“Economistas liberais defendem a tese de que o ajuste deve ser imediato e profundo, para que a econmia possa se recuperar mais rapidamente. É uma aposta que nunca foi adotada”
Para quem tinha dúvidas, a indicação do economista Roberto Campos Neto, executivo do Santander, para comandar o Banco Central no governo Bolsonaro foi a confirmação de que o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, prepara a abertura do setor financeiro para que mais bancos estrangeiros possam operar no Brasil, como parte do choque liberal que pretende anunciar. Talvez seja a indicação mais simbólica da equipe, que incorporou alguns integrantes do atual governo, como Ivan Monteiro, na Petrobras, e Mansueto de Almeida, que deverá continuar na Secretaria do Tesouro, além da polêmica nomeação do ex-ministro Joaquim Levy para o BNDES. Como o sobrenome já diz, é neto do economista Roberto Campos, expoente do pensamento liberal no Brasil, que foi ministro do Planejamento no governo Castelo Branco.
Com 49 anos, formado em economia e com especialização em finanças pela Universidade da Califórnia, Campos Neto trabalhou no Banco Bozano Simonsen e na Caritas, antes de fazer carreira no Santander, onde atualmente ocupa a Tesouraria do banco. Embora a narrativa do novo ministro da Economia seja a favor da autonomia do Banco Central, com a fixação de mandatos para presidente e diretores da instituição não coincidentes, a indicação do economista reforça a interpretação de que Paulo Guedes exercerá rígido controle sobre o BC, que hoje é uma autarquia ligada ao Ministério da Fazenda, ainda que a independência do banco venha a ser aprovada.
A principal missão da autoridade monetária é o controle da inflação, tendo por base o sistema de metas. Quando as estimativas para a inflação estão em linha com as metas, o BC reduz os juros; quando estão acima da trajetória esperada, a taxa Selic é elevada. Outra atribuição do Banco Central é a política cambial, que executa por meio de intervenções no mercado, da oferta de contratos de “swap cambial”, a venda de dólares no mercado futuro, para segurar a alta da moeda. Sempre que ocorre ingerência política nas decisões sobre a taxa básica de juros, a Selic, e na supervisão do sistema financeiro, há reflexos diretos nos juros futuros e nas taxas bancárias. A redução a fórceps das taxas de juros, como no governo Dilma Rousseff, não funciona.
O maior problema de Guedes, entretanto, é o deficit fiscal da União e da maioria dos governos estaduais, cujo epicentro são os gastos com a folha de pagamentos e a Previdência. Economistas liberais defendem a tese de que o ajuste deve ser imediato e profundo, para que a econmia possa se recuperar mais rapidamente. É uma aposta que nunca foi adotada no Brasil desde a redemcratização. Desta vez, dependerá da disposição de Bolsonaro no sentido de enfrentar as corporações federais e os governos estaduais, forçando um ajuste que pode jogar sua popularidade no chão. Como o desemprego no Brasil é muito alto, em torno dos 13 milhões de trabalhadores que procuram colocação, a reação dos sindicatos de trabalhadores tende a ser insignificante, com exceção das entidades de funcionários públicos. Quebrar essa resistência é o maior desafio para aprovação da reforma da Previdência.
Estatais
Muitas coisas na esfera do próprio governo precisam ser resolvidas. As despesas com estatais deficitárias, por exemplo, aumentaram 125% entre 2009 e 2017, crescimento bem acima da inflação do período, de 69,9%. No total, os gastos com as empresas enquadradas nesse critério foram de R$ 67,9 bilhões. Algumas são importantes, como a Embrapa, de pesquisa agropecuária. Mas há coisas inexplicáveis, como a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), que deveria cuidar do projeto do trem-bala ligando São Paulo ao Rio, herança do governo Dilma Rousseff.
Esse aumento de despesas tem relação direta com o número de funcionários, que passaram de 37,9 mil em 2009 e chegam a quase 73,5 mil, com salário médio mensal de R$ 13,4 mil. Essas empresas explicam parte do crescimento do deficit primário e da dívida bruta do país. Com patrimônio líquido de R$ 8,244 bilhões, têm perdas previstas de R$ 7,3 bilhões com ações cíveis, trabalhistas, administrativas, fiscais e tributárias. Entre as mais deficitárias, duas são consideradas “imexíveis” pelos militares: a INB, que detém monopólio da produção e comercialização de materiais nucleares, e a Imbel, que fabrica armas, munições e explosivos.
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