Enquanto as investigações da Lava-Jato avançam na primeira instância, permanecem em banho-maria nas instâncias superiores
Dorme na gaveta do ministro-chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, o projeto de anistia para quem praticou caixa dois nas últimas eleições, uma espécie de truco nas investigações da Operação Lava-Jato sobre as doações eleitorais das grandes empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras. É tudo o que os políticos enrolados nas “delações premiadas” dos grandes empreiteiros e executivos presos em Curitiba gostariam que acontecesse, mas isso seria um tiro no pé do presidente Michel Temer. O preço seria a volta às ruas dos movimentos independentes que apoiaram o impeachment da presidente Dilma.
Geddel, que não é bobo nem nada, trancou a sete chaves o projeto elaborado por advogados dos políticos e empresários envolvidos no escândalo da Petrobras. É nitroglicerina pura, embora tenha grande aceitação na cúpula do Senado. Enrolado na Lava-Jato, o mesmo grupo de senadores que articulou o fatiamento da votação do impeachment, para livrar a presidente Dilma da perda do direito de exercer cargos públicos, está de prontidão para articular a aprovação da anistia. Na Câmara, porém, há grande resistência. E prospera outra articulação para tipificar penalmente os casos de corrupção e enriquecimento ilícito vinculados ao caixa dois eleitoral, em acordo com o Ministério Público e a Polícia Federal.
A prática de caixa dois em campanhas eleitorais, antigamente, era mais ou menos generalizada. O que distinguia um político honesto do desonesto era se gastava o dinheiro na campanha ou o utilizava para formar patrimônio. Essa distinção, porém, nunca existiu para a sociedade, muito menos para o Ministério Público, a Receita Federal, a Polícia Federal e a Justiça Eleitoral, principalmente depois da Constituição de 1988. Mesmo assim, continuou a ser o principal meio de financiamento das campanhas eleitorais. Até que a casa caiu.
A Operação Lava-Jato desnudou o caixa dois eleitoral. Deixou muito claro que o dinheiro vinha de propina das empresas beneficiadas pela contratação de obras e serviços superfaturados dos governos e empresas estatais. O maior escândalo, sem dúvida, foi o da Petrobras, mas há outros grandes, sob investigações, como o dos fundos de pensão Postalis, Funcef, Petros e Previ, cujos envolvidos começaram a ser devassados ontem.
Parte considerável do dinheiro público desviado foi “lavado” como doação eleitoral legal aos partidos. Essa sofisticação foi a grande contribuição do PT, que deixou o “amadorismo” de lado depois do escândalo do mensalão. Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia, foi o primeiro a revelar o esquema, que se mostrou muito mais complexo quando se descobriu que a holding da Odebrecht mantinha um departamento só para operar o esquema, com contabilidade própria e contas no exterior, sob comando direto de Marcelo Odebrecht.
Não é à toa que a ameaça de delação do ex-presidente da Odebrecht deixa o mundo político de cabelo em pé, da mesma forma que a anulação da delação premiada do executivo Léo Pinheiro (OAS), pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi um alívio para muitos. A investigação dos fundos de pensão é o novo sintoma de metástase, uma vez que foram estratégicos para a intervenção do governo na economia e nos grandes negócios, principalmente a partir dos chamados “campeões nacionais”, as empresas beneficiadas por grandes financiamentos do BNDES.
Os fundos de pensão também foram utilizados para a criação de empresas controladas por empresários amigos e executivos ligados ao PT, como são os casos da Sete Brasil e da Eldorado, que serviam para alimentar o caixa dois eleitoral da legenda. O foco da nova operação é mais nos elos empresariais do esquema do que nos políticos, mas vai revelar novas ligações com o PT.
Investigados
Enquanto as investigações da Lava-Jato avançam na primeira instância, permanecem em banho-maria nas instâncias superiores, o que anima os políticos a debaterem a nova legislação sobre caixa dois eleitoral. O estoque de senadores e deputados federais sob investigação ou respondendo a processos no Supremo Tribunal Federal (ISTF) só aumenta. Enquanto não houver julgamento, não haverá separação do joio e do trigo, distinguindo quem recebeu doação legal sem saber a origem do dinheiro de quem usou a doação legal para lavar o dinheiro da propina, sem falar nos políticos que receberam dinheiro de caixa dois no exterior e/ou utilizaram o dinheiro das doações para aumentar o próprio patrimônio.
De qualquer forma, o modelo de financiamento da política faliu e nada foi posto no lugar. A nova lei que proíbe as doações de pessoas jurídicas para as campanhas eleitorais dificilmente sobreviverá às eleições municipais deste ano, pois beneficia os que estão no poder e/ou possuem mais patrimônio, se não houver mudança também no sistema eleitoral. Ontem, o Tribunal de Contas da União (TCU) entregou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um relatório no qual identifica 38.985 doadores de campanha com indícios de irregularidades em contribuições feitas a candidatos na disputa municipal deste ano. O número representa 34% do total das 114.526 pessoas que doaram.
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