Nas entrelinhas: O julgamento da eleição

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O depoimento de Marcelo Odebrecht foi devastador para Dilma Rousseff, mas pode criar também muitos embaraços para o presidente Temer

O ministro Herman Benjamin, relator da ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pede a cassação da chapa Dilma-Temer, pediu ontem que o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, marque o julgamento do caso, que pode começar na próxima semana. Ocorrerá num momento em que à narrativa petista do golpe se soma a banalização do caixa dois e do abuso do poder econômico como discurso político, a partir dos depoimentos de Marcelo Odebrecht, segundo o qual, não há político que não tenha se beneficiado do caixa dois da empreiteira.

As delações premiadas da Odebrecht jogaram os políticos na fogueira. Apesar de preso há dois anos, Marcelo Odebrecht não perdeu a soberba e se jacta de ter criado a chapa Dilma-Temer. Na prática, empreende uma estratégia na qual espera salvar as empresas do grupo da falência e conquistar uma prisão domiciliar, em troca da ruína de seus parceiros políticos. A sociedade apoia a Lava-Jato porque está desvendando o maior esquema de corrupção e financiamento ilegal de campanha do mundo, mas isso não significa que endosse também a forma como a Odebrecht está sendo tratada no acordo com o Ministério Público Federal.

Paradigma
Voltando ao julgamento da chapa, o depoimento de Marcelo Odebrecht foi devastador para Dilma Rousseff, mas pode criar também muitos embaraços para o presidente Temer. A eventual condenação de toda a chapa — provavelmente a proposta do ministro Benjamin — será mais um fator desestabilizador do cenário político. Entretanto, o julgamento também servirá para estabelecer um novo paradigma sobre o caixa dois como crime eleitoral. Dependendo do seu teor, a decisão pode esvaziar ou fomentar as manobras no Congresso para aprovar uma anistia aos políticos envolvidos no escândalo da Petrobras.

Desde 2015, o caso tramita no TSE a partir de uma ação do PSDB contra a chapa Dilma-Temer por abuso de poder econômico, recebimento de propina e envolvimento com o escândalo da Petrobras. Na época, a aposta do presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), que perdeu a eleição para Dilma Rousseff, era a cassação da chapa e a posse do segundo colocado, ou seja, ele e seu vice, senador Aloysio Nunes Ferreira, hoje ministro de Relações Exteriores. Na pior das hipóteses, a convocação de novas eleições. Na época, a ação precipitou uma corrida para aprovação do impeachment de Dilma Rousseff no Congresso, embalada pelos protestos nas ruas, com apoio do PSDB, que hoje é o principal aliado de Temer no governo.

Ironia
O ministro Gilmar Mendes, presidente do TSE, sinalizou a intenção de antecipar a votação da ação para a próxima semana. Ontem, o ministro Benjamin deu 48 horas para o Ministério Público se manifestar na ação. O vice-procurador-geral eleitoral, Nicolau Dino, aguardava as alegações finais das partes. PT, PMDB e PSDB apresentaram as alegações na sexta-feira. O julgamento pode ser bem mais rápido do que se imaginava, se Mendes convocar sessões extraordinárias da Corte para concluí-lo. Mesmo assim, para transitar em julgado, a decisão terá que passar pela aprovação do Supremo Tribunal Federal, pois as partes recorrerão da decisão se a chapa for cassada em parte ou no todo.

Dificilmente o TSE cassará toda a chapa e dará posse aos senadores tucanos Aécio e Aloysio. O mais provável seria a convocação de uma eleição indireta, mas isso pode ser desgastante também, por causa da desmoralização do Congresso pela Operação Lava-Jato. É uma situação difícil, do tipo “se correr o bicho, pega; se ficar, o bicho come”, que desaguará no Supremo Tribunal Federal (STF), ao qual as partes recorrerão, qualquer que seja a decisão no TSE.