O governo está na berlinda, principalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que criou um partido e chegou à Presidência para defender os trabalhadores
O vice-presidente Geraldo Alckmin pôs mais lenha na fogueira do debate sobre a redução da jornada de trabalho, que ganhou as redes sociais após a deputada federal Érika Hilton (PSol-SP) ter recolhido assinaturas para apresentar à Câmara uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que reduz a jornada semanal de 44 horas para 36 horas.
“O fim do 6 x 1”, como foi batizada a proposta de emenda constitucional, viralizou nas redes sociais e já pressiona o governo Lula. “Isso não foi ainda discutido, mas acho que é uma tendência no mundo inteiro. À medida em que a tecnologia avança, você pode fazer mais com menos pessoas, você ter uma jornada menor. Esse é um debate que cabe à sociedade e ao Parlamento a sua discussão”, disse Alckmin.
Ministro da Indústria e Comércio, Alckmin comentou o tema ao ser questionado durante entrevista no Azerbaijão, onde chefia a delegação brasileira da Conferência do Clima das Nações Unidas, a COP29. O projeto de Érika Hilton foi formulado pelo movimento social Vida Além do Trabalho (VAT), liderado pelo vereador carioca Rick Azevedo (PSol), com objetivo de acabar com a jornada 6 x 1, em que o funcionário trabalha durante seis dias na semana e folga apenas um.
auto skip
A petição pública criada pelo VAT e direcionada ao Congresso Nacional já coletou mais de 2 milhões de assinaturas. Há seis meses, a parlamentar tenta conseguir as 171 assinaturas exigidas para que a PEC seja protocolada e, finalmente, apresentada na Câmara dos Deputados. Na segunda-feira, tinha cerca de 70 deputados signatários, mas passou da marca de 130 nomes. Para ser protocolada, a PEC precisa de 171 assinaturas.
Leia também: Jornada reduzida ganha apoio político, mas preocupa setor produtivo
A gradativa redução da jornada de trabalho, uma conquista dos trabalhadores de todo o mundo, nasceu nos Estados Unidos. Em meados do século XIX, trabalhar mais de 70 horas por semana era comum. Eram jornadas de 12 horas, seis dias por semana. Em 1926, a Ford Motor Company, sob a liderança de Henry Ford, instituiu uma semana de trabalho de oito horas por dia e cinco dias por semana.
Foi o resultado de três fatores: as lutas sindicais, a necessidade de gerar mais empregos por causa da Grande Depressão e o surgimento do Taylor-fordismo, a linha de produção da grande indústria mecanizada. Pouco depois, em 1930, o barão dos cereais W.K. Kellogg decidiu instituir turnos de seis horas em vez de turnos de oito horas, com alguma redução nos salários dos trabalhadores.
A mudança permitiu que a Kellogg contratasse funcionários que haviam sido demitidos e outros desempregados. Em dois anos, os trabalhadores começaram a ganhar em seis horas o que ganhavam trabalhando oito. Atualmente, muitos países adotam jornadas mais curtas. De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil ocupa a 29ª posição no ranking global de carga horária, com uma jornada padrão de 8 horas diárias e 44 horas semanais.
Alto risco
Entre os países com as menores jornadas de trabalho, estão a Alemanha, com uma carga média de 26,3 horas semanais; a Dinamarca, 27,3 horas; a Noruega. 27,5 horas; a França, 30 horas; e a Itália, com média de 35,6 horas semanais. Estudos mostram que jornadas reduzidas podem resultar em melhor saúde mental, maior qualidade de vida e maior eficiência no ambiente de trabalho. Entretanto, a maioria dos sindicatos e das associações patronais não aceita a mudança e já trabalha para matar a emenda antes de ser votada.
De acordo com a legislação vigente, a jornada padrão é de 8 horas diárias, somando 44 horas semanais. Isso significa que, normalmente, o trabalhador tem direito a um dia de folga por semana, preferencialmente aos domingos. Se o trabalhador ultrapassar essa jornada, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) garante que ele receba adicional de 50% sobre a hora extra (e 100% em domingos e feriados, se aplicável).
Leia também: Fim da escala 6×1: especialistas falam sobre viabilidade de mudança
O Ministério do Trabalho (MTE) defende que o fim da escala de trabalho 6 x 1 seja tratado em convenção e acordos coletivos entre empresas e empregados. A PEC de Érika Hilton, porém, tem o objetivo de mudar o trecho da Constituição que limita a carga de trabalho a oito horas diárias e 44 horas semanais para incluir outras possibilidades de distribuição do expediente, como a escala 4 x 3, defendida pelo VAT. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece um dia como o período mínimo de descanso para o trabalhador.
Outra PEC para limitar a jornada de trabalho a 36 horas semanais e acabar com a escala 6 × 1 tramita na Câmara dos Deputados desde 2019. De autoria do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), a proposta aguarda novo relator na CCJ (Constituição de Comissão e Justiça e de Cidadania). Um relatório chegou a ser feito em 2023, mas não foi votado.
Agora, a proposta poderá ser apensada à PEC de Érika Hilton, caso ela consiga avançar com a limitação da jornada de trabalho. Diante da situação, o governo está na berlinda, principalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que criou um partido e chegou à Presidência para defender os trabalhadores. Apoiar a proposta é uma atitude de alto risco, ainda mais se for aprovada. Tanto pode consagrar Lula na história quanto provocar uma forte reação contra o governo de empresários e empreendedores.
Todas as colunas do Blog do Azedo: https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/
O presidente brasileiro defendeu a taxação de operações financeiras de super-ricos, para financiar o combate…