A economia foi blindada pela política monetária, não tem notícia ruim que faça o índice Bovespa cair. Mas a crise ética se mantém e puxa o governo pra baixo
]Mais um mês de indicadores positivos para a economia, que consolidam a avaliação de que a recessão ficou para trás e o país finalmente voltou a crescer, embora lentamente. Mesmo assim, o governo não consegue surfar a onda dessas notícias e melhorar a popularidade. Por duas razões: primeira, as taxas de crescimento ainda são muito baixas (previsão de 0,6% em 2017, no último Boletim Focus); segunda, o governo está cada vez mais enredado na Operação Lava-Jato (ontem o Supremo Tribunal Federal (STF), por 10 a 1, decidiu encaminhar a segunda denúncia do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer para apreciação da Câmara).
Dois indicadores econômicos costumam impactar a opinião pública: a inflação e o emprego. A prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) ficou em 0,11% em setembro, 0,24 ponto percentual abaixo do índice de 0,35% registrado em agosto, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É o menor resultado para um mês de setembro desde 2006, quando o índice foi de 0,05%. No mesmo mês no ano passado, o IPCA-15 havia sido de 0,23%. Nos últimos 12 meses, o índice foi de 2,56%, abaixo dos 2,68% registrados nos 12 meses imediatamente anteriores. Os dois acumulados, segundo o IBGE, são os mais baixos para um mês de setembro desde 1998, quando os resultados foram 1,63% e 2,45%, respectivamente. O destaque ficou com a redução do preço dos alimentos — menos 1,54%, com atenção especial para o tomate (-20,94%), o feijão-carioca (-11,67%), o alho (-7,96%), o açúcar cristal (-4,71%) e o leite longa vida (-3,83%).
São números impressionantes, muito próximos dos observados na reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, que tinha 43% de ótimo e bom e 17% de ruim e péssimo. Entretanto, Temer tem uma avaliação negativa de 75% e positiva de menos de 4%. Supõe-se que uma das variáveis a se considerar é o problema do desemprego. Mas esses indicadores também estão melhorando. No mês de julho, o destaque foi o crescimento do emprego no mercado informal, ou seja, sem carteira assinada. Os dados de agosto revelam a criação de 35.457 vagas de trabalho com carteira assinada, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgado pelo Ministério do Trabalho nesta quinta-feira. Foram registradas 1.254.951 contratações e 1.219.494 demissões de trabalhadores com carteira assinada. Foi também a primeira vez, desde 2014, em que as contratações superaram as demissões no mês de agosto.
Os resultados são tão significativos que o Banco Central já se prepara para redigir uma carta de desculpas por ter errado no cálculo da meta de inflação de 4,5%, cuja margem de erro é de 1,5%. Estima-se que a inflação de 2017 ficará abaixo de 3%, o que já provoca especulações sobre a taxa de juros, cuja redução chegou a 8,25%. A queda dos juros deve continuar até 7%, mas já há especulações no governo de que a taxa pode chegar a 6%, um índice até então inimaginável. Avaliações a posteriori acusam o BC de provocar uma recessão maior do que deveria quando elevou a taxa de juros, mas esse é um debate para a academia. Na política, a discussão é outra: às favas a reforma da Previdência e o enxugamento da máquina pública, ninguém segura a retomada do crescimento, que pode passar de 3% no próximo ano. Será?
Casa do perigo
A caveira de burro é a impopularidade do governo, muito agravada pelo envolvimento do PMDB e do presidente Michel Temer na Operação Lava-Jato. A economia foi blindada pela política monetária, não tem notícia ruim que faça o índice Bovespa cair. Mas a crise ética se mantém e puxa o governo pra baixo. Além do desgaste dos envolvidos diretamente nas denúncias do Ministério Público Federal, existe um estresse na base governista na Câmara, que precisa ser mobilizada para rejeitar a denúncia. As relações entre o Palácio do Planalto e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), estão deterioradas. Ele é o substituto natural do presidente da República em caso de afastamento temporário.
Na votação da primeira denúncia, houve certo agastamento, mas Maia não deu margem a que as especulações prosperassem. Seu empenho manteve Temer no cargo. Em vez de melhorar a relação, essa atuação, porém, aumentou a insegurança palaciana e os atritos entre as cúpulas do PMDB e do DEM. Maia fez críticas aos peemedebistas, especialmente o senador Romero Jucá (RR), que preside o partido de Temer. Essas críticas foram verbalizadas num jantar na casa da senadora dissidente Katia Abreu (PMDB-TO), do qual participaram outro dissidente, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), e o deputado da oposição Orlando Silva (PCdoB-SP), além do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). “Não é para discutir críticas ao presidente. Mas a situação política é crítica. Então, naturalmente, críticas foram feitas”, disse Maia. É para Temer o recado.