Nas entrelinhas: Previdência é divisor de águas

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“O porta-voz Rêgo Barros deixou no ar a possibilidade de os militares integrarem o texto, ao dizer que “todos” serão incluídos nas propostas. O eixo da mudança é a idade mínima de aposentadoria”

A proposta de reforma previdenciária de Jair Bolsonaro, que está sendo chamada de Nova Previdência para se diferenciar da apresentada por seu antecessor, Michel Temer, será anunciada hoje em um pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, explicando as principais mudanças. O Palácio do Planalto apostará todas as fichas numa boa comunicação das mudanças, por meio de uma campanha institucional, que será lançada para criar um ambiente favorável à aprovação da reforma na opinião pública.

Bolsonaro levará o projeto em mãos ao Congresso. A Nova Previdência é encarada como uma espécie de divisor de águas pelo governo e o mercado, que apostam na sua aprovação para enfrentar a crise fiscal e retomar o crescimento econômico. Na Câmara, porém, o ambiente é o de sempre: às vésperas de grandes votações de interesse do governo, a própria base governista se encarrega de criar instabilidade para barganhar a liberação de verbas e ocupação de cargos. O sinal de que o governo terá de negociar bastante foi a derrota imposta ontem ao Palácio do Planalto na Casa, que suspendeu os efeitos do decreto assinado pelo presidente em exercício Hamilton Mourão, que permitia a servidores comissionados e dirigentes de fundações, autarquias e empresas públicas classificarem documentos como secreto ou ultrassecreto.

Assinado em janeiro, o decreto alterava as regras de aplicação da Lei de Acesso à Informação (LAI), que possibilita a qualquer pessoa física ou jurídica ter acesso às informações públicas. A classificação dos documentos secretos e ultrassecretos é prerrogativa do presidente e do vice-presidente da República, dos ministros de Estado e de autoridades equivalentes, além dos comandantes das Forças Armadas e de chefes de missões diplomáticas no exterior. O decreto derrubado ampliava isso, sendo muito criticado porque aumentava o sigilo sobre os atos governamentais.

Recado
O recado ao governo foi dado na aprovação da urgência em plenário: foram 366 votos a favor, 57 contrários e três abstenções. Depois, o decreto foi suspenso por votação simbólica de lideranças. O porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, minimizou o resultado: “O governo não considera de forma alguma como derrota o fato de o Congresso pedir análise mais aprofundada no que toca à Lei de Acesso à Informação”, afirmou. Por trás da votação, o litígio com os partidos da base, que estão sub-representados na Esplanada dos Ministérios.

O vice-presidente Hamilton Mourão, em entrevista pela manhã, havia revelado a contabilidade do Palácio do Planalto em relação à Previdência: o governo conta com 250 votos e precisará “garimpar” de 60 a 70 votos para aprovar a Nova Previdência na Câmara. Por se tratar de uma emenda à Constituição, o projeto precisará ser analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e por uma comissão especial e ser aprovado no plenário em dois turnos, por 308 votos, no mínimo, em cada turno. A Câmara tem 513 deputados. Depois, seguirá para o Senado, onde necessitará dos votos de 49 dos 81 senadores, também em duas votações.

O projeto a ser entregue em mãos pelo presidente Jair Bolsonaro ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem 80 mudanças no regime de Previdência. O porta-voz Rêgo Barros deixou no ar a possibilidade de os militares integrarem o texto, ao dizer que “todos” serão incluídos nas propostas. O eixo da mudança é a idade mínima de aposentadoria para homens (65 anos) e mulheres (62 anos), ao fim de um período de transição de 12 anos.

Caixa dois
Ontem, os ministros Sérgio Moro (Justiça) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil) entregaram o pacote de projetos anticrime do governo ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ): projeto de lei contra a corrupção e o crime organizado e mudanças nos códigos de Processo Penal e Eleitoral. O fatiamento teve como objetivo facilitar a tramitação das propostas no Congresso, onde a resistência maior deve ser em relação aos crimes de colarinho branco e à criminalização do caixa dois eleitoral. No total, propõe a alteração de 14 leis.

Suíte
O ex-secretário-geral da Presidência Gustavo Bebianno vazou para a revista Veja os áudios de diálogos com o presidente Jair Bolsonaro, que resumem a crise de governo que o levou à demissão. As gravações sinalizam uma ruptura de relações muito mais profunda do que a versão oficial e criaram constrangimentos para o governo, que tenta virar a página. O vazamento facilitou a vida da oposição no Senado, que convidou o ex-ministro para dar esclarecimentos à Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor por 6 a 5.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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