Há três cenários possíveis para a crise política, econômica e ética, mas nenhum garante uma transição tranquila até 2018
— Para onde cavalga o senhor?
— Não o sei. Apenas quero ir-me daqui. Partir sempre,
sair daqui, apenas assim posso alcançar minha meta.
— Conheces então tua meta?
— Sim. Já disse. Sair daqui: essa é minha meta.
Esse diálogo absurdo entre um cavaleiro e seu criado é parte de um pequeno conto de Franz Kafka (1883-1924), escritor tcheco de língua alemã, intitulado A partida. Sua obra retrata as ansiedades e a alienação do homem do século XX. Kafka nasceu em Praga, que então pertencia ao império austro-húngaro, e cresceu sob as influências de três culturas: a judia, a tcheca e a alemã. Seu estilo é marcado pelas situações absurdas. O processo, de 1925, cujo personagem principal é preso, julgado e executado por um crime que desconhece, A metamorfose (1916) e O castelo (1926) são suas obras mais traduzidas.
A partida serve de analogia para a atual situação política, um ponto sem volta. Ninguém sabe o que vai acontecer com o país até 2018. Essa incerteza é resultado de uma crise tríplice (econômica, ética e política), na qual o velho está morrendo e o novo ainda não nasceu, porém, ainda não é uma situação na qual os “de baixo” não obedecem e os “de cima” já não governam. O primeiro diagnóstico pressupõe uma saída em bases democrática; o segundo, rupturas autoritárias.
Há três cenários possíveis de evolução da crise política, econômica e ética; nenhum garante uma transição tranquila até 2018. Todos exigirão escolhas duras para a crise econômica, um pacto de governabilidade com o Congresso e um desfecho para a Operação Lava-Jato que satisfaça a sociedade. Essas variáveis hoje estão foram do controle dos seus principais atores.
“Impeachment, já!” – O primeiro cenário é a aprovação do impeachment da presidente Dilma Rousseff pelo Congresso. O desembarque anunciado do PMDB do governo aponta nessa direção. Na terça-feira, os caciques da legenda tomarão a decisão. O reposicionamento do ex-governador Sérgio Cabral e do prefeito carioca Eduardo Paes, mesmo com a realização das Olimpíadas do Rio, é resultado dos efeitos da recessão no Rio de Janeiro e da mobilização popular contra Dilma e Lula.
Supondo que vice-presidente Michel Temer assuma o poder, o grande desafio será operar a transição até as eleições de 2018, tendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma como “vítimas” de um suposto golpe e os movimentos sociais ligados ao PT radicalizando suas ações contra o indispensável ajuste fiscal. Temer é um político moderado, hábil articulador, adepto dos grandes acordos e constitucionalista respeitado. Precisará formar um governo de notáveis, conquistar apoio no Congresso e realizar um pacto com os governadores e prefeitos para administrar a crise.
“Não vai ter golpe!” – A permanência de Dilma Rousseff na Presidência é o segundo cenário. Precisa reunir mais de 171 dos 513 votos na Câmara dos Deputados. Seria o mais provável, não fosse a deterioração da situação da economia e o impacto político da Operação Lava-Jato. A radicalização política e a narrativa de que há um golpe de Estado em curso no país adotada por Dilma, porém, aumentam seu isolamento.
O PT não tem revelado capacidade de mobilização para reverter a correlação de forças no Congresso e a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil continua sub judice, em razão de liminar do ministro Gilmar Mendes. Mesmo que venha a ser garantida pelo STF, a entrada de Lula no governo terá como consequência levar a Operação Lava-Jato para dentro do Planalto, além de transformar Dilma numa espécie de rainha da Inglaterra. Sua intenção de promover uma guinada populista na economia assusta o mercado com o fantasma da hiperinflação.
“Novas eleições!” – Com a descoberta da contabilidade paralela da Odebrecht, está comprovada a utilização de caixa dois para pagar o marqueteiro João Santana, aqui e no exterior. As informações da Lava-Jato corroboram a tese de abuso de poder econômico na campanha de reeleição de Dilma Rousseff em 2014. Quatro ações da oposição pedem a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Uma parte da oposição, principalmente Marina Silva, presidente da Rede, defende a convocação de novas eleições, com as eleições municipais. Isso pressupõe uma decisão do TSE ainda neste ano, o que é pouco provável. Do ponto de vista institucional, eleições presidenciais e municipais simultâneas levariam a solução da crise para o leito natural, o debate eleitoral e a decisão final do eleitor. Hoje, é o cenário menos provável.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…