O presidente Lula mudou o discurso em relação aos presidentes da Venezuela e da Nicarágua, seus amigos das horas mais difíceis, mas que se tornaram verdadeiros ditadores
O título até parece fake news, mas não é. A política internacional é feita de interesses permanentes e conjunturas específicas, que se movem como as nuvens na clássica definição do banqueiro, ex-governador mineiro e ex-chanceler Magalhães Pinto: “Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou”. A visita ao Brasil da subsecretária de Estado dos Estados Unidos, Victoria Nuland, revelou uma mudança de postura do presidente Joe Biden sobre a polêmica atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação à Venezuela e à Nicarágua, bem como quanto ao esforço do líder brasileiro em participar das negociações de paz na Ucrânia para se projetar como liderança mundial.
O presidente Lula também mudou o discurso em relação aos presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Nicarágua, Daniel Ortega, seus amigos das horas mais difíceis, mas que se tornaram verdadeiros ditadores, após fraudar eleições e excluir os adversários do processo político. O posicionamento de Lula no encontro dos chefes de Estado latino-americanos com os líderes da União Europeia, em Bruxelas, em muita sintonia com o do presidente francês, Emmanuel Macron, foi interpretado como um realinhamento do governo brasileiro pelo Departamento de Estado norte-americano.
Na verdade, a estratégia diplomática do Itamaraty, cujos eixos são os interesses permanentes do Estado brasileiro e uma certa tradição de não-alinhamento automático às potências mundiais, acabou ofuscada pela atuação pessoal de Lula na política mundial, que está sendo marcada por declarações de improviso, muitas vezes desastradas, e suas idiossincrasias de líder carismático. A mais recente foi quando falou que deveríamos agradecer à África pela escravidão, cujo objetivo era lamentar, em vez de enaltecer, como pareceu na sua mais imprevisível gafe.
Mesmo assim, na quinta-feira passada, Victoria Nuland teve longas reuniões com Celso Amorim, assessor especial de Lula para assuntos internacionais, e a secretária-geral do Itamaraty, Maria Laura Rocha. Sua missão era realinhar as relações dos EUA com o Brasil em torno de interesses convergentes, principalmente depois do posicionamento de Lula e Macron em relação às eleições na Venezuela e à situação da Nicarágua, no encontro de Bruxelas.
Recados
Quais foram os recados da subsecretária de Estado norte-americana ao governo brasileiro? Primeiro, Biden acredita que Lula pode convencer Nicolás Maduro de que é preciso eleições limpas e transparentes na Venezuela. O fato de o Brasil ter restabelecido as relações diplomáticas com a Venezuela criou essas condições. Mas há outra variável, os Estados Unidos também têm interesse em restabelecer as relações com a Venezuela, por causa do petróleo, principalmente depois do bloqueio econômico à Rússia, que é grande exportadora de óleo bruto.
Segundo: Lula também é visto como um interlocutor importante junto a Daniel Ortega. Simplesmente porque foi credenciado pelo papa Francisco, na visita que o presidente brasileiro fez a Roma, para negociar a libertação dos padres católicos que estão presos na Nicarágua. Um deles é o bispo episcopal Rolando José Álvarez Lagos, de 55 anos, símbolo da resistência da Igreja Católica e da sociedade da Nicarágua à ditadura do ex-líder sandinista. O clérigo foi preso por Ortega por atuar em defesa dos padres e freiras católicos que estão detidos na Nicarágua e recusar o exílio.
A terceira grande novidade na visita foi o reconhecimento por parte de Biden de que Lula pode ajudar nas negociações sobre a guerra da Ucrânia. Suas relações com o petista esfriaram depois da visita do presidente brasileiro à China e, principalmente, após o episódio dos navios de guerra iranianos que visitaram o Brasil e foram autorizados pela Marinha a fundear no Rio de Janeiro.
O rompimento do acordo para exportação do trigo ucraniano pelo presidente russo, Vladimir Putin, é um problema muito mais sério do que admitem publicamente os Estados Unidos e a União Europeia. O Brasil e outros países que mantêm boas relações com a Rússia, como Turquia e Arábia Saudita, bem posicionados para participar de negociações, estão sendo solicitados a atuar como bombeiros junto a Putin para resolver o problema mundial de abastecimento de trigo.
A diplomata também admitiu as dificuldades do governo Biden com o Congresso norte-americano para aprovar projetos. Quando Lula esteve em Washington, Biden anunciou uma ajuda de US$ 500 milhões para o Fundo Amazônia, mas até hoje não efetivou as doações, que são até irrisórias diante dos gastos dos Estados Unidos com a guerra da Ucrânia, um dos motivos das críticas que Lula andou fazendo aos Estados Unidos em declarações públicas sobre o conflito com a Rússia. Victoria Nuland garantiu que seu governo trabalha para convencer o Congresso de que esse é um investimento importante para o Brasil, os EUA, a região amazônica e o clima, ou seja, a não efetivação da doação não é uma retaliação.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…