Desta vez, a esfinge é que foi devorada. Com a saída de Barbosa, que seria o grande outsider nas eleições deste ano, o jogo voltou a ser exclusivamente dos políticos, com seus defeitos e qualidades
Já virou lugar-comum a frase famosa do compositor e maestro Antônio Carlos Jobim: “O Brasil não é para principiantes”. Serve como uma luva para a decisão do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa de não concorrer à Presidência da República. O ex-ministro, depois que se filiou ao PSB, apareceu em todas as pesquisas como um candidato competitivo, mas em nenhum momento anunciou a candidatura. Nem a cúpula do PSB. Ontem, pelo Twitter, comunicou a desistência; os governadores do PSB agradecem.
Barbosa é orgulhoso de ter chegado aonde chegou pelo esforço pessoal; nas peladas ou nas sessões do Supremo, não era de levar desaforo para casa. Notabilizou-se como relator do mensalão, a ação penal que levou à cadeia o ex-presidente do PT José Genoíno, o tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex-ministro José Dirceu, entre outros caciques da legenda. Entretanto, não era um antipetista de carteirinha. Não só havia votado no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como se manifestou contra o impeachment de Dilma Rousseff.
A candidatura de Barbosa empolgou os militantes do PSB, mas não seus governadores, principalmente o de Pernambuco, Paulo Câmara; muito menos o de São Paulo, Márcio França, o vice que assumiu o lugar de Geraldo Alckmin (PSDB) com o compromisso de apoiar o tucano à Presidência. No encontro que teve com a Executiva do PSB, ficou patente a falta de empatia entre os caciques do partido e o jurista cascudo. Fizeram um pacto de não-agressão: Barbosa saiu falando que não havia se decidido ainda e, a Executiva do PSB, que avaliaria a candidatura.
Mesmo assim, o suspense mexeu com o posicionamento dos demais candidatos. As candidaturas de Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Alckmin foram abaladas. Barbosa também era uma ameaça para Jair Bolsonaro. A seguir, o ex-ministro passou a ser fustigado na mídia e nas redes sociais como se fosse candidato. O questionamento era sobretudo em relação às suas ideias políticas. Grosso modo, Barbosa é um democrata com ideais liberais sobre o Estado, mas muito pouco se sabe sobre o que pensa em relação à economia e à política propriamente dita. Nesse período de lusco-fusco, comportou-se como um grande mudo. E foi muito cobrado por isso.
Barbosa permaneceu assaltado pelas dúvidas em relação à candidatura, em razão de certa ojeriza pela política tradicional, que exige muita inteligência emocional para administrar conflitos, fazer alianças complexas, suportar traições e frustrações de toda ordem. Desta vez, a esfinge é que foi devorada. Com a saída de Barbosa, que seria o grande outsider nas eleições deste ano, o jogo voltou a ser exclusivamente dos políticos profissionais, com seus defeitos e qualidades.
Novo cenário
Ainda há muita indefinição no cenário eleitoral. Até agosto, com uma Copa do Mundo no meio do caminho, muita coisa pode acontecer. Mas algumas tendências já estão mais ou menos definidas. A primeira é a ausência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva do pleito. Preso em Curitiba, dificilmente sairá da cadeia até as eleições. Isso significa que não possa transferir votos para outro petista? Não, ainda tem prestígio eleitoral e conta com a resiliência dos militantes do PT. A insistência em manter sua candidatura, porém, fragiliza a campanha de seu substituto. Aparentemente, Lula está mais preocupado com a sua imagem do que com o desempenho eleitoral do seu eventual substituto. Entretanto, tudo dependerá da cabeça do eleitor.
Uma consequência imediata da não candidatura de Lula é o favoritismo de Bolsonaro (PSL), cuja campanha ganhou características de massa, embora não consiga ampliar suas alianças e tenha pouco tempo de televisão. A mesma coisa acontece, num quadrante à esquerda, com Marina Silva (Rede), que vive o mesmo dilema do isolamento político e da falta do tempo de televisão. Outra tendência é o fortalecimento da candidatura de Ciro Gomes (PDT), que herda os votos de Lula no Nordeste e pode vir a ser um candidato apoiado pelo próprio PT, como alguns petistas importantes já defendem nos bastidores. Álvaro Dias (Podemos) também se fortalece no Sul, avançando pela franja paulista da fronteira do Paraná.
E onde está o centro? A candidatura de Michel Temer à reeleição não passou de sonho de uma noite de verão. Encurralado pela Lava-Jato, o presidente da República não tem como manter o MDB unido em torno de seu nome por causa da impopularidade. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), que também se lançou candidato, não vive o drama da rejeição astronômica, mas também não consegue emplacar a candidatura. Quem resiste é Alckmin, muito mais pelo estoicismo do que pela sua força eleitoral. Fora do Palácio dos Bandeirantes, dedica-se a montar os palanques do PSDB nos estados e tenta uma aproximação com o MDB. A vantagem estratégica que tem na eleição é o tempo de televisão e esses palanques; mas ninguém sabe se isso funcionará como rampa de decolagem na eleição.