Dilma Rousseff deixou claro que não pretende mudar a rota de seu governo. Mas soltou, de uma só vez, um tigre e um elefante no meio do plenário: a recriação da CPMF e a reforma da Previdência
A soberba fez a presidente Dilma Rousseff desperdiçar uma boa oportunidade. Em vez de oferecer aos partidos de oposição propostas que flexibilizem o modelo de capitalismo de Estado que adotou, optou por liderar a tropa de choque governista no Congresso e apostar no confronto com a oposição. Houve vaias e protestos em plenário, fato inédito no Congresso. Sua mensagem foi chinfrim, nem de longe se pareceu, por exemplo, com um dos discursos sobre o estado da Nação dos presidentes dos Estados Unidos, nos quais Barack Obama costuma brilhar nos improvisos, mesmo diante de um parlamento majoritariamente republicano.
A presidente da República, porém, manteve o autocontrole, mesmo quando foi interpelada pela tucana Mara Gabrilli(SP) sobre a epidemia de microcefalia, e não perdeu a pose com as vaias: “Eu achei ótima a receptividade. É minha absoluta obrigação de estar aqui”, disse, ao deixar o Congresso. Durante 40 minutos, Dilma Rousseff deixou claro que não pretende mudar a rota de seu governo. Mas soltou, de uma só vez, um tigre e um elefante no meio do plenário.
O tigre foi a proposta de recriação da CPMF, que enfrenta grande resistência no Congresso e oposição maior ainda da sociedade, pois se trata de aumentar a carga tributária do país sem oferecer outra contrapartida que não seja serviços de péssima qualidade. O elefante é a proposta de reforma da Previdência, que o governo pretende aprovar para elevar o teto mínimo das aposentadorias e estabelecer um regime único para servidores públicos e trabalhadores do setor privado, urbano e rural. São propostas impopulares, de um governo fraco, num ano eleitoral.
Foi um discurso burocrático, que se perdeu em detalhes, como se fosse o caso de explicar a anatomia do tigre e do elefante e não a diferença entre um e outro. Talvez porque seja uma preocupação que aparece nas pesquisas de opinião feitas pelo Palácio do Planalto, discorreu sobre o “vírus da zika” como se estivesse lidando com alunos de uma escola primária: “Como não existe vacina, o melhor remédio é enfrentamento do mosquito Aedes, impedindo sua proliferação, porque, se o mosquito não nascer, o vírus não tem como viver.”
Dilma foi vaiada por deputados da oposição ao defender o retorno da CPMF, fazer apologia do programa Minha Casa, Minha Vida e abordar a proposta para que o trabalhador do setor privado possa utilizar verba do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) como garantia para o crédito consignado. Sua prioridade é mesmo aumentar impostos: “Muitos têm dúvidas e se opõem a essas medidas, especialmente a CPMF, e têm argumentos, mas peço que considerem a excepcionalidade do momento, levem em conta dados, e não opiniões. A CPMF é a melhor solução disponível para ampliar, no curto prazo, a receita fiscal em favor do Brasil”.
Foi genérica ao falar de corte dos gastos públicos: “Queremos discutir com o Congresso a fixação de um limite global para o crescimento do gasto primário do governo para dar mais previsibilidade à política fiscal e melhorar a qualidade das ações de governo”. E, mais uma vez, não fez autocrítica em relação aos erros na condução da economia.
Contraponto
A ida de Dilma Rousseff ao Congresso foi sugerida pelo ex-ministro Delfim Neto, um de seus conselheiros, que havia se afastado do governo e de quem Dilma se reaproximou recentemente. Ele havia dito que não existe presidencialismo sem presidente da República e que Dilma deveria assumir a liderança do combate à crise como líder da Nação. Quem estava escalado para levar a mensagem presidencial ao Congresso era o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner; na segunda-feira, porém, Dilma resolveu ler a mensagem pessoalmente.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), desafeto de Dilma Rousseff, fez um discurso comedido, de prestação de contas, mas advertiu que o aumento da carga tributária não é uma proposta de tranquila aprovação pela Câmara. Quem roubou a cena, porém, foi o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao propor duas medidas que contrariam as posições do governo e soam como música aos ouvidos do mercado financeiro e da indústria. A primeira é a autonomia do Banco Central; a segunda, a flexibilização do regime de partilha na exploração do pré-sal, acabando com a obrigação de a Petrobras fazer 30% dos investimentos no setor.
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