Paes (PSD) disputa a reeleição no Rio com possibilidades de vencer no primeiro turno; Nunes (MDB) corre o risco de ficar fora do segundo turno em São Paulo
Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, mais conhecido pelo nome artístico Tom Jobim, como todos sabem, foi compositor, pianista, violonista, arranjador, flautista e cantor brasileiro, entre os melhores e mais influentes da história de nossa música popular. É o autor de uma das frases mais antológicas sobre as peculiaridades nacionais: “David, o Brasil não é para principiantes”, disse, em meados 1960, ao fotógrafo norte-americano David Zingg, que decidira morar no Brasil. Pura antropologia.
A frase foi adotada como um mantra por todos que procuram explicar alguma coisa que não tem um sentido lógico na vida brasileira, devidamente adaptada para elevar o status profissional de quem a profere: “O Brasil não é para amadores”. Jobim, carioca da Tijuca, e o baiano João Gilberto faziam parte do grupo de músicos, compositores e cantores que criaram a bossa-nova, no apartamento de Nara Leão, então com 15 anos, na Avenida Atlântica, em Copacabana: Sylvia Teles, Roberto Menescal, Carlos Lyra e Ronaldo Bôscoli.
Na conversa com Zigg, Tom Jobim traduzia a picardia do carioca, que glamouriza a esperteza e a malandragem, um arquétipo muito bem estudado pelo antropólogo Roberto Da Matta, em Carnavais, Malandros e Heróis (Editora Rocco). Sua gênese é Leonardo, o principal personagem do livro Memórias de um Sargento de Milícias, do escritor brasileiro Manuel Antônio de Almeida, que descreve a vida carioca após a chegada da Corte de D. João VI, em 1808. Escrito em forma de folhetim, um capítulo por semana, foi publicado no Correio Mercantil do Rio de janeiro, em 1854. É considerado um romance urbano ou de costumes e faz a primeira descrição do malandro carioca como uma espécie de “herói noir”.
Esse arquétipo viria a ser capturado por Walt Disney, na figura versátil, inteligente e engraçada do Zé Carioca, o herói brasileiro das histórias em quadrinho norte-americanas e de Hollywood. Tratado por seus críticos como um produto mercadológico cujo objetivo seria “americanizar” os brasileiros, na verdade, é a síntese de representações simbólicas bem definidas do nosso malandro. A irreverência e a hilaridade do papagaio de alma verde-amarela caíram nas graças dos brasileiros.
No bom sentido, o Zé Carioca desta coluna é o prefeito Eduardo Paes (PSD), que disputa a reeleição na cidade do Rio de Janeiro, com possibilidades reais de vencer as eleições no primeiro turno. Na pesquisa Datafolha publicada ontem, segue na liderança das intenções de voto dos cariocas, com 54%. Paes transita da Zona Oeste à Tijuca, de Ipanema a Vigário Geral, com igual desenvoltura. Seu principal adversário, Alexandre Ramagem (PL), variou positivamente de 17% para 22% e tem o apoio do clã Bolsonaro.
Ramagem é um principiante em disputas desse porte, como diria Tom Jobim. Bate duro no atual prefeito, mas não tem como demolir o legado urbanístico nem o charme visionário e bem-humorado com que Paes trata a cidade. É um policial federal polêmico, por sua atuação à frente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo Bolsonaro. Faz um discurso do tipo “prendo e arrebento”, mas nem de longe tem a “ginga” política de seu adversário. Essa polarização desidratou o deputado federal Tarcísio Motta (PSol), com seu pior resultado até agora: 4% das intenções de votos.
Ronda
Há uns 70 anos o samba-canção Ronda reina absoluto na noite paulistana. Foi composto por Paulo Vanzolini quando estudava medicina e servia ao Exército. O “Cabo 30” patrulhava a pé as ruas do baixo meretrício do Bom Retiro e do centro da cidade. Já doutor pela Universidade de Harvard (EUA), referência internacional em herpetologia (estudo de anfíbios e répteis), com contribuições significativas para a ciência, como sua Teoria dos Refúgios, Vanzolini admitiu que não era sua composição favorita. Gostava mais, por exemplo, de Volta por Cima, um samba cujo refrão todo brasileiro conhece.
Ronda foi gravada a primeira vez por Inezita Barroso, sua amiga, nos estúdios da RCA Victor, no Rio de Janeiro, com um acompanhamento de notáveis instrumentistas: Abel Ferreira, Bola Sete, Garoto e Zé Menezes. É uma “cena noir”: De noite eu rondo a cidade/ A te procurar sem encontrar/ No meio de olhares espio/ Nas mesas dos bares você não está/ Volto para casa abatida/ Desenganada da vida/ No sonho eu vou descansar.
Pesquisa Datafolha, divulgada nesta quinta-feira, sobre intenção de voto para prefeito de São Paulo mostra Guilherme Boulos (PSol) com 26%, Ricardo Nunes (MDB) com 24% e Pablo Marçal (PRTB) com 24%. Estão empatados tecnicamente. A dois dias das eleições, os três candidatos oscilaram dentro da margem de erro. Boulos, um ponto para cima, de 25% para 26%; Nunes, três pontos para baixo, de 27% para 24%; e Marçal, três pontos para cima, de 21% para 24%. Em linhas cruzadas, Marçal pode deixar Nunes fora do segundo turno. E até ultrapassar Boulos.
Tabata Amaral (PSB) passou de 9% para 11% das intenções de voto na pesquisa estimulada. José Luiz Datena (PSDB) caiu de 6% para 4%. Marina Helena marcou 2%. Brancos e nulos somaram 6%, e outros 3% disseram não saber em quem vão votar. Nunes depende do desempenho no debate da TV Globo para se manter na disputa. O prefeito ronda a cidade atrás de mais votos, porém, como aquela mulher que inspirou Vanzolini, procura e não encontra.
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