Nas entrelinhas: A porta de saída

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A resistência ao ajuste fiscal está encastelada na estrutura do Estado: são as corporações e seus privilégios e os grupos econômicos que aprisionam as políticas públicas

Qualquer que seja o seu percurso, a porta de saída da crise política brasileira são as eleições de 2018, a linha fina do horizonte que nos oferecem “a árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte — os beijos merecidos da verdade”, como no poema de Fernando Pessoa (Mensagem). Chegar até lá é um objetivo comum de todas as forças políticas. Por mais incrível que pareça, tanto o governo Temer e seus aliados quanto seus principais adversários, a começar pelo PT, têm esse mesmo objetivo.

Quais são as tarefas para chegar até lá em condições melhores do que as atuais? Em primeiro lugar, enfrentar a crise fiscal em seus diversos níveis. É possível fazer isso com uma estratégia de ajuste sustentável a longo prazo, que implicará num esforço comum do Palácio do Planalto, do Congresso e do Judiciário, em nível federal, e de governadores e prefeitos, e demais poderes, em níveis estadual e municipal. É aí que a PEC do teto dos gastos públicos e a reforma da Previdência se encaixam.

A outra opção é o salve-se quem puder, com cada um dos Poderes e entes federados puxando a brasa pra sua sardinha e tentando resolver isoladamente o seu problema, o que tende a aprofundar as desigualdades e os conflitos. Basta comparar os discursos dos governadores Luís Fernando Pezão, do Rio de Janeiro, e Paulo Hartung, do Espírito Santo, ambos do PMDB e à frente de estados banhados pelo petróleo da camada pré-sal.

O Rio de Janeiro está em colapso, que só não chegou mais cedo por causa da ajuda generosa de R$ 3 bilhões do governo federal às vésperas das Olimpíadas; o Espírito Santo está em ponto morto, com suas prefeituras na penúria. Embora o governo capixaba tenha dinheiro em caixa, ninguém quer investir. Ou seja, ninguém se salva sozinho da crise fiscal, da recessão e da onda de desemprego. Nenhum dos dois governos estaduais, por exemplo, aceita privatizar suas companhias de saneamento, que são cabides de emprego.

Onde está a resistência principal ao ajuste fiscal? No Congresso, as forças que foram desalojadas do poder pelo impeachment, principalmente o PT, não são suficientes para barrar as reformas. Na verdade, a resistência mais poderosa está encastelada na estrutura do Estado brasileiro: são as corporações e seus privilégios, de um lado, e os grupos econômicos, cujos interesses aprisionam as políticas públicas, de outro. É esse nó que precisa ser desfeito. Basta ver a resistência do Tribunal de Justiça e do Ministério Público do Rio de Janeiro ao pacote anunciado pelo governador Pezão, sustado ontem por medida liminar que impede a Assembleia Legislativa de discutir e aprovar as medidas propostas pelo governo fluminense, logo após o Palácio Tiradentes ser invadido por policiais.

Os barnabés fluminenses estrilam com a cobrança de uma alíquota extraordinária de 16% do salário ou vencimento de ativos e inativos que recebam mais de R$ 5.189 mensais. Essa cobrança seria feita por 16 meses e também depende de aprovação de projeto de lei. Outra medida proposta foi o aumento da alíquota previdenciária dos servidores de 11% para 14%. Segundo o texto, nenhum servidor estadual, ativo ou inativo, escapará das medidas para aumentar a arrecadação previdenciária: o pessoal da ativa e os aposentados que recebem mais de R$ 5.189,82 por mês terão o desconto aumentado de 11% para 14% do salário.

O Rio de Janeiro acreditou que o pré-sal resolveria seus problemas e deu um tiro no pé ao aceitar o regime de partilha do petróleo, que desorganizou o setor energético do estado, imaginando que resolveria a crise do seu sistema previdenciário com os royalties de petróleo. Mas também embarcou na megalomania das obras e nos projetos mirabolantes dos governos Lula e Dilma. Sem falar nos “gatos públicos”, como diria o João Saldanha, num trocadilho infamante. Acontece que a conta chegou faz tempo para os trabalhadores do setor privado, com a recessão e o desemprego. Agora, é a vez dos servidores públicos. É justo que lutem para não pagar a maior parte dessa conta. Provavelmente, a saída fácil é pendurar a conta na União. Mas não é assim que funciona. O melhor exemplo é o Rio Grande do Sul, cuja crise fiscal dura décadas, e nenhum governador se reelege.

A crise ética

Mas voltemos à porta de saída. A segunda tarefa para chegar às eleições de 2018 é enfrentar a crise ética. A tarefa principal é dos tribunais superiores: do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que julga os governadores; do Tribunal Superior Eleitoral, (TSE) que julga as contas de campanha; e do Supremo Tribunal Federal (STF), que julga tudo depois e enfrenta o desafio da Operação Lava-Jato. O estoque de políticos só aumenta porque a Justiça é lenta e a estratégia dos advogados é conseguir que seus clientes sejam salvos pela prescrição dos processos. A aprovação de uma anistia para o caixa dois dos políticos pelo Congresso não resolve o problema. Na hora em que o Supremo começar a julgar os envolvidos no escândalo da Petrobras, a crise ética se dissipará.

A outra vertente do processo é a chamada reforma política. Quem quiser que se iluda. Os grandes partidos, que são os mais envolvidos na aguardada delação premiada de Marcelo Odebrecht e seus executivos, vão fazer uma reforma para sobreviver à borrasca. Não estão nem aí para a renovação política. Nada que possa ameaçar a sobrevivência da maioria dos atuais senadores e deputados será aprovado. É aquela velha história: não convidem os perus para a festa de Natal.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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