Deputados transformaram o Refis em moeda de troca, assim como fizeram em relação à redução das multas ambientais e às novas regras do combate ao trabalho escravo
A bandeira do ajuste fiscal acabou de ser enterrada pelo Palácio do Planalto, que somente este mês liberou R$ 687 milhões em emendas individuais para os parlamentares. A farra não foi para cooptar ninguém da oposição: foi para domar a própria base parlamentar. Como o orçamento é impositivo desde 2015, o governo é obrigado a liberar os recursos das emendas, mas decide o fluxo de pagamentos, o que serve para administrar os humores dos parlamentares, premiando aliados e retaliando a oposição. Em razão da votação da denúncia contra o presidente da República, entretanto, para desespero da equipe econômica, a liberação de recursos quase dobrou em relação a setembro (foram R$ 273 milhões) e mais que quadruplicou se compararmos com agosto (R$ 138 milhões).
Para aumentar o rombo nos cofres do governo, Temer acelerou a sanção do Programa de Regularização Tributária, o novo Refis, que será publicado nesta quarta-feira, no Diário Oficial da União, sem vetos, o que contraria o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que havia proposto nove vetos. A rebelião na base, estimulada pelo lobby dos maus pagadores, forçou a decisão. Uma nova medida provisória também deverá prorrogar o prazo de adesão. A Receita deve regulamentar as novas regras até quinta-feira. O prazo de adesão termina em 31 de outubro, mas deve ser prorrogado. Com a medida, haverá perda de receita da ordem de R$ 3 bilhões, de um total previsto de R$ 13 bilhões a serem arrecadados.
Deputados da base transformaram o Refis em moeda de troca, assim como fizeram em relação à redução das multas ambientais e às novas regras do combate ao trabalho escravo, estabelecidas por simples portaria do Ministério do Trabalho. Ontem, por medida liminar da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a portaria. A ministra acolheu o pedido da Rede Sustentabilidade, porque houve desvio de poder na edição da medida, ao alterar conceitos que devem ser usados pelos fiscais para identificar um caso de trabalho forçado, degradante e em condição análoga à escravidão, além de exigir, por exemplo, que o fiscal apresente um boletim de ocorrência com o seu relatório.
A operação para azeitar a base do governo foi complementada por um esforço do presidente Michel Temer a fim de melhorar a relação com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que foi chamado ao Palácio do Planalto para uma reunião. Na saída, Maia disse que está tudo bem entre os dois, com a ressalva de que “em política não tem amiguinho, muito menos para sempre”. A declaração é mais um sinal de que Maia pretende manter distância regulamentar de Temer, mas não deseja o lugar do presidente. Tanto que decidiu pôr em votação as denúncias contra Temer e os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco (Secretaria-geral da Presidência) em bloco, e não separadamente. Mais cedo, liminar do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, havia rejeitado um recurso do PSol contra a votação em bloco, com o argumento que a decisão cabia à Câmara.
Outro reforço para Temer foi a declaração do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), defendendo a sua permanência na Presidência até o final do mandato. A decisão aparta o governador paulista dos deputados tucanos que pretendem votar a favor da aceitação da denúncia, o que aumentará a pressão dos ministros tucanos Bruno Araújo (Cidades), Antônio Imbassay (Secretaria de Governo) e Aloysio Nunes Ferreira (Relações Internacionais) sobre os integrantes da bancada. Temer e Alckmin são velhos aliados, mas o namoro do presidente da República com o prefeito de São Paulo, João Doria, que ameaçava deixar o PSDB para ser candidato a presidente da República, havia provocado um distanciamento entre os dois.
Lacrou
O presidente do Conselho de Ética do Senado, João Alberto Souza (PMDB-MA), decidiu ontem arquivar a representação do PT que pedia a cassação de Aécio Neves (PSDB-MG), o que pôs um ponto final no caso. Formalmente, não existe mais nada contra o senador mineiro, o que fortaleceu sua posição na queda de braços com o presidente interino da legenda, senador Tasso Jereissatti (PSDB-CE), que, desde a semana passada, vinha defendendo a saída definitiva de Aécio da presidência do PSDB.
Ontem, senadores do PSDB chegaram a se reunir para discutir a questão, mas não chegaram a conclusão alguma. Tasso disse que a reunião serviu para que os tucanos fizessem uma “avaliação da situação”, mas deixou claro que Aécio decidirá se vai concluir o mandato ou não: “dentro do seu livre arbítrio, analisando a situação”. Uma saída salomônica foi proposta pelo líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC): esperar a convenção partidária, marcada para dezembro, quando acaba o mandato de Aécio, que continuaria licenciado. “A liderança do partido continua sendo Tasso, no pleno exercício do mandato de presidente, com plena liberdade e solidariedade de todos os membros da bancada”, explicou.
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