“Militares passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas”
Depois da blindagem da equipe econômica, que foi escalada pelo futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, as nomeações recém-anunciadas pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, sinalizam uma blindagem para o programa de obras, privatizações e concessões do governo, que deverá ficar a cargo do futuro ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo. A escolha do novo ministro de Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, que responderá pelas áreas de Transportes, Portos e Aviação Civil, vai na mesma direção.
“Vamos intensificar as parcerias em rodovias, ferrovias e aeroportos, tal qual está sendo feito hoje. Isso vai ser intensificado. A ideia é trazer o setor privado para a área de infraestrutura”, disse o futuro ministro, que dirigiu o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Tarcísio de Freitas já acompanha o leilão dos próximos 12 aeroportos, cujo edital foi aprovado, ontem, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), e da Ferrovia Norte-Sul.
Bolsonaro anunciou que somente iniciará obras quando houver recursos no orçamento para concluí-las, mas pretende dar continuidade àquelas que já foram iniciadas e estão paralisadas: “Não podemos abandonar isso, porque custaria muito caro para nós”, disse. Consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Tarcísio de Freitas é engenheiro civil formado pelo Instituto Militar de Engenharia, com pós-graduação em gerenciamento de projetos e engenharia de transportes. Ex-capitão do Exército, foi chefe da seção técnica da Companhia de Engenharia do Brasil na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti.
Com as novas nomeações, os generais que integram a cúpula do governo passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção, por envolverem grandes contratos e concessões com empresas privadas. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas, que passarão a ser gerenciados pelos militares. Os interesses envolvidos são os mesmos; entretanto, mudaram os gestores e o ambiente, em razão da Operação Lava-Jato.
Indulto de Natal
O procurador Deltan Dallagnol denunciou, ontem, no Twitter, uma “intensa articulação” nos bastidores do Supremo Tribunal Federal (STF) para liberar o indulto de 2017, concedido pelo presidente Michel Temer, que “perdoava 80% da pena dos corruptos”. Segundo o procurador, se isso ocorrer, Temer poderá fazer a mesma coisa no Natal deste ano. O indulto é um perdão de pena e costuma ser concedido todos os anos em período próximo ao Natal, atribuição do presidente da República.
O julgamento deve continuar hoje, com o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que concedeu liminar (decisão provisória), em março, limitando a aplicação do indulto e aumentou o período de cumprimento para, pelo menos, um terço da pena. Barroso permitiu o indulto somente para quem foi condenado a mais de oito anos de prisão e vetou a concessão para crimes de colarinho-branco e para quem tem multa pendente. O governo recorreu, alegando que Barroso invadiu a “competência exclusiva” do presidente da República ao alterar as regras do indulto fixadas por Temer. O julgamento no STF se limita à validade do decreto editado em 2017.
Um parecer do criminalista Nabor Bulhões, da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil e advogado de Temer na Lava-Jato, defende a constitucionalidade do decreto de indulto de Natal do ano passado, que foi suspenso por liminar do Supremo Tribunal Federal a pedido da Procuradoria-Geral da República. Segundo o parecer, não há inconstitucionalidade na inclusão dos crimes relacionados à corrupção no perdão presidencial, e a intervenção do Judiciário pode representar uma afronta ao princípio da separação de poderes.
Ao editar o decreto, Temer modificou algumas regras e, na prática, reduziu o tempo de cumprimento de pena pelos condenados, o que gerou críticas da Transparência Internacional e da força-tarefa da Operação Lava-Jato. O artigo 84 da Constituição, XII, estabelece que “compete privativamente ao Presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos por lei”.