A lógica é mais ou menos a seguinte: quem não controlar suas bancadas na votação das reformas corre sério risco de não voltar para o cargo
O presidente Michel Temer reuniu-se ontem com os ministros políticos e decidiu que todos os que têm mandato parlamentar deixarão os cargos para votar a favor das reformas da Previdência e trabalhista. A lógica é mais ou menos a seguinte: quem não controlar suas bancadas na votação das reformas corre sério risco de não voltar para o cargo. O Palácio do Planalto nega que esse tipo de pressão exista, mas, nos bastidores do Congresso, a conversa é essa. Um dos pressionados é o ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS), cuja pequena bancada de oito parlamentares estaria dividida, principalmente em relação à reforma trabalhista. Freire, porém, garantiu na reunião que a bancada votará a favor da reforma.
Na base do governo, a reforma da Previdência sofreu muitas modificações, pois o relator do projeto, deputado Arthur Maia (PPS-BA), cedeu a pressões de policiais, professores, mulheres e trabalhadores rurais, o que contrariou a equipe econômica. Mas já existe bastante acúmulo de discussão sobre a matéria na base governista e quem está contra as propostas não pode alegar desinformação. O mesmo já não acontece com a reforma trabalhista, cujo relatório está a cargo do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), que apresentou um substitutivo muito mais radical do que a proposta original do governo. O que mais gerou reação dos sindicatos foi o fim do chamado imposto sindical, cuja aprovação somente não ocorrerá se houver algum acordo das centrais sindicais com o governo.
O problema, porém, são algumas propostas que foram incluídas no projeto sem nenhuma discussão anterior. O texto lista 16 temas que passariam a ser regulados por acordos coletivos, como banco de horas, parcelamento de férias e plano de cargos e salários. O projeto original limitava a prevalência a 13 pontos específicos. O texto deve ser votado hoje na comissão especial. O Palácio do Planalto considera a votação da reforma trabalhista uma espécie de prévia da reforma da Previdência, daí o jogo pesado com os aliados.
Na verdade, as dificuldades de Michel Temer decorrem de três fatores. Primeiro, a impopularidade do governo, muito desgastado pelo fato de oito ministros estarem citados na Operação Lava-Jato. Segundo, o fato de que o governo já não tem moedas de troca para negociar com os aliados, só lhe resta ameaçá-los com a perda dos cargos, principalmente no caso dos partidos menores. Terceiro, as pressões corporativas são muito bem direcionadas e eficazes, atingindo parlamentares cujas bases estão sendo diretamente atingidas pelas medidas propostas.
O general
A entrevista do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, publicada na revista Veja neste fim de semana, serviu para abortar a sua própria sucessão na Força, pondo fim a especulações acerca de suas condições de permanência no cargo por motivos de saúde. “Fui acometido por uma doença degenerativa chamada doença do neurônio motor. Ela atingiu alguns grupos musculares. Estou com dificuldade para caminhar e com alguma dificuldade respiratória. Senti que, se não revelasse o que estava acontecendo, daria margem a mal-entendidos. Comecei a ver notícias de que eu estaria para ser exonerado ou que havia pedido para sair. Então, decidi ser transparente”, disse.
Ele já havia gravado um depoimento para falar sobre a questão, distribuído pelos canais oficiais do Exército, mas dessa vez resolveu falar para a opinião pública e para o mundo político, numa demonstração de que continua em plenas condições de liderar seus pares no alto-comando do Exército. Foi uma entrevista política, que também deve ser lida nas entrelinhas, quando ele fala sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff e do apoio à Operação Lava-Jato.
Villas Bôas enunciou a posição de princípios adotada pelo Exército em meio à crise ética, política e econômica, a parte mais importante da entrevista: “As nossas atitudes foram todas preventivas. Quando a coisa começou a ficar muito instável, nós logo definimos: vamos trabalhar com base em três pilares: primeiro, a estabilidade. Vamos contribuir para a manutenção da estabilidade e não ser um fator de instabilidade. O segundo pilar era a legalidade. Poderíamos até ser empregados, mas seria com base no que é prescrito na Constituição — por iniciativa de um dos poderes. A nossa preocupação era que não viéssemos a ser penalizados novamente, conforme a história nos ensinou. O terceiro pilar era a legitimidade. Tínhamos de preservar uma imagem de isenção e imparcialidade porque, caso fôssemos empregados, não poderíamos ser identificados como tendentes a um ou outro lado.”