”Qualquer que seja a proposta de reforma administrativa, o governo não tem articulação política para impor suas posições. A reforma será formatada pela Câmara e pelo Senado”
Às vésperas do carnaval, a semana de trabalho em Brasília, principalmente no Congresso, está em clima de esquindolelê. Todos estão mais preocupados com a fantasia ou um lugar de sossego para atravessar a folia. Dificilmente o Palácio do Planalto e o Congresso vão tirar o atraso nos trabalhos, ainda que o presidente Jair Bolsonaro tenha anunciado que o governo apresentará sua proposta de reforma administrativa, que comparou ao parto de um filhote de elefante.
No Congresso, a pauta de votações está centralizada nos novos vetos presidenciais ainda não analisados. Qualquer que seja a proposta de reforma administrativa, o governo não tem articulação política para impor suas posições. A reforma será formatada pela Câmara e pelo Senado, ou seja, será depurada das propostas mais radicais de Paulo Guedes. A mesma coisa deve acontecer com a reforma tributária, que Bolsonaro deseja ressuscitar. A proposta que avança no Congresso é a de Baleia Rossi (PMDB-SP) e Bernard Appy, que conta com o apoio dos governadores.
Enquanto isso, a economia caminha a passos paquidérmicos. Registros de emprego formal evidenciam aumento de novas formas de contratação na geração de vagas em 2018 e 2019, mas a contrapartida é a pouca qualidade dos empregos e a baixa remuneração. No mercado financeiro, a interrupção nos cortes de juros pelo Banco Central, em fevereiro, gerou um ponto de interrogação quanto aos seus efeitos sobre a economia. A relação entre redução dos juros, alta do dólar e investimentos ainda está sendo analisada. Se, de um lado, gera ganhos fiscais para o governo, por causa dos juros da dívida pública, de outro, ainda inibe investimentos privados.
O mercado está de olho nos gastos do governo e cobra a aprovação das reformas. Desde a adoção do teto de gastos, em 2016, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), mantida pelo Senado, as despesas obrigatórias não melhoraram. “Sem efeito da cessão onerosa do pré-sal, deficit do governo central teria melhorado apenas 0,96 p.p. do PIB entre 2016 e 2019”, avalia o último boletim do IFI. A receita líquida federal cresceu 1,1%, sem cessão onerosa.
Nesse cenário de lenta recuperação da economia, a arrecadação permanece estável. Em contrapartida, os gastos com pessoal e previdência cresceram 1,3% e 3,0%, respectivamente, entre 2018 e 2019. O deficit do setor público teria sido de R$ 94,5 bilhões, em 2019, não fossem os leilões do pré-sal de outubro e dezembro. A dívida bruta do Tesouro somente diminuiu por causa da venda de reservas e das devoluções do BNDES ao Tesouro.
Derrubada
O rubicão do governo, porém, é um acordo para manutenção parcial do veto de Bolsonaro às emendas impositivas (VET 52/2019), que foi retirado da pauta de votação do Congresso na quarta-feira passada. Durante a sessão, as bancadas do Podemos, do PSL e da Rede entraram em obstrução, por não concordarem com a derrubada do veto. Para viabilizar a apreciação dos outros três vetos que constavam da pauta, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), retirou o veto.
O mais provável é que Alcolumbre deixe para depois do carnaval a apreciação do veto de Bolsonaro às emendas impositivas. Essa questão será decidida hoje, em reunião de líderes. A derrubada precisa ser negociada com o governo para evitar uma crise com o presidente. Segundo o relator do Orçamento para 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE), que incorporou R$ 30 bilhões em emendas de comissões e de sua própria autoria, o orçamento impositivo é uma vitória do Congresso, mas é possível construir um consenso com o governo.
Alcolumbre negociou o acordo para derrubada dos vetos com o ministro da Secretaria do Governo, general Luiz Eduardo Ramos, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e Domingos Neto, relator da proposta orçamentária para 2020. Mas faltou combinar com os demais líderes do Congresso. Os termos do acordo são a derrubada e a devolução de pelo menos R$ 11 bilhões em emendas do relator e das comissões para o governo, além de restabelecer o poder do Palácio do Planalto para contingenciar e administrar o fluxo de liberação das emendas que forem mantidas.
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