Nas entrelinhas: O trem fantasma

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No meio de tanta confusão, o aliado mais firme até agora é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tem na gaveta os pedidos de impeachment de Temer

A crise ética parece um trem fantasma daqueles que fazem o sangue gelar. Na primeira curva, aparece uma caveira e muitos ossos espalhados pelo chão; na seguinte, um vampiro senta ao lado; mais adiante, um morcego que voa baixo. Só falta o trem despencar do abismo. Todos os envolvidos na Operação Lava-Jato já andaram nesse trem, mas agora chegou a vez do presidente Michel Temer. Quando parece que a situação se estabiliza, surge uma novidade terrível. Foi o que aconteceu ontem, por exemplo. A “rocada” do deputado Osmar Serraglio com o jurista Torquato Jardim no Ministério da Justiça parecia uma jogada perfeita de grande mestre, mas não estava combinada com o parlamentar, que recusou o Ministério da Transparência, pasta antes ocupada por seu sucessor. Mais um susto para o Palácio do Planalto.

O deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), flagrado com a mala de R$ 500 mil, está fora da casinha e ameaça fazer acordo de delação premiada. Com a decisão de Serraglio, perdeu o direito a foro especial. A alternativa seria pôr no lugar um deputado do Paraná, o que manteria Rocha Loures no exercício do mandato, mas essa seria uma situação muito semelhante àquela que impediu a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil durante o governo Dilma, ou seja, seria caracterizada como obstrução da Justiça.

E segue o trem fantasma: ontem, o ministro relator da Operação Lava-Jato, Edson Fachin, do Superior Tribunal Federal (STF), autorizou o interrogatório de Michel Temer no inquérito em que o presidente é investigado com base nas delações premiadas dos donos da empresa JBS. O interrogatório poderá ser feito por escrito e respondido pelo presidente 24 horas após a entrega das perguntas pela Polícia Federal. Deu um prazo de 10 dias para a Polícia Federal concluir investigações sobre Temer.

Outro susto: a declaração do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que desfez as especulações a seu respeito e disse que não pretende pedir vista do processo de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, cujo julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve começar no próximo dia 6 de junho. Ele é o primeiro a votar após o relator do caso, Herman Benjamin. O outro ministro indicado por Temer é Admar Gonzaga, que também pode pedir vista no começo da votação. Na segunda-feira, o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, em entrevista, procurou esvaziar as expectativas quanto à cassação da chapa, com declarações nas quais deixou claro que um pedido de vista faz parte de julgamentos complexos, ou seja, das regras do jogo.

O julgamento do TSE e a delação premiada de Joesley Batista da JBS são uma agenda negativa, que acaba neutralizando os esforços do Palácio do Planalto para estabelecer a rota política do governo e estabilizar a sua base no Congresso. Avançar nas reformas da Previdência e trabalhista é a pauta positiva, que carreia apoio do mercado financeiro e dos investidores ao governo Temer. Ontem, por exemplo, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado (CAE) marcou sua votação para a próxima semana. Já foi um reflexo da reaproximação entre o presidente Temer e o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), que se manteve à frente da bancada numa solução de compromisso. Desde o governo Collor de Mello, Renan é um especialista em pular do barco antes que afunde. Seu recuo sinaliza que o naufrágio não é iminente.

Tucanos

Temer conseguiu estancar a debandada tucana do governo. Para isso, foi decisivo o encontro que manteve em São Paulo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), segunda-feira, no hotel Grand Hyatt. O ministro Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência, também participou da reunião. A cúpula do PSDB não pretende desembarcar do governo antes do julgamento do TSE, mas a pressão da bancada na Câmara continua. A maioria dos deputados ameaça deixar a base do governo, o que seria desastroso para Temer.

No meio de tanta confusão, o aliado mais firme até agora é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tem na gaveta os pedidos de impeachment de Temer, entre os quais o da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Maia é o primeiro na linha de sucessão, caso o presidente seja afastado, e se elegeria com certa facilidade num pleito indireto. O problema é que também tem um bilhete para pegar o trem fantasma, pois é um dos políticos investigados pela Operação Lava-Jato.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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