Nas entrelinhas: O esquindô-lê-lê

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Para o Palácio do Planalto, o barulho em torno da posse de Cristiane Brasil é o de menos, porque já está sendo abafado pelo clima de carnaval, que toma conta do país

A bancada do PTB, reunida ontem, decidiu manter a indicação da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) para o cargo de ministra do Trabalho, sepultando assim as esperanças do Palácio do Planalto de que a própria legenda indicasse outro nome para a pasta. O líder Jovair Arantes (PTB-GO) foi categórico: “Nós temos uma característica que é importante também deixar bem clara: nós não abandonamos companheiros feridos em uma batalha. Então, nós vamos até o fim”. Segundo ele, a Justiça criou o problema e terá que resolvê-lo. É um recado para a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, que manteve o impedimento de a parlamentar assumir o cargo por meio de liminar, mas ainda não tomou uma decisão monocrática definitiva nem encaminhou a questão ao plenário da Corte.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cuja liderança tem uma das ancoragens na bancada do PTB, endossou a decisão com uma crítica à Justiça Federal: “Porque em tese uma parte da sociedade acha que o Temer é ruim, não é motivo para um juiz de primeira instância assumir o papel de presidente da República”. Maia disse que não vê impeditivo para que a deputada assuma o cargo. “Ela não tem nenhum problema que a impeça de disputar a eleição presidencial. Agora, se ela vai ser uma boa ministra, se foi um bom nome, esse é um problema que cabe ao governo e ao PTB discutir”, arrematou, em sintonia com a insatisfação da maioria dos parlamentares com a interferência do STF em outros poderes.

Na mesma linha, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, reiterou que o governo não pretende recuar da indicação, porque seria abrir mão de uma prerrogativa da Presidência da República: “O presidente Michel Temer tomou a decisão política de nomear a Cristiane Brasil. É competência dele, ‘induvidável’ pela Constituição Federal. A indicação do nome é problema do PTB, mas a garantia da posse é problema nosso, do governo. Nós entendemos que o ato político do presidente da República tem que ser respeitado”, disse. Para o Palácio do Planalto, o barulho em torno do assunto agora é o de menos, porque já está sendo abafado pelo clima de carnaval que toma conta do país. Na verdade, já virou mote de marchinha de carnaval.

Temer não pode perder o apoio de Roberto Jefferson na reforma da Previdência. O presidente do PTB é um político cascudo, que manteve o controle da legenda mesmo estando preso, cumpre a palavra empenhada e não leva desaforo pra casa. Por isso, bancará a indicação até que a decisão da ministra Cármen Lúcia seja tomada. Para o Palácio do Planalto, há duas questões envolvidas: a manutenção da base do governo na Câmara e as prerrogativas constitucionais da Presidência, no caso, a nomeação de seus ministros. Ao se defender das acusações de que não teria moralidade para exercer o cargo, por causa da ação trabalhista de antigos funcionários, Cristiane Brasil fez tudo errado, inclusive um vídeo numa lancha ao lado de quatro amigos. Nesse ínterim, outras acusações surgiram, como a investigação aberta pela Polícia Civil do Rio de Janeiro em 2010 para apurar se assessores de Cristiane Brasil pagaram a traficantes para ter “direito exclusivo” de fazer campanha em Cavalcanti, bairro da Zona Norte da cidade.

Segunda instância

O esquindô-lê-lê somente não foi maior na Praça dos Três Poderes porque, no outro vértice do seu triângulo, o ministro Alexandre de Moraes surpreendeu os políticos e votou a favor da prisão após condenação em segunda instância do deputado federal João Rodrigues (PSD-SC), em processo ao qual respondeu como ex-prefeito de Criciúma. “A possibilidade de cumprimento provisório guarda juízo de consistência, porque são dois órgãos que realizam análise de mérito”, disse. Manteve a coerência com votos anteriores, decidindo o julgamento na primeira Turma do STF, ao lado de Luiz Roberto Barroso e Luiz Fux. Votaram contra a ministra Rosa Weber e Marco Aurélio Mello. A decisão tem repercussão no caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja sentença de condenação em segunda instância foi publicada ontem pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre.

Mais tarde, ao tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Luiz Fux reiterou a posição sobre a execução da Lei da Ficha Limpa, que impede condenados em segunda instância de participarem das eleições: “A estrita observância da Lei da Ficha Limpa se apresenta como pilar fundante da atuação do TSE. A Justiça Eleitoral, como mediadora do processo sadio, será irredutível na aplicação da Ficha Limpa”, disse. Segundo ele, teremos uma eleição presidencial que se anuncia como “a mais espinhosa e — por que não dizer — a mais imprevisível desde 1989”. É um recado para Lula. Mesmo que escape da prisão, estará fora da disputa eleitoral. Para Fux, quem for “ficha suja” estará fora do jogo democrático.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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