Nas entrelinhas: A queda de braços

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O atabalhoado lançamento do Plano de Demissões Voluntárias (PDV) para servidores públicos federais atropelou a equipe econômica e gerou tensão entre a Fazenda e o Planalto

Os números divulgados ontem pelo Banco Central e pela Secretaria do Tesouro representam, respectivamente, um passo à frente, dois atrás. Explico: o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu, por unanimidade, baixar os juros básicos da economia brasileira de 10,25% para 9,25% ao ano. Foi o sétimo corte seguido na taxa Selic, o que já era esperado pelo mercado. Um passo à frente para a economia. No mesmo dia, as contas do governo registraram um deficit primário de R$ 56,09 bilhões no primeiro semestre deste ano, segundo a Secretaria do Tesouro Nacional. Foi o pior resultado para o período desde o início da série histórica, em 1997, ou seja, em 21 anos, o que não se esperava. Vale dois passos atrás.

A política monetária mira a meta de inflação, que despencou por causa da recessão; já a política fiscal visa controlar o deficit público, que não para de subir. Até então, o maior rombo para esse período havia sido registrado em 2016, chegou a R$ 36,47 bilhões no primeiro semestre. É o terceiro ano seguido em que as contas ficam no vermelho. O resultado primário considera apenas as receitas e despesas, não leva em conta os gastos do governo federal com o pagamento dos juros da dívida pública. Ou seja, o governo está gastando mais do que deveria, onde não deveria; e deixando de fazê-lo em áreas vitais.

Essa situação reflete uma queda de braços entre a equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o do Planejamento, Dyogo Oliveira, que atua em sintonia política com o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ex-titular da pasta, e o núcleo político do Palácio do Planalto. O atabalhoado lançamento do Plano de Demissões Voluntárias (PDV) para servidores públicos federais, por exemplo, atropelou a equipe econômica e gerou muita tensão entre Meirelles e Dyogo, que ontem ganhou a queda de braços, ao emplacar no plano a isenção de Imposto de Renda e de pagamento de INSS para quem aderir, o que pode ser inconstitucional (mais um privilégio para servidores em relação aos demais assalariados).

A decisão sinalizou para os agentes econômicos que a política econômica está com a blindagem fragilizada no Palácio do Planalto. O ministro do Planejamento, desde o desbloqueio das contas inativas do FGTS, tem levado a melhor, graças ao apoio do núcleo político do governo, principalmente Jucá, que conhece o Orçamento melhor do que ninguém no Congresso. Os números, porém, são muito teimosos. De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, as receitas totais recuaram 1,2% em termos reais (após o abatimento da inflação) de janeiro a junho deste ano, na comparação com igual período de 2016, para R$ 664,8 bilhões. As despesas totais, ao contrário, avançaram 0,5% em termos reais, na comparação com os seis primeiros meses do ano passado, para R$ 604,27 bilhões.

Previdência

Na verdade, a Fazenda opera numa faixa muito estreita de manobra, por causa das despesas obrigatórias. Além disso, o rombo da Previdência Social avançou de R$ 60,44 bilhões, nos seis primeiros meses de 2016, para R$ 82,86 bilhões no mesmo período deste ano, um aumento de 37,1%. Para 2017, a expectativa é um resultado negativo de R$ 185,7 bilhões.

Enquanto os economistas do governo fazem projeções considerando a frieza dos números, o Palácio do Planalto analisa os riscos. No momento, o pior dos mundos para o governo é a admissibilidade da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Temer, não o problema fiscal. Passada essa ameaça, teoricamente, a questão da Previdência passa a ser uma prioridade capaz de reagrupar a base governista. O governo acredita que terá condições de aprovar a reforma no Congresso e, assim, sair da armadilha fiscal. É uma aposta no ponto futuro.

O problema é que os humores do Congresso no segundo semestre já não serão iguais aos do primeiro, porque as eleições de 2018 estão logo ali e o governo amarga grande impopularidade. Dependendo da forma como a denúncia da PGR for rejeitada pelo Congresso, como é mais provável, o governo pode não ter força para aprovar uma reforma da Previdência que enfrente o deficit no curto prazo. Mitigada em razão das alianças para rejeitar a denúncia contra o presidente da República, a reforma da Previdência pode ser mais uma fuga pra frente e ter caráter meramente simbólico, ou seja, mostrar que Temer mantém a narrativa das reformas.

(Publicado no Correio Braziliense em 27/07/2017)

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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