Palocci sempre teve trânsito fácil junto aos grandes empresários do país, principalmente os que faziam negócios com o Estado
A prisão do ex-ministro da Fazenda (Governo Lula) e ex-ministro da Casa Civil (Governo Dilma) Antonio Palocci, ocorrida ontem, era pedra cantada nos meios políticos e jurídicos. Desde o começo da Operação Lava-Jato, havia expectativa de que ocorreria, mas demorou, porque o esquema que ele operava era o mais seguro e sofisticado do chamado petrolão. Sabe-se, agora, segundo a Polícia Federal e o Ministério Público, que Palocci era uma espécie de intermediário da relação entre a Odebrecht, o PT e a Presidência da República. Suas consultorias, segundo os investigadores da Lava-Jato, eram apenas uma grande cortina de fumaça.
Palocci sempre teve trânsito fácil junto aos grandes empresários do país, principalmente os que faziam negócios com o Estado, desde quando coordenou o programa de governo de Lula, nas eleições de 2002. Sua passagem pelo Ministério da Fazenda era considerada pelo mercado o melhor momento da política econômica pós-FHC. De fala mansa, posições equilibradas e discreto, não se envolvia nas disputas internas do PT, era o homem da conciliação. Tanto que foi coordenador da campanha de Dilma Rousseff em 2010 e seu ministro da Casa Civil, mesmo depois de ter perdido uma disputa contra o ex-ministro Guido Mantega e a ex-presidente da República, à época, a poderosa ministra da Casa Civil sobre o “deficit zero”.
A 35ª fase da Operação Lava-Jato, chamada de Ormetà — código de honra da máfia napolitana, que exigia voto de silêncio de seus integrantes — surgiu de uma planilha que foi apreendida na 23ª fase da Lava-Jato, chamada de Acarajé, na qual foram presos o marqueteiro do PT, João Santana, e sua esposa e sócia, Mônica Moura. De acordo com o MPF, a planilha mostra valores ilícitos repassados a Palocci durante as campanhas eleitorais e mesmo depois. Chamava-se “Posição Programa Especial Italiano”. A força-tarefa concluiu que “Italiano” é o codinome do ex-ministro por causa das mensagens no celular do empresário Marcelo Odebrecht, que está preso.
A “segurança” do esquema do Grupo Odebrecht foi quebrada por Maria Lúcia Tavares, do “setor de operações estruturadas”, o que permitiu o aprofundamento das investigações. A ex-funcionária da Odebrecht teria ajudado a polícia a entender como funcionava o esquema de propina, mesmo sem saber direito quem eram os verdadeiros beneficiados, por causa dos “nomes de guerra”. Palocci deixou a Casa Civil de Dilma em 2011, quando parecia ter dado a volta por cima, por causa da compra de um apartamento de R$ 6 milhões no bairro dos Jardins, praticamente à vista. Na época, justificou a multiplicação do patrimônio por quase 20 vezes: seriam “honorários” de consultorias.
Como havia sido coordenador da campanha de Dilma Rousseff, muitos petistas ficaram revoltados com os ganhos de Palocci. O ex-presidente do PT José Genoíno, que foi condenado no julgamento do mensalão, ao saber do ocorrido, chegou a chorar numa conversa com o deputado federal José Guimarães (PT-CE), seu irmão. Não conseguira se reeleger deputado federal em São Paulo, em 2010, por causa do desgaste com a CPI dos Correios e da falta de recursos. Na reta final da campanha, Genoíno pediu ajuda a Palocci, que coordenava a campanha de Dilma, ao lado do ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardoso e do ex-senador Eduardo Dutra (PE-SE), já falecido, que então presidia a legenda. Palocci negou, e o petista ficou sem recursos para a “boca de urna”.
Planilha
Segundo a procuradora da República Laura Gonçalves Tessler, Palocci intermediou o pagamento de vantagens indevidas de 2006 até novembro de 2013, atuando em defesa dos interesses da empresa Odebrecht perante os governos Lula e Dilma; de janeiro a maio de 2011, foi ministro da Casa Civil. Como o cargo de tesoureiro do PT virou uma cadeira maldita, pois todos os seus ex-ocupantes nos governos petistas estão enrolados na Operação Lava Jato, só falta a ex-presidente Dilma. Na planilha apreendida, segundo o MPF, entre 2008 e o final de 2013, foram pagos mais de R$ 128 milhões ao PT e seus agentes, incluindo Palocci. Sobrou, ainda, em outubro de 2013, um saldo de propina de R$ 70 milhões, também destinado ao ministro.
O pior, porém, está por vir. Palocci tinha a chave da cobertura do andar de cima do esquema. Para usar a expressão do ministro-relator da Operação Lava-Jato, Teori Zavascki, ao puxar a pena, apareceram as galinhas da Odebrecht: as propinas para aprovação da lei de conversão da Medida Provisória 460/2009, que resultaria em benefícios fiscais para a empreiteira; do aumento da linha de crédito junto ao BNDES para Angola, país com o qual a empresa tinha relações comerciais; interferência em licitações da Petrobras para aquisição de 21 navios-sonda para exploração da camada pré-sal; e do favorecimento de negócios do programa do submarino nuclear da Marinha (Prosub). Mas a investigação não ficará nisso, pois a planilha da Odebrecht revela também as operações da empresa nos estados.
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