Nas entrelinhas: O governo enxuto

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“Bolsonaro falava em 10 ministérios. Agora, já são 15, incluídas duas polêmicas incorporações: Indústria e Comércio Exterior na Economia e Meio Ambiente na Agricultura”

A montagem de um governo mais enxuto, que caiba na Esplanada dos Ministérios, pode provocar uma crise no mercado imobiliário de Brasília, com o esvaziamento de dezenas de prédios e outros imóveis alugados pelo governo federal; afora isso, a ideia está sendo bem recebida pela opinião pública. É uma promessa que quase todos os candidatos fizeram, porém, muito difícil de cumprir.

Bolsonaro falava em 10 ministérios. Agora, já são 15, incluídas duas polêmicas fusões: a absorção da Indústria e Comércio Exterior pelo superministério da Economia, cujo titular será Paulo Guedes, um dos homens fortes do novo governo; e a incorporação do Ministério do Meio Ambiente pelo Ministério da Agricultura

No primeiro caso, a forte reação do lobby das indústrias provocou um recuo de Bolsonaro no segundo turno, mas acabou prevalecendo a intenção inicial. Ao anunciar a decisão, Paulo Guedes rebateu as críticas com o argumento de que a decisão fará bem à indústria, apesar dos industriais. A frase foi vista como uma demonstração de truculência e inabilidade política do novo ministro, mas precisa ser apreciada com mais objetividade e menos partidarismo.

A existência de um superministério da Economia é estigmatizada em razão do fracasso do Plano Collor, lançado pelo então presidente Fernando Collor de Mello, que havia confiado a pasta à economista Zélia Cardoso de Mello. O confisco das cadernetas de poupança, peça fundamental no plano para acabar com a hiperinflação, iniciativa voluntarista, virou um tiro n’água, porque frustrou fortemente a classe média que havia apoiado Collor, e o plano de combate à hiperinflação deu errado.

Entretanto, o trabalho feito pelo então Departamento de Indústria e Comércio, que havia substituído o antigo ministério, deixou o grande legado do governo Collor: abertura da economia brasileira à globalização. Na época, o então diretor de Planejamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luiz Paulo Velozzo Lucas, mais tarde eleito prefeito de Vitória pelo PSDB, foi convidado para o cargo. Entre os anos 1990 e 1992, sua equipe coordenou diversas ações para abrir e reestruturar a economia brasileira, entre as quais as negociações do Mercosul e da Rodada Uruguai do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), da Organização Mundial de Comércio.

Meio Ambiente e Justiça

Outra polêmica tem sinal trocado. A incorporação do Ministério do Meio Ambiente ao Ministério da Agricultura, que está gerando protestos de todos os ex-ministros da pasta e até mesmo de líderes do agronegócio, como o atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi. Há um viés ideológico e regressista na decisão de Bolsonaro, que desconsidera questões de ordem técnica.

Pesa a visão dos militares sobre as reservas indígenas na Amazônia e a presença de ONGs internacionais que atuam na região, financiadas por governos estrangeiros e grandes empresas multinacionais. Essa questão, porém, já foi tratada no âmbito legislativo e tem vasta jurisprudência no Supremo Tribunal Federal, inclusive quanto à liberdade de ação das Forças Armadas para defender o território. Há também o lobby dos parlamentares ligados a setores que estão mais preocupados em lutar contra os órgãos de fiscalização que combatem o desmatamento, a grilagem de terras, a violência no campo e o trabalho escravo.

O problema, porém, é muito mais amplo. Não se trata apenas da Amazônia. Há a ocupação desenfreada do Cerrado pela pecuária e a soja, que vem provocando a desertificação de algumas regiões, inclusive no Planalto Central. Mais do que a preservação da Mata Atlântica, cuja ocupação e manejo está sob relativo controle, a poluição do ar e dos rios nas cidades brasileiras, além da destinação dos resíduos sólidos, são assuntos completamente fora do âmbito do Ministério da Agricultura.

Outra proposta é o fortalecimento do Ministério da Justiça, que incorporaria as atribuições do recém-criado Ministério da Segurança Pública, pasta para a qual deve ser convidado o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Criminal de Curitiba. A pasta será responsável por duas agendas fundamentais para a eleição de Bolsonaro: o combate ao crime organizado e à corrupção no governo federal.

O Ministério da Segurança Pública, sob comando de Raul Jungmann, iniciativa do governo Temer, possibilitou a criação de um sistema nacional de segurança pública e mudou a postura do governo federal em relação ao problema, que sempre ficou a cargo dos governos estaduais. Se o Ministério da Justiça mantiver o sistema unificado de segurança pública, pode ser que esse avanço seja preservado.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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