A proposta de semipresidencialismo foi adotada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, que pretende pôr em votação a emenda constitucional do tucano Samuel Moreira
A Praça dos Três Poderes foi pensada como espaço laico, para simbolizar a construção institucional do Brasil em bases democráticas. No Planalto Central do país, encarna a representação da independência e harmonia entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, essência da República. O triângulo equilátero imaginado por Lucio Costa mimetiza a geometria de Montesquieu nessa tripartição do Estado. Nesse espaço, foram construídos: ao Sul, o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), sede do Poder Judiciário; ao Norte, o Palácio do Planalto, sede do Poder Executivo; e, a Oeste, o Congresso Nacional, sede do Poder Legislativo. Segundo Oscar Niemeyer, “a disposição dos palácios daquela maneira foi simplesmente a forma que Lucio Costa encontrou para dar elegância à obra”.
“Os dois arquitetos não pensaram em construir a beleza, seria fácil: eles ergueram o espanto inexplicado”, resumiu Clarice Lispector. A construção de Brasília agregou não apenas a capacidade do esforço coletivo do povo brasileiro, tão bem representado pelos candangos, mas também a vontade de formar uma nova sociedade baseada em valores sociais e éticos sólidos, direcionando-o para uma realidade de mais justiça social e econômica. Para Lucio Costa, Brasília “foi concebida e construída com decisão e com fé num Brasil diferente e num mundo melhor — a sua arquitetura e o seu urbanismo exprimem essa confiança — e isto, no final das contas, é o que importa”.
O prédio do Congresso Nacional é a obra predileta de Niemeyer no conjunto arquitetônico de Brasília. É composto por duas cúpulas que representam os plenários da Câmara dos Deputados (virada para cima) e do Senado Federal (virada para baixo). Os dois prédios verticais de 28 andares — os mais altos de Brasília — das duas Casas Legislativas são unidos por uma passarela, formando a letra “H”, uma alusão aos conceitos de “homem, honra e honestidade”. Mais “espanto inexplicável”. O parlamento brasileiro, desde a abdicação de D. Pedro I, é a casa das saídas institucionais. Sempre foi o contraponto ao Executivo vertical, ao predomínio do Estado sobre a sociedade e ao iluminismo do Judiciário, ao qual cabe defender os cidadãos dos abusos de autoridade e do poder econômico. Não obstante, gosta da “pequena política”. Também espelha as mazelas seculares da vida política nacional: o clientelismo, o fisiologismo, o patrimonialismo etc. Por ser a representação política de toda a sociedade, ninguém está na Câmara ou no Senado somente porque quis, ainda que o Congresso, muitas vezes, se descole das aspirações populares. Todos foram eleitos e, como dizia Ulysses Guimarães, só têm medo de povo nas ruas.
Semipresidencialismo
De volta à arquitetura e ao urbanismo, a centralidade do Congresso na Praça dos Três Poderes expressa um viés parlamentarista da política brasileira, cuja essência é a velha “política de conciliação” herdada do Império. Entretanto, o regime parlamentarista já foi rejeitado em dois plebiscitos: em 1963, no governo João Goulart, que, para assumir a Presidência, após a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, teve que engolir o parlamentarismo; e em 1993, no governo Itamar Franco. Por muito pouco, não foi adotado pela Constituição de 1988, concebida originalmente com esse fim. Um desentendimento entre o presidente José Sarney, que queria mais um ano de mandato, e o líder do então PMDB, Mário Covas (SP),interessado em disputar a Presidência, impediu que fosse aprovado.
Agora, o próprio José Sarney e o ex- presidente Michel Temer, ambos do MDB, aliados aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), advogam a adoção de um sistema híbrido, o semipresidencialismo, inspirado nos modelos português e francês. Querem evitar que o país viva sempre diante da ameaça de crise institucional, com o impeachment como espada sobre a cabeça de todo governante. A proposta foi encampada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que pretende pôr em votação a emenda constitucional do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre o assunto. Sua proposta é que o regime seja adotado a partir de 2026. O ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pretende voltar ao poder nas eleições de 2022, não gostou nem um pouco: “Semi- presidencialismo é outro golpe para tentar evitar que nós possamos ganhar as eleições. Não dá para brincar de reforma política, isso é coisa que tem que ser discutida com muita seriedade”, afirmou ontem. Pode ser que esteja perdendo uma oportunidade histórica.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…