Nas Entrelinhas: As campeãs dos campeões

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Por trás dessa estratégia havia um projeto de poder que ultrapassa as fronteiras nacionais

As investigações da Operação Lava-Jato estão desnudando as estranhas do “capitalismo de Estado” brasileiro e revelam sua simbiose com as ambições políticas do PT, no sentido de se perpetuar no poder e projetá-lo no âmbito da América Latina e da África Ocidental, Central e Austral, a partir da atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de suas relações com partidos de esquerda e governantes dos dois continentes. Fica cada vez mais evidente que duas das maiores empresas brasileiras, a Petrobras e a Odebrecht, mas não apenas, foram utilizadas para financiar esse projeto.
Por isso mesmo a atuação internacional do marqueteiro do PT, João Santana, e de sua esposa e sócia, Mônica Moura, em campanhas eleitorais de Angola, Argentina, El Salvador, Panamá, Venezuela e República Dominicana merece avaliação que extrapola o aspecto criminal, ou seja, o esquema de desvio de recursos da Petrobras e a atuação da Odebrecht no financiamento de campanhas eleitorais no Brasil e no exterior. Há que se discutir o modus operandi do modelo econômico adotado para compreender a sua resiliência e degeneração, uma vez que ele determina o modelo de acumulação das empresas envolvidas e não apenas o patrimonialismo dos políticos que lhe deram sustentação e o enriquecimento pessoal de seus operadores.
Além disso, está evidente que o modelo é incompatível com as regras do jogo democrático. Essa discussão é importante porque a presidente Dilma Rousseff está movendo mundos e fundos para salvar as empresas envolvidas no escândalo e o próprio modelo, a pretexto de preservar empregos e a engenharia nacional, quando sabemos que há dezenas de outras empresas que poderiam substituí-las nas mais diversas áreas.

O modelo

As condições para a chamada “nova matriz econômica” como resposta brasileira à crise mundial, ironicamente, foram estabelecidas no governo de Fernando Henrique Cardoso. Com as privatizações do setor produtivo estatal, o governo trocou seu controle na maioria das empresas por uma participação minoritária. Durante o governo Lula, porém, graças aos fundos de pensão dos trabalhadores dessas empresas e à ocupação de posições estratégicas no aparelho de Estado, o PT passou a ter grande influência nos seus investimentos e nos de centenas de outras empresas e negócios.
O modelo brasileiro não foge à regra histórica. Funciona a partir da fusão dos interesses privados com as agências do Estado encarregadas de normatizá-los e controlá-los, um convite aos desvios de finalidade e à corrupção. Quando surgiu, o capitalismo de Estado foi uma via de industrialização para países que ficaram fora da segunda revolução industrial, como os dominados pelo fascismo na primeira metade do século passado, e os regimes comunistas surgidos no pós-guerra.
Na América Latina, o modelo emergiu com o populismo no México, na Argentina e no Brasil, principalmente na década de 1950, mas também prestou serviços aos regimes militares, durante a Guerra Fria, nas décadas de 1960 e 1970. Entre nós, renasceu das cinzas durante o governo Lula, a partir do momento em que o governo optou por um modelo de expansão acelerada da economia com base no consumo e, ao mesmo tempo, passou a protagonizar uma política da concentração de capital e formação de monopólios com o objetivo de projetar internacionalmente algumas grandes empresas brasileiras, os chamados “campeões nacionais”.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e os fundos estatais de pensão passaram a investir pesado em empresas de diversos setores, desde mineração até produção de alimentos. Além disso, estimularam e financiaram fusões em áreas como telecomunicações e produção de celulose. Por trás dessa estratégia, há um projeto de poder que ultrapassa as fronteiras nacionais, a ponto de pôr o Itamaraty a serviço das alianças do PT com partidos e governantes da América Latina e na África, além dos negócios que financiam essa política e seus atores.
O símbolo do modelo passou a ser a Petrobras, com o bilionário programa de investimentos na exploração de petróleo da camada pré-sal, que estava muito acima das suas possibilidades. O modelo se estendeu também ao setor elétrico, com o fortalecimento da Eletrobras. A intervenção do governo federal resultou, porém, em desastres financeiros e escândalos de corrupção. A mesma estratégia foi adotada na área da mineração, onde a Vale amarga déficits astronômicos. Mas foi a Odebrecht, a gigante do setor privado, que apostou todas as fichas no “capitalismo de Estado”.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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