“Ninguém leva o eleitor para votar puxando-o pelo nariz. Os que estão radicalizados são contra o PT e contra Bolsonaro; os que temem essa radicalização, tentarão viabilizar um tertius'”
O candidato a presidente da República do PSDB, Geraldo Alckmin, endureceu o discurso contra Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), que lideram as pesquisas de opinião, numa tentativa de evitar a completa desidratação de sua candidatura na reta final da campanha eleitoral. Fez ataques pesados e diretos ontem aos dois adversários nas redes sociais e no horário eleitoral gratuito, com esperança de conter a ascensão de ambos e evitar um desempenho catastrófico para seu partido e os aliados nas urnas. Uma campanha pelo “voto útil” também foi iniciada por dois intelectuais tucanos, a economista Eliana Cardoso e o cientista político Bolívar Lamounier, que lançaram um manifesto em apoio a Alckmin, dirigido aos demais candidatos do chamado “centro democrático”, para que retirem suas candidaturas.
“Apelamos aos candidatos que compõem o centro democrático para que se unam em torno de um nome com potencial de passar ao segundo turno e quebrar a perigosa polarização que está se configurando entre Bolsonaro e o PT. Apelamos a todos vocês — intelectuais, professores, profissionais liberais, cidadãos em geral — para que se unam a esse nosso esforço, endossando-o e ajudando a divulgá-lo”, explica a economista Eliana Cardoso nas redes sociais. O manifesto propõe uma reunião entre os candidatos: “Para que o eleitor não caia nas mãos de políticos extremistas, os candidatos do centro precisam se unir. A tarefa exige que os candidatos do centro, Alckmin, Marina, Álvaro Dias, Amoedo e Meirelles se encontrem e coloquem seus votos a favor do candidato que entre eles tem a maior chance de evitar uma tragédia. No momento, este nome é Alckmin”, afirmam.
Mais cauteloso, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso divulgou uma carta na mesma direção, mas sem citar nomes. Faz uma avaliação catastrófica do cenário político: “Desatinos de política econômica, herdados pelo atual governo, levaram a uma situação na qual há cerca de 13 milhões de desempregados e um deficit público acumulado, sem contar os juros, de quase R$ 400 bilhões só nos últimos quatro anos, aos quais se somarão mais de R$ 100 bilhões em 2018. Essa sequência de deficits primários levou a dívida pública do governo federal a quase R$ 4 trilhões e a dívida pública total a mais de R$ 5 trilhões, cerca de 80% do PIB este ano, a despeito da redução da taxa de juros básica nos últimos dois anos. A situação fiscal da União é precária e a de vários estados, dramática.”
O ex-presidente da República critica promessas de soluções fáceis para os problemas do país: “Diante de tão dramática situação, os candidatos à Presidência deveriam se recordar do que prometeu Churchill aos ingleses na guerra: sangue, suor e lágrimas. Poucos têm coragem e condição política para isso. No geral, acenam com promessas que não se realizarão com soluções simplistas, que não resolvem as questões desafiadoras. É necessária uma clara definição de rumo, a começar pelo compromisso com o ajuste inadiável das contas públicas”. E vai na mesma linha de um acordo entre os candidatos já no primeiro turno: “É hora de juntar forças e escolher bem, antes que os acontecimentos nos levem para uma perigosa radicalização. Pensemos no país e não apenas nos partidos, neste ou naquele candidato. Caso contrário, será impossível mudar para melhor a vida do povo”, apela.
Cartada final
Fernando Henrique Cardoso afirma que os eleitores estão polarizados entre dois apelos radicais e parecem decididos a pautar seu voto pelo medo. “A decisão do eleitor se explica. Os empregos faltam. As finanças públicas estão sob pressão e a política, podre. Sete cidades brasileiras estão entre as 20 mais violentas do mundo. Nesse quadro o apelo populista é forte”, critica. Segundo o ex-presidente da República, tanto Jair Bolsonaro como Fernando Haddad “representam uma ameaça para o Brasil e para a América Latina.” Velho desafeto dos tucanos, Ciro ficou de fora do chamado à unidade, mas será o desaguadouro natural do “voto útil” se não houver uma reação de Alckmin nas pesquisas.
Dificilmente haverá um reagrupamento dos chamados candidatos do centro democrático a duas semanas da votação. Interesses partidários, idiossincrasias pessoais e compromissos assumidos dificultam uma articulação tão ampla. Mas o discurso da unidade é uma tática eleitoral que pode ser eficiente para Alckmin, combinada ao endurecimento do discurso contra Bolsonaro e Haddad. Na reta final da eleição, ninguém leva o eleitor para votar puxando-o pelo nariz. Os que estão radicalizados são contra o PT e contra Bolsonaro; os que temem essa radicalização, tentarão viabilizar um “tertius”. A jogada tucana é para ocupar essa posição, deslocando Ciro Gomes (PDT), o que não é uma tarefa fácil. Estatisticamente, porém, não é impossível.