O governo está desorientado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, parece enveredar pelo “quanto pior, melhor”, para prorrogar a “economia de guerra”
Vinte e quatro horas passaram-se, e as eleições para a Presidência dos Estados Unidos continuam no rumo de uma crise institucional, porque Donald Trump não quer sair da Casa Branca como derrotado e, por isso, constrói uma narrativa de que a votação de Joe Biden foi fraudada. Desde ontem, a contagem dos votos estava 264 a 214, faltando apenas seis delegados para o desfecho já previsível — a vitória de Biden —, mas a chicana republicana, além de atrasar o resultado final e acirrar a tensão social, pode resultar na sobrevivência do trumpismo como robusta força de oposição, negacionista, ainda mais antidemocrática e reacionária. Não devemos subestimar esse fato aqui no Brasil, porque isso se reproduzirá como discurso da ala ideológica do governo Bolsonaro.
Amplos setores da sociedade e uma parte significativa do governo torcem por Biden, na esperança de que isso signifique uma mudança de rota na nossa diplomacia e na política ambiental. “O homem é o homem e a sua circunstância”, dizia o filósofo espanhol José Ortega e Gasset, 100 anos atrás. Bolsonaro precisa cair na real de que a situação na economia é perigosa e tanto a política externa quanto a ambiental complicam desnecessariamente a vida de nossos agentes econômicos. O Brasil está em apuros financeiros, a conta da pandemia do novo coronavírus está chegando a passos de ganso. O governo está desorientado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, parece enveredar pelo “quanto pior, melhor”, para prorrogar a “economia de guerra” e fugir à responsabilidade do ajuste nas contas públicas.
Ontem, o Tesouro teve dificuldades para rolar a dívida pública, nos relata Vicente Nunes, no Correio Braziliense. Da oferta de até 750 mil títulos indexados à taxa Selic, as chamadas LFTs, com vencimento em 2022 e em 2027, foram comprados 433,5 mil, ou seja, 49%. O Tesouro arrecadou R$ 4,7 bilhões, menos do que na semana passada, quando vendeu R$ 5,19 milhões em títulos. A taxa Selic (2% ao ano) está abaixo da inflação, que já passa dos 3%.
Para rolar a dívida pública, outra alternativa está sendo vender títulos pré-fixados, as chamadas LTNs, com taxas bem acima da Selic. Esses títulos são de curtíssimos prazo, com vencimentos em 2021, 2022 e 2024. Ontem, 8 milhões de títulos expirando em 2024 foram vendidos, com taxa de juros 6,39% ao ano, para o governo arrecadar R$ 6,6 bilhões. Mais R$ 1,8 bilhão foram arrecadados com a venda desses títulos com vencimento em 2022. Um terceiro lote, com vencimento no próximo ano, de 5 milhões de unidades, foi vendido que integralmente, arrecadando R$ 4,9 bilhões para os cofres do Tesouro.
Populismo
O problema é que o governo está pagando uma taxa de 7,39% ao ano para títulos pré-fixados com vencimento em 2021. É um excelente negócio para quem tem dinheiro para investir, mas péssimo para um governo que não tem como pagar suas contas sem se endividar ainda mais, e terá de resgatar esses títulos no próximo ano. É onde mora o perigo, porque os sinais de afrouxamento fiscal vêm de todo lugar. Na quarta-feira, por exemplo, o Congresso derrubou o veto de Bolsonaro às desonerações trabalhistas, que foram prorrogadas por mais um ano, com uma impacto na queda de arrecadação de R$ 4,9 bilhões.
No lusco-fusco das eleições norte-americanas, foi aprovada pela Câmara uma garfada de R$ 1,4 bilhão dos recursos da Educação básica para obras de infraestrutura, uma reivindicação dos políticos do Centrão. Farinha pouca, meu pirão primeiro: tiraram do futuro das crianças para as obras indicadas pelas legendas que apoiam o governo, a cargo dos ministérios do Desenvolvimento Regional e da Infraestrutura. Não é à toa que Bolsonaro mantém seu périplo pelo Nordeste. Em vez de avançar nas reformas administrativa e tributária, caminha-se para romper o teto de gastos e implantar, a qualquer preço, o projeto Renda Cidadã. A discussão sobre o Orçamento da União, em que o pacto populista pode ser consolidado, é empurrada com a barriga, na surdina, para o recesso parlamentar.
Há sinais de recuperação da indústria, muito positivos, que poderiam apontar noutra direção, se fossem acompanhados de uma proposta efetiva de retomada da economia. Entretanto, o governo não tem prioridades, improvisa. A política de Bolsonaro é feita sem estratégia, na base da transa com objetivos eleitorais imediatos. Nesse aspecto, as eleições municipais estão mostrando um cenário em que os eleitores estão sendo bem mais pragmáticos e objetivos, estão refratários a aventuras e apostam nos políticos com propostas e bons serviços prestados.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…