Nas entrelinhas: Homem ao mar

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A decisão da Primeira Turma do STF, que afastou Aécio Neves (PSDB-MG) do Senado, provocou uma espécie de efeito Orloff entre os senadores:“Eu sou você amanhã”

O Palácio do Planalto organiza uma operação de salvamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG), afastado do mandato por polêmica decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. A cúpula do Senado reagiu à decisão, tomada por três votos a dois, como a tripulação de uma embarcação que tenta salvar um marinheiro que caiu no mar em meio à tempestade. Há três tipos de manobras possíveis, todas precisam guinar o barco para o bordo da queda, fazê-lo voltar ao local do acidente e posicioná-lo à barlavento, de modo a proteger o náufrago das ondas com o próprio casco. É o que o Senado provavelmente fará, com o apoio do Palácio do Planalto, o que aumentará a tensão entre os poderes da República.

PMDB e PT também se mobilizaram para salvar Aécio, mais até do que o próprio PSDB, que está dividido entre os aliados do senador mineiro — presidente afastado da legenda — e os liderados pelo presidente interino, senador Tasso Jereissati (CE). O principal gesto de solidariedade a Aécio veio do presidente Michel Temer, que se reuniu com o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), para articular a rejeição da decisão da Primeira Turma do Supremo pelo plenário da Casa.

Há duas grandes motivações para isso: primeiro, Aécio é o principal aliado de Temer no PSDB e teve um papel fundamental na rejeição da primeira denúncia do então procurador-geral, Rodrigo Janot, contra o presidente da República pela Câmara e, ao retribuir o gesto, com seu apoio, Temer consolida o respaldo da ala governista do PSDB à rejeição da segunda denúncia pela Câmara. Segundo, como a maioria dos senadores do PMDB e do PT está enrolada na Operação Lava-Jato, a decisão da Primeira Turma do STF provocou uma espécie de efeito Orloff (“eu sou você amanhã”) no Senado, pois outros parlamentares podem sofrer o mesmo tipo de punição quando seus processos forem a julgamento.

A decisão da Primeira Turma realmente é polêmica, até mesmo no Supremo. Os ministros do STF Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux votaram a favor do afastamento de Aécio, que também teve que entregar o passaporte, está proibido de viajar para fora do país e não pode sair de casa à noite. Ontem, o ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, que votou contra o afastamento — como o ministro Alexandre Moraes —, defendeu a tese de que o Senado pode rever a decisão: “Eu sustentei, sem incitar o Senado à rebeldia, na minha decisão, que, como o Senado pode rever uma prisão determinada pelo Supremo, ele pode rever uma medida acauteladora”.

A Constituição determina que, nos casos de prisão em flagrante de senadores, por exemplo, o Senado deve, num prazo de 24 horas, autorizar ou não a manutenção da detenção, mas não prevê uma situação como a de agora, ou seja, o recolhimento domiciliar, que é uma “medida cautelar” prevista no Código Penal. Barroso, que liderou a derrubada do voto de Marco Aurélio, rechaçou a possibilidade de revisão da decisão: “O que a Primeira Turma fez foi restabelecer as medidas cautelares, inclusive a de afastamento que já havia sido estabelecida pelo ministro Fachin, acrescentando uma: que é a do recolhimento domiciliar no período noturno”, disse Barroso.

Manipulação

Aécio reagiu à decisão com uma nota, na qual afirma que a medida foi “proferida por três dos cinco ministros da Primeira Turma do STF como uma condenação sem que processo judicial tenha sido aberto”. Disse que nem sequer foi considerado réu e que não teve direito à defesa. E desqualificou a acusação: “As gravações consideradas como prova pelos três ministros foram feitas de forma planejada a forjar uma situação criminosa. Os novos fatos vindos à tona comprovam a manipulação feita pelos delatores e confirmam que um apartamento da família colocado à venda foi oferecido a Joesley Batista para que o senador custeasse gastos de defesa. Usando dessa oportunidade, o delator ofereceu um empréstimo privado ao senador, sem envolver dinheiro público ou qualquer contrapartida, não incorrendo, assim, em propina ou outra ilicitude”, argumentou.

O líder da bancada do PSDB, Paulo Bauer (SC), já apresentou requerimento para que uma sessão extraordinária seja convocada com objetivo de deliberar sobre a questão. O presidente do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), porém, aguardava comunicação oficial do STF, o que aconteceu na noite de ontem. “Primeiro, o Senado precisa ser notificado sobre o teor da decisão tomada pela Suprema Corte para saber de que forma vai agir. Se vai ou se não vai agir. Não sei qual o teor da decisão e tenho o hábito de dizer aqui que eu não falo sobre hipótese”, declarou.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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