A decisão de Temer tem a ver também com as articulações em curso no Congresso para anistiar o caixa dois eleitoral e conter a Operação Lava-Jato
O presidente Michel Temer anunciou ontem, em entrevista fora da agenda, que nenhum ministro denunciado pela Operação Lava-Jato — ou qualquer outra, deduz-se disso — permanecerá no governo. Nesse caso, será afastado provisoriamente; se a denúncia for aceita em juízo, será demitido. A fórmula é uma espécie de perímetro de segurança para o governo não ser levado de roldão pelas delações premiadas da Odebrecht, nas quais muitos ministros estão citados, segundo as informações vazadas até agora. Trocando em miúdos, a citação não derrubará ninguém, até porque esse critério levaria o próprio presidente da República à renúncia.
A fórmula é engenhosa e obedece à regra jurídica da “presunção da inocência”, na qual o ônus da prova cabe a quem acusa, no caso, os delatores e o Ministério Público Federal, mas avança uma casa quando o ministro se tornar réu, pois estará definitivamente fora do governo. Pode ser fruto de um pacto de Temer com seu estado-maior, particularmente os ministros mais poderosos no Palácio do Planalto: o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e o secretário-geral da Presidência, Moreira Franco.
Ambos são amigos de Temer e protagonistas de seu rompimento com Dilma Rousseff, a presidente destituída do cargo pelo impeachment. Eliseu e Moreira foram os principais articuladores do desembarque do PMDB do governo petista e da aprovação do impeachment pela Câmara dos Deputados. O outro lado da moeda é o fortalecimento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que passa a ter o poder de jogar para a geladeira qualquer ministro, basta oferecer uma denúncia contra ele. Por essa razão, as interpretações quanto às declarações de Temer são contraditórias. Para alguns, a regra tornou o governo mais frágil.
O fato é que a nomeação de Moreira Franco para a secretaria-geral da Presidência gerou uma “guerrilha jurídica”, na qual juízes federais concederam liminares impedindo que o peemedebista tomasse posse no cargo. Pode ser derrotada pelo governo no Supremo, mas gerou desgaste de imagem que Temer tenta reverter. Moreira já era poderoso sem as honras da cargo, mas ganhou novas atribuições políticas e direito a foro especial. Quem conhece os bastidores do Planalto sabe que ele é uma peça-chave do governo, seja pela capacidade de formulação política, seja em razão de seu poder de articulação política, no melhor estilo das velhas raposas do antigo PSD.
A decisão de Temer tem a ver também com as articulações em curso no Congresso para anistiar o caixa dois eleitoral e conter a Operação Lava-Jato. O choque monumental entre o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ocorrido no ano passado, não se encerrou com a eleição do senador Eunício de Oliveira (PMDB-CE), muito mais cordato, para o comando da Casa. A eleição do senador Edison Lobão (PMDB-MA) para a presidência da Comissão de Constituição (CCJ) foi uma demonstração de que Renan, líder da bancada do PMDB, não jogou a toalha, muito ao contrário: articula a não aprovação do nome de Janot caso o procurador-geral tente continuar à frente da PGR.
Anistia
A propósito, ontem, o senador Lobão armou sua artilharia. Disse que a anistia ao caixa dois eleitoral é constitucional e também defendeu mudanças na legislação que trata das delações premiadas: “Delação só deve ser admitida com o delator solto”. Afirmou que a Lava-Jato “virou um inquérito universal” e disparou: “Em que isso vai resultar? Não sei. Não acho que tem que ser extinta, mas conduzir ao ponto que estamos chegando, da criminalização da vida pública, é o que nos envia para a tirania.”
Lobão conduzirá a sabatina do ministro da Justiça licenciado, Alexandre de Moraes, indicado por Temer para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal. Apesar das críticas e questionamentos, seu nome provavelmente será aprovado na comissão e em plenário. Hoje, o senador Eduardo Braga (PMDB-AM) apresentará à CCJ parecer favorável à indicação de Moraes.
Jogo jogado, as articulações no mundo da Lava-Jato passam agora pela indicação do novo ministro da Justiça, que somente deve ocorrer depois de aprovado o nome de Moraes pelo Senado, em sessão prevista para 22 de fevereiro. Consta que Temer já fez a sua escolha, mas isso não impede que pululem candidatos.