maia. À frente da Casa, em poucos meses, conquistou a confiança da maioria de seus pares. Maia obteve 293 votos. Esta é a segunda vitória expressiva do governo: na véspera, o senador Eunício de Oliveira (PMDB-CE) foi eleito para a presidência do Senado, também com grande votação.

O segundo colocado, Jovair Arantes (PTB-GO), obteve105 votos. É uma votação significativa, que possibilita ao líder dissidente negociar as condições de sua permanência na base do governo ou liderar a oposição, que acabou isolada e dividida: André Figueiredo (PDT-CE), apoiado oficialmente pelo PT, obteve 59 votos, ou seja, foi traído; Júlio Delgado (PSB-MG) obteve 28 votos; e Luíza Erundina (PSOL-SP), 10 votos. Registra-se o isolamento de Jair Bolsonaro (PSC-RJ), que obteve apenas quatro votos. PMDB, PSDB, PP, PR, PSD, PSB, PRB, PTN, PPS, PHS, PV e PTdoB formaram uma ampla coalizão de apoio ao governo, que incorporou, inclusive, quatro partidos do antigo Centrão (PP, PR, PSD e PRB).

Mas há sinais de turbulência nos dois principais partidos da base, PMDB e PSDB. A eleição do primeiro vice-presidente foi uma zebra. O candidato oficial do PMDB, indicado pelo Palácio do Planalto, deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), obteve 133 votos e ficou em terceiro lugar. Irmão do ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima, um dos principais aliados de Temer, foi atropelado facilmente pelo deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), que depois derrotou o segundo colocado, o veterano Osmar Serraglio (PMDB-PR), ao obter 265 votos. No PSDB, houve uma disputa surda na bancada, na qual a deputada Mariana Carvalho (RO) deslocou da segunda secretaria um dos caciques da legenda, o deputado Carlos Sampaio (SP). Surpresa também no PSB, onde o candidato do clã Arraes, João Fernando Coutinho (IPE), perdeu a terceira secretaria para seu companheiro de bancada JHC (AL), também no segundo turno.

Reformas
O resultado das eleições no Congresso é favorável à aprovação das reformas da Previdência e trabalhista, que estão no eixo do ajuste fiscal e da retomada do crescimento. A primeira tem por objetivo restabelecer o equilíbrio das contas públicas, não somente em nível federal, mas também nos estados e municípios, alguns dos quais com a previdência em colapso; a segunda, visa estancar a onda de desemprego e flexibilizar a legislação trabalhista, pois o problema não é só consequência da crise econômica, mas também da informatização dos serviços e da robotização das indústrias.

Alguns analistas que estudam as votações do Congresso acreditam que a derrota e fragmentação do antigo Centrão facilitará a vida do Palácio do Planalto, mas há que se considerar o fato de que essas reformas enfrentarão forte oposição das corporações encasteladas no Estado, inclusive no Judiciário, como é caso da previdenciária, e também do movimento sindical, que tradicionalmente resiste a todas as mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), originária do Estado Novo do presidente Getúlio Vargas. Convém ao governo aprovar as reformas o mais rápido possível, pois a aproximação das eleições de 2018 tende a exercer força centrífuga sobre a sua base e fazer recrudescer o fisiologismo.

No embalo das vitórias no Congresso, o presidente Temer blindou um de seus principais colaboradores: medida provisória recriou a Secretaria-Geral da Presidência da República, para o qual foi nomeado Moreira Franco, atual secretário-executivo do Programa de Parceria de Investimentos (PPI), que ganha status de ministro. Temer também deu novas atribuições ao ministro Alexandre de Moraes, cuja pasta passa a se chamar Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Transformou em Ministério a Secretaria de Direitos Humanos, cuja titular é a desembargadora Luislinda Valois. Finalmente, nomeou o deputado tucano Antônio Imbassahy para a Secretaria de Governo. Na contramão do ajuste fiscal, passou de 26 para 28 o número de ministérios.

Dona Marisa
Um gesto de afetividade, solidariedade e tolerância política: o abraço de condolências do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, logo após declarada a morte cerebral da ex-primeira-dama Marisa Letícia ontem à tarde.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

Posts recentes

De olho nas emendas parlamentares, Flávio Dino vira “caçador de jabutis”

Dino suspendeu os efeitos do dispositivo legal que exumava as emendas secretas. O dispositivo previa…

1 dia atrás

Orçamento sob medida para as eleições: R$ 61 bi em emendas parlamentares

Na prática, o que se vê é a substituição do planejamento público por uma lógica…

3 dias atrás

Supostos negócios de Lulinha com Careca do INSS são dor de cabeça para Lula

Estava tudo sob controle na CPMI, até aparecerem indícios de que Antônio Carlos Camilo Antunes,…

6 dias atrás

Acordo entre governo e oposição garante aprovação do PL da Dosimetria

O projeto altera a Lei de Execução Penal, redefine percentuais mínimos para progressão de regime…

7 dias atrás

Com Lula favorito, Flávio Bolsonaro desidrata a candidatura de Tarcísio

A desaprovação ao governo Lula não traduz automaticamente uma vantagem eleitoral para a oposição. A…

1 semana atrás