Estima-se que o pleito de 2018, pelas regras atuais, exigiria a criação de um superfundo eleitoral da ordem de R$ 4 bilhões
Falando francamente, o motor principal da reforma política em discussão no Congresso Nacional é o medo de perder as eleições. Essa é a motivação principal dos políticos que protagonizam o debate, não é um sistema eleitoral que garanta uma representação política mais autêntica e democrática, comprometida com o eleitor. Pelo contrário, é a busca de mecanismos de autopreservação de uma elite política que fracassou. Os donos do poder no Congresso são parceiros da crise ética que o país atravessa. Uns mais, outros menos, é verdade, mas o desgaste dos grandes partidos e dos seus líderes é uma demonstração de fracasso coletivo.
A melhor estratégia para enfrentar esse debate, em circunstâncias normais, seria aprovar as reformas de Estado, que o país exige, e retirá-lo da crise. Mas há um fator imponderável no processo, a Operação Lava-Jato, que está jogando as reputações das principais lideranças do país na lama por causa do caixa dois eleitoral. E há também a marcha inexorável do tempo em relação ao pleito de 2018, que está logo ali, como sabem os que terão que renovar os mandatos. Mesmo que o Congresso faça tudo certo, o tempo é curto para capitalizar seus efeitos na sociedade. O tsunami das eleições municipais de 2016 está na memória de todos e pode se repetir no próximo ano. É isso que assombra os políticos.
Qualquer advogado da Lava-Jato sabe que dificilmente os políticos com direito a foro privilegiado serão julgados pelo Supremo Tribunal federal (STF) antes das eleições. De um lado, isso significa que poderão concorrer em 2018; de outro, que terão enorme dificuldades para se eleger com o voto for uninominal. Estão vivendo, agora, o drama dos políticos envolvidos no “mensalão” que não conseguiram se reeleger em 2010. O melhor exemplo talvez seja o ex-deputado José Genoíno, um ícone petista, que foi engolido pelos próprios companheiros de chapa; a mesma situação se deu com o ex-deputado Cândido Vaccarezza, em 2014, que também não se reelegeu, “queimado” pela Lava-Jato, embora depois tenha sido excluído do processo do ex-deputado André Vargas pelo juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba.
Salvação
O esforço para salvar a elite política do país, porém, tem uma mãozinha do Judiciário e outra do Executivo. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, protagoniza o engajamento da alta magistratura no debate sobre a reforma política. O presidente Michel Temer, que no passado defendeu a adoção do “distritão”, também está engajado na operação, embora com mais discrição. Até a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármem Lúcia, já se pronunciou sobre a reforma: defendeu um plebiscito para aprová-la, como se o Congresso não tivesse legitimidade constitucional. Plebiscito também pode dar errado, como na Itália, onde o povo votou contra a reforma do sistema eleitoral.
Até agora a voz mais sensata sobre o que está acontecendo é a do cientista político Jairo Nicolau, estudioso do assunto: “Para colocar qualquer coisa no lugar do atual sistema se exige reflexão mais profunda. Não vai ser agora o melhor momento, num ambiente desse em que o Congresso perdeu tanta legitimidade e abriga um monte de investigados. Melhor que seja feita na próxima legislatura, que provavelmente terá muita renovação”. Segundo ele, falta uma “ideia-força que galvanize o debate, como já foi a lista fechada, em 2007, e o distritão, em 2015”. Para Nicolau, “a ideia-força é apenas como financiar o sistema depois que ele desabou”.
Tem toda razão. A crise de financiamento dos partidos vem de longe, mas chegou ao colapso. A delação premiada da Odebrecht, que jogou na vala comum da Lava-Jato todos os políticos que receberam dinheiro do caixa dois da empresa, não importando se estavam envolvidos nas maracutaias da empreiteira diretamente ou receberam o dinheiro “lavado” como doação legal sem saber a origem. Um caso mais emblemático é o do ex-deputado Mílton Temer (PSOL), candidato ao Senado em 2010, citado na lista da Odebrecht porque recebeu uma doação eleitoral de um velho colega da Escola Naval, dono de uma distribuidora de bebidas, que estava no esquema de lavagem da empreiteira. Ele fazia feroz oposição ao governo Lula e nada sabia sobre a origem do dinheiro.
As eleições municipais poderiam ter resolvido em grande parte o problema do financiamento eleitoral se o voto distrital ou distrital misto tivesse sido adotado, barateando o custo das eleições, o que poderia ser feito por legislação ordinária (o pleito municipal não é regulamentado pela Constituição), mas a maioria não quis arriscar. A simplificação das eleições municipais por si só reduziria o custo das demais, pois limitaria drasticamente o número de candidatos e, por isso mesmo, de futuros cabos eleitorais profissionais.
O fundo partidário foi triplicado para R$ 800 milhões em 2015, porém as campanhas eleitorais de 2014 custaram cerca de R$ 5 bilhões. Estima-se que o pleito de 2018, pelas regras atuais, exigiria a criação de um superfundo eleitoral da ordem de R$ 4 bilhões. Esse seria o preço do atual sistema partidário, mas acontece que o problema não é somente esse. Os políticos citados na Lava-Jato controlam os partidos, mas não controlam o eleitor. Querem se blindar com o voto em lista fechada, mas isso pode ser um tiro pela culatra.
O presidente brasileiro defendeu a taxação de operações financeiras de super-ricos, para financiar o combate…