A conjuntura não é mais pautada pela crise econômica, mas pela ética na política, devido à Operação Lava-Jato, na qual caciques políticos, sobretudo dos grandes partidos, correm risco de ir para a cadeia
O lado bom das incertezas sobre as eleições de 2018 é a alternância de poder, um dos fundamentos de qualquer democracia digna desse nome. Muito da angústia e da insegurança que todos sentimos em relação ao futuro do país decorre de não sabermos quem vai ganhar as eleições, o que é natural, e do risco de que alguém com o qual não concordamos nem um pouco possa vir a ganhar a eleição, o que é compreensível, mas nem por isso deve alimentar pensamentos de viés antidemocrático. Além da alternância de poder, o outro pilar do regime democrático é o direito ao dissenso, ou seja, de ser oposição. Tantos os vencedores quanto os derrotados precisam se conformar com o resultado das urnas e respeitar as regras do jogo, pois a vitória não é um cheque em branco nem a derrota, o fim do mundo.
A primeira garantia de que estamos em pleno processo democrático é o calendário eleitoral. Ninguém fala em adiar as eleições e seria um completo contrassenso fazê-lo a essa altura do campeonato, com um governo de transição que resulta de um processo de impeachment e goza de baixíssima popularidade. O presidente Michel Temer perdeu o protagonismo reformista que lhe permitiu enfrentar a recessão, reduzir a inflação abaixo da meta e baixar a taxa de juros Selic a níveis inéditos. Quaisquer reformas macroeconômicas ou institucionais, doravante, dependerão do resultado das eleições e do programa de governo que sair vitorioso das urnas. O máximo que pode ser feito agora é a adoção de algumas medidas microeconômicas que melhorem o ambiente de negócios.
A conjuntura não é mais pautada pela crise econômica, mas pela ética na política, devido à Operação Lava-Jato, na qual caciques políticos, sobretudo dos grandes partidos do país, estão diante do risco de ir parar na cadeia, como aconteceu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e talvez aconteça, ainda nesta semana, como ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB). Não por acaso uma ampla coalizão de forças trabalha para mitigar a legislação que promove o expurgo de políticos corruptos que estão sendo impedidos de disputar as eleições com base na Lei da Ficha Limpa e da jurisprudência que possibilita a execução imediata da pena de condenados em segunda instância, como é o caso dos dois citados.
Agora mesmo, o Congresso acaba de aprovar uma lei de improbidade administrativa eivada de inconstitucionalidades, pois limita a atuação dos órgãos de controle do Estado, entre os quais os Tribunais de Contas (que são ligados ao próprio Poder Legislativo e não ao Executivo ou Judiciário), o Ministério Público, a Polícia Federal e a Receita Federal. De igual maneira, discute-se a limitação do foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal, o que pode ser uma boa iniciativa, desde que não haja mudança de jurisprudência quanto à condenação em segunda instância. Caso isso ocorra, a impunidade dos crimes de colarinho branco voltará a ser uma marca registrada do país.
Patrimonialismo
Esse debate sobre a impunidade é acompanhado com grande interesse pela opinião pública, o que dificulta retrocessos em relação à legislação contra corrupção. Até agora, por isso mesmo, todas as tentativas de acabar com a Lava-Jato fracassaram. Com a proximidade das eleições, essa situação ganhou tamanha importância que passou a ser a principal prioridade dos eleitores. É uma mudança de paradigma comparável ao que aconteceu com a inflação, depois do Plano Real. O problema é que a inflação crônica talvez tenha sido mais fácil de derrotar do que o velho patrimonialismo de nossas elites políticas e oligarquias, que substituiu a escravidão como fonte de acumulação de riqueza e privilégios, perpetuando as desigualdades em nosso país.
A propósito, nossas desigualdades regionais têm muitas causas, vão desde as limitações de natureza geográfica às condicionantes histórias da construção do Estado brasileiro. Talvez a principal seja exatamente o patrimonialismo. Com certeza, por isso mesmo, a aposta na industrialização diferenciou a elite paulista. Entretanto, muita água já rolou. O problema do desenvolvimento regional demanda uma política tributária que altere a relação entre estados produtores e estados consumidores na circulação das mercadorias. Essa é outra variável do processo eleitoral.
A terceira variável é a iniquidade social, que está associada ao patrimonialismo e às desigualdades regionais. Também tem a ver com a igualdade de direitos e de oportunidades, no lugar do paternalismo; e com políticas sociais estruturantes, que levem em conta, simultaneamente, a necessidade de investir fortemente na educação e no empreendedorismo; e a prioridade do gasto no combate à miséria e na proteção dos mais vulneráveis.
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