Nas entrelinhas: Pra lá de Bagdá

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Lava-Jato investiga as operações ilícitas das empreiteiras nos Estados Unidos, em Portugal, nas Américas Central e do Sul e na África

A 36ª fase da Operação Lava-Jato, denominada Dragão, chegou à camada mais profunda de lavagem de dinheiro desviado da Petrobras. E também aos operadores mais antigos de um esquema de corrupção cujo modelo de triangulação, envolvendo financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), é mais antigo do que o “S” da instituição.Vem dos tempos em que o governo militar financiava obras de infraestrutura e vendas de armamentos para Sadam Hussein, que nadava em dinheiro durante a chamada “crise do petróleo”. O ditador foi morto pelos norte-americanos durante a guerra do Iraque. Na época, a Mendes Júnior era a grande dona do pedaço.

A “expertise” do esquema investigado é velha conhecida da cúpula do Ministério Público. A operação de ontem investiga apenas uma parte da montanha de dinheiro movimentada pelos dois principais investigados: o advogado Rodrigo Tacla Duran, suspeito de ter trabalhado por anos no setor de propinas da Odebrecht e de ter operado pelo menos 12 contas no exterior; e o empresário e lobista Adir Assad, muito conhecido nos bastidores dos lobbies de Brasília. Ambos lavaram muito mais do que os R$ 50 milhões sob investigação para a UTC, a Mendes Júnior, e a Odebrecht, entre outras empreiteiras, com ajuda de um terceiro operador nos Estados Unidos, que está sendo investigado pelas autoridades daquele país.

Somente Adir está preso. Duran tem cidadania espanhola e está fora do país desde abril. Seu nome já consta da lista da Interpol, a polícia internacional. Segundo o MPF, só a UTC e a Mendes Júnior repassaram mais de R$ 34 milhões ao operador entre 2011 e 2013. No mesmo período, outras empresas contratadas realizaram depósitos de mais de R$ 18 milhões com o mesmo destino. O advogado é acusado de lavar dinheiro e operar o pagamento de propina para pagar funcionários públicos e agentes políticos. Parte dos contratos celebrados entre empreiteiras e o escritório de advocacia de Duran, segundo o MPF, “não tem justificativa real em prestação de serviços.”

Foram cumpridos ontem 18 mandados judiciais, sendo 16 de busca e apreensão e dois de prisão preventiva, em cidades do Paraná, de São Paulo e do Ceará. “Operação Dragão” era o nome dado aos negócios fechados para disponibilizar recursos ilegais no Brasil a partir de pagamentos realizados no exterior, segundo os investigadores. Esse esquema foi aperfeiçoado pela Odebrecht, que chegou a comprar dois bancos somente para lavar dinheiro de propina. A operação de hoje servirá para complementar informações que já estão em poder do Ministério Público, que tem em mãos os registros bancários envolvendo bancos suíços e norte-americanos.

Nos bastidores da Operação Lava-Jato, porém, já se comemora o grande volume de informações sobre as operações do cartel de empreiteiras em países da América Central, América do Sul e África, principalmente da Odebrecht, onde são executadas obras com financiamento do BNDES. Os recursos eram contabilizados em dólares e pagos no Brasil, pois as empreiteiras exportavam serviços, equipamentos e mão de obra, muitas vezes em parceria com empresas locais. Operavam nos mesmos padrões adotados aqui no Brasil, ou seja, o esquema de lavagem de dinheiro no exterior era praticamente um só. É aí que a Operação Lava-Jato pode levar de roldão políticos e partidos de outros países. Como a Odebrecht tem uma importante atuação nos Estados Unidos, também está sendo investigada pelas autoridades norte-americanas.

A casa caiu em 20 de junho, quando Vinícius Veiga Borin, em delação premiada, revelou que a Odebrecht, através de funcionários e terceiros, comprou a cota majoritária de um banco na Antígua, paraíso fiscal do Caribe, o Meinl Bank Antiqua, para operar recursos de propina no exterior da ordem de US$ 1,6 bilhão. Borin foi representante no Brasil de dois bancos com sede na região e movimentava dinheiro no exterior a pedido de operadores ligados ao grupo. Ele e outros ex-executivos do AOB se associaram a Fernando Migliaccio e Luiz Eduardo Soares, então executivos do Departamento de Operações Estruturadas, nome oficial da central de propinas da empreiteira da Odebrecht, para adquirir a filial desativada do Meinl Bank, de Viena, também em Antígua.

Não é à toa que políticos enrolados na Lava-Jato se movimentam intensamente para circunscrever e neutralizar o impacto da delação premiada do empresário Marcelo Odebrecht e seus executivos. Querem limitar a atuação de procuradores e juízes federais de primeira instância e aprovar uma anistia para o caixa dois eleitoral anterior às eleições de 2016. Ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), criou uma comissão para investigar o pagamento de altos salários no serviço público, ou seja, aqueles que ultrapassam o teto de R$ 33.736,00. A proposta constrange ministros e altos funcionários dos demais poderes. A resposta da força-tarefa de delegados, procuradores e juízes federais da Operação Lava-Jato está sendo, porém, aprofundar as investigações e apertar o cerco aos políticos envolvidos.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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