Enquanto a economia brasileira tenta renascer das cinzas, a velha política impede o surgimento de uma nova elite dirigente
As operações de busca e apreensão nas casas de Joesley Batista, presidente do conselho de administração da JBS, de Wesley Batista, vice-presidente do conselho da empresa, e de Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES, e as revelações do casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura sobre o financiamento das campanhas dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e de seus aliados no exterior, como Hugo Chávez, na Venezuela, são demonstrações de que o Brasil precisa reinventar a política e a economia para sair da encalacrada em que entrou. O governo Temer pode até abrir caminho para isso, mas não vai dar conta dessa tarefa, que será o grande debate das eleições de 2018.
Deflagrada na sexta-feira, a Operação Bullish, da Polícia Federal, investiga fraudes e irregularidades em aportes no valor total de R$ 8,1 bilhões, no período de 2007 a 2011, concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por meio do BNDESPar, braço de participações do banco, ao frigorífico JBS. A compra de ações da JBS por preço superior à média na Bolsa de Valores pode ter representado um desperdício de R$ 30 milhões. Com um corpo técnico de excelência e com fama de honesto, essas operações só foram possíveis porque o banco público de fomento encampou uma concepção de desenvolvimento e uma estratégia de investimentos que apostava na concentração de capital e na projeção internacional dos chamados “campeões nacionais”.
Essa foi uma opção ideológica, que se encaixava como luva no projeto de poder do PT e atendia às ambições pessoais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que conduziu seu segundo governo com o propósito de se tornar o maior líder da esquerda latino-americana, uma espécie de sucessor de Fidel Castro. A presidente Dilma Rousseff, de certa forma, o sucedeu porque demonstrou ser uma “executiva” entusiasmada com esse projeto, com a chamada “nova matriz econômica”. Num mundo em que já não havia a antiga União Soviética e demais regimes comunistas do Leste Europeu, no qual o Estado de bem-estar social estava entrando em colapso na Europa Ocidental e a social-democracia adotava uma estratégia neoliberal, a emergência do Brasil como “novo modelo” seduziu a esquerda tradicional europeia e, com seu viés nacionalista, passou a jogar um papel de relativa importância entre os países emergentes.
O que estava por trás do projeto, porém, não tem nada de novo e avançado. Tratava-se apenas da tentativa de aproveitar o nosso velho “capitalismo de laços” para reinventar capitalismo de Estado, no qual os arranjos acionários com os fundos de pensão e a concentração de capital eram fortemente induzidos pelo BNDES. Mesmo depois da onda de privatizações no fim dos anos 1990 e da abertura da economia, isso foi possível porque o Estado não havia se afastado das atividades econômicas. Na verdade, adotou um modelo de maior capilaridade, pois aumentou o número de empresas que contam com a participação do BNDES e dos fundos de pensão de estatais, ou seja, os laços políticos com o governo. Essa ramificação se revelou mais poderosa do que o modelo de capitalismo de Estado do regime militar.
Renovação
Apesar da semelhança com o México, essa situação é muito superior a de outros países. Estudos comparativos mostram que temos 2,8 vezes a aglomeração na Coreia do Sul, 5,1 vezes a da Itália, 7,8 vezes a do Chile e 12,2 vezes a dos EUA. A formação de cartéis e laços cruzados entre grupos privados nacionais e o Estado, por si só, reduziu a competição da economia, inibiu novos projetos, afastou investidores e empreendedores. Esse modelo, porém, não serviu apenas para a concentração de capital; foi alavancado para o financiamento dos partidos e o enriquecimento pessoal de seus operadores, conforme a Operação Lava-Jato vem revelando. A velha cultura patrimonialista e a tradicional utilização de “caixa dois” eleitoral serviu de caldo de cultura para alavancagem do projeto de poder de Lula, em níveis inacreditáveis, com o agravante de que o sistema eleitoral e a legislação partidária favoreceram o fortalecimento e hegemonia das legendas que ocupavam as posições-chave dessa relação entre Estado e empresas.
Há uma semana, assistimos a marcha do economista Emmanuel Macron ao poder, numa campanha que deslocou do segundo turno os partidos tradicionais da França. O mais jovem presidente francês, aos 39 anos, ex-ministro da Fazenda do socialista François Hollande, rompeu com o governo e em menos de um ano criou o movimento Em Marche, no qual engajou 260 mil membros. No Brasil, isso hoje é inimaginável. A reforma política, mais uma vez, está sendo conduzida para impedir a renovação. Enquanto a economia brasileira, depois de forte recessão, tenta renascer das cinzas, a velha política impede o surgimento de uma nova elite dirigente.
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