O maior impacto da mudança na Casa Branca está por vir: será na política econômica. O projeto ultraliberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi para o espaço
Segundo o BEA (Bureau of Economic Analysis), do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, o PIB (Produto Interno Bruto) norte-americano cresceu à taxa anualizada 6,4% no 1o trimestre em relação aos três meses anteriores. Esse resultado foi superior ao registrado no trimestre anterior, de 4,3%, e está sendo comemorado pelo presidente democrata Joe Biden, que hoje completa 100 dias de governo. Emblematicamente, a avaliação desses 100 dias é uma tradição iniciada em 1933, no primeiro mandato de Franklin Roosevelt, no qual o novo presidente norte-americano se espelha.
Roosevelt fez um governo revolucionário ao seu tempo. À época, a crise do liberalismo econômico levou à maior intervenção do Estado sobre a economia e à reestruturação das práticas capitalistas do século passado. O crash da Bolsa de Nova York, em 1929, havia posto em xeque os princípios da economia clássica, ao deflagrar uma das maiores crises da história do capitalismo. Eleito em 1932, o desafio de Roosevelt fora reerguer a economia. Para isso, recorreu às ideias do economista John Maynard Keynes. O New Deal foi sua alternativa de desenvolvimento econômico.
Entre outras ações, o New Deal estabelecia o controle na emissão de valores monetários, o investimento em setores básicos da indústria e a criação de políticas de emprego. Roosevelt buscou uma recuperação econômica segura e gradual, com ações para conciliar as questões econômicas e sociais, o chamado welfare state (Estado do bem-estar social), que perdeu sustentabilidade no final da década de 1970, quando o neoliberalismo de Margareth Tatcher começou a ganhar fôlego. Com a eleição do presidente Ronald Reagan, em 1980, porém, um novo ciclo liberal foi iniciado, que viria a se consolidar com o chamado Consenso de Washington.
Biden parece disposto a fazer uma ruptura radical na economia. Mantém o pé no acelerador para neutralizar qualquer tentativa de o ex-presidente Donald Trump, que não conseguiu se reeleger, voltar ao poder. Logo após a sua posse, em 20 de janeiro, promulgou um projeto de lei para enfrentar a pandemia da covid-19 de US$ 1,9 trilhão (cerca de R$ 10,3 trilhões), com um auxílio de US$ 1.440 para a população diretamente atingida pela crise.
Seu governo atingiu a meta de 200 milhões de doses de vacinas de coronavírus aplicadas, agora já disponíveis a todos com 16 anos. O desemprego está caindo, os pedidos de seguro-desemprego atingiram o ponto mais baixo na pandemia e as escolas reabriram para aulas presenciais. Recentemente, Biden assinou um programa de recuperação da infraestrutura da ordem de US$ 2,3 trilhões e outro para a educação, no valor de US$ 1,8 trilhão. É uma injeção de US$ 4 trilhões na economia dos EUA.
Ficou a pé
Biden mudou a política externa dos Estados Unidos: retornou ao Acordo de Paris e à Organização Mundial da Saúde, travou o financiamento do muro na fronteira com o México e anunciou a retirada das tropas norte-americanas do Afeganistão. Foi aí que o presidente Jair Bolsonaro caiu do cavalo. A mudança deixou o Brasil sozinho no relacionamento conflituoso com a OMS (Organização Mundial da Saúde) e muito isolado no plano internacional, por causa da questão ambiental. Bolsonaro reproduzia a política externa de Donald Trump e seu negacionismo até com mais virulência.
Com a mudança de rumo, o chanceler Ernesto Araújo, que posava de ideólogo da política externa, foi defenestrado do cargo. Agora, quem está na berlinda é o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, completamente desacreditado, interna e externamente. Na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)), a aceitação do Brasil dependerá da mudança de rumo na questão climática; porém, na União Europeia, o acordo com o Mercosul será ainda mais difícil, pelo mesmo motivo. Mas o maior impacto da mudança na Casa Branca ainda está por vir: será na política econômica. O projeto ultraliberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi para o espaço na pandemia. Com a mudança de rumo nos EUA, só falta agora o próprio ministro se ejetar da cadeira.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…