Gilmar Mendes anulou todos os atos processuais produzidos pelo ex-juiz Sergio Moro em duas ações penais contra o ex-ministro petista, por parcialidade
A anulação das condenações do ex-deputado federal José Dirceu, pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), trouxe o petista histórico de volta à cena política do país, com plenos direitos políticos. Dirceu havia sido condenado a 23 anos e três meses de prisão pelo então juiz e atual senador Sergio Moro (União-PR), que apontou o ex-chefe da Casa Civil do primeiro governo Lula como suposto beneficiário de R$ 15 milhões em propinas pagas pela empreiteira Engevix, por cinco contratos de obras da Petrobras.
Dirceu vinha mantendo discreta atuação política, sempre nos bastidores, mas circulava com desenvoltura e, toda vez que aparecia em público, em algum evento social que reunisse políticos, era reverenciado pelos interlocutores. Já havia retomado também a militância no PT, participando de reuniões e conversas informais, com a mesma discrição. Agora, livre das condenações, deve intensificar sua atuação, mas não decidiu ainda se pretende voltar à cúpula do PT e/ou disputar eleições. Oráculo dos principais dirigentes petistas nunca deixou de ser.
Gilmar Mendes anulou todos os atos processuais produzidos por Moro em duas ações penais contra José Dirceu. A decisão foi proferida na Petição (PET) 12229 e divulgada nesta terça-feira. O ex-ministro foi beneficiado pelo fato de a Segunda Turma do Supremo, em março de 2021, declarar a parcialidade de Moro nas ações penais contra Lula.
Segundo o ministro do STF, com base nos diálogos revelados pela Vaza Jato e outros elementos trazidos nos autos, houve ação coordenada entre Moro e a força-tarefa da Lava-Jato para acusar e denunciar José Dirceu. A atuação serviria de ensaio para a denúncia que seria posteriormente oferecida contra o presidente Lula. Apesar de o ex-ministro não ter sido denunciado no caso, José Dirceu é mencionado 72 vezes na denúncia contra Lula no caso do triplex do Guarujá.
Na decisão, Gilmar critica a “confraria formada pelo ex-juiz Sergio Moro e os procuradores de Curitiba”. Avalia que a Operação Lava-Jato “encarava a condenação de Dirceu como objetivo a ser alcançado para alicerçar as denúncias que, em seguida, seriam oferecidas contra Luiz Inácio Lula da Silva”. E que houve “ausência de imparcialidade” na condução dos processos e, por isso, o ex-ministro não teve um julgamento justo. Com a decisão, na prática, Dirceu passa a ser considerado “ficha-limpa”.
Segunda vitória
A sentença atende ao pedido da defesa para estender ao ex-ministro a decisão da 2ª Turma do STF que considerou Moro parcial ao julgar Lula. Gilmar afirma: “A extensão, assim, legitima-se não como uma medida geral, que aproveita a qualquer outro investigado na Lava-Jato, mas devido a indicativos de que o juiz e procuradores ajustaram estratégias contra esses réus, tendo a condenação de um deles como alicerce da denúncia oferecida contra outro”.
Prossegue o ministro do STF: “Ante o exposto, ante a situação particular do réu, defiro o pedido da defesa para determinar a extensão da ordem de Habeas Corpus (…) anulando todos os atos processuais do ex-juiz federal Sergio Moro nesses processos e em procedimentos conexos, exclusivamente em relação ao ex-ministro José Dirceu”. Ao longo de 24 páginas, Gilmar menciona sete indícios que o Supremo levou em conta ao considerar que houve quebra de imparcialidade por Moro ao julgar Lula e cita mensagens entre a força-tarefa de Curitiba e o ex-juiz reveladas pela imprensa.
O fato de Moro ter deixado a magistratura para assumir o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro também é apontado como demonstração de parcialidade. Segundo o ministro do STF, Moro tinha o desejo de “impulsionar movimentos sociais e forças de oposição ao partido político liderado pelo paciente —forças estas a que ele mesmo, em seguida, viria a aderir, quando aceitou o convite para integrar o governo de Jair Bolsonaro”.
Esta é a segunda vitória obtida por Dirceu neste ano no tribunal. A Segunda Turma do STF extinguiu no final de maio a pena à qual o ex-ministro foi condenado, por corrupção passiva, no âmbito da Operação Lava-Jato. O ex-ministro da Casa Civil, no entanto, seguia inelegível pela Lei da Ficha Limpa, apesar da vitória que obteve no STF. Isso porque havia recursos contra duas condenações em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) aguardando julgamento. Agora não há mais.
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