Gullar

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ARI CUNHA

DESDE 1960 »

aricunha@dabr.com.br

com Circe Cunha e MAMFIL

Não conheci pessoalmente o poeta Ferreira Gullar. Mas sempre nutri por seu trabalho e por suas posições, firmes e claras, forte admiração. Estive, há muitos anos, no lançamento de uma coletânea de seus textos, reunidos sob o título Toda poesia. Fiquei de longe. Havia muita gente na ocasião e resolvi ser um a menos a perturbá-lo com tietagens e não pedi autógrafo. Não me arrependo.

A mim, Gullar sempre pareceu ser confiável. Percebi, desde logo, que havia em seus múltiplos trabalhos como escritor e crítico uma coerência linear, que faz com que você conheça na intimidade o verdadeiro criador. É raro encontrar no vasto mundo das artes talentos que possuam a coragem genuína de expor com franqueza e sem enfeites sua personalidade. O que se vê com frequência são artistas deslumbrados com o próprio umbigo, vaidosos e cheios de estereótipos sobre o mundo ao redor.

À guisa de explicação, é preciso deixar esclarecido que tomar o autor pelo trabalho exposto é uma das grandes ilusões das plateias mundo afora, principalmente quando se descobre que autor e obra são dois seres antípodas. A desilusão é ainda maior quando se descobre que, por trás de uma obra-prima qualquer, pode estar um ser mesquinho e cheios das mais baixas veleidades humanas. Ou mesmo o oposto: obras cáusticas com um ser angelical a compondo. Muitos chegam a duvidar que determinada obra seja de um autor, tal a discrepância entre ambos.

A filosofia distingue bem ética de estética. Neste sentido, é possível entender por que alguns grandes artistas, criadores de verdadeiras obras-primas, sejam, na intimidade, seres humanos desprezíveis, capazes de atitudes e baixezas impensáveis. A prudência ensina a não confundir criador e criatura.

Ferreira Gullar tinha esse quê raro de sinceridade. Seus textos e sua pessoa estavam ali, derramados em tinta preta sobre a folha branca. Talvez venha daí a sua enorme aceitação pública. Quando ainda havia a esquerda, como matiz ideológico e pessoal, Gullar se posicionou, não como defensor cego das orientações do Partidão, mas no sentido de que acreditava, com sinceridade, na redenção do ser humano e sua libertação do capitalismo selvagem e predador.

Por sua vivência e liberdade de pensar, desde logo identificou nos governos petistas uma fantasia que levaria o país à ruína moral e econômica. No poema “Não há vagas”, de 1963, Ferreira Gullar traz para o lirismo dos versos, a realidade do brasileiro comum desde sempre:

“O preço do feijão/não cabe no poema. O preço do arroz/não cabe no poema./Não cabem no poema o gás, a luz o telefone, a sonegação, do leite, da carne, do açúcar, do pão./O funcionário público/não cabe no poema/com seu salário de fome/sua vida fechada/em arquivos./Como não cabe no poema o operário/ que esmerila seu dia de aço/e carvão/nas oficinas escuras/– porque o poema, senhores,/está fechado:/“não há vagas”/Só cabe no poema/ o homem sem estômago/ a mulher de nuvens/ a fruta sem preço/ O poema,/senhores,/ não fede/nem cheira.”

A franqueza de sua prosa afastou-o da maioria dos políticos atuais, principalmente os populistas e demagogos. Talvez tenha sido essa a razão por que muitos deles preferiram ir assistir aos funerais do ditador Castro, na longínqua Cuba — um homem a quem é debitado milhares de mortes — do que ver descer a terra um dos maiores poetas da atualidade. Melhor assim para a biografia de Gullar.

A frase que foi pronunciada

“A arte existe porque a vida não basta.”

Ferreira Gullar

Desigualdade

» De acordo com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Brasília registra os maiores índices de desigualdade econômica e social do Brasil. Nas medições feitas pelo desigualtômetro existem enormes discrepâncias na oferta de bens e serviços entre os moradores do Plano e das áreas periféricas. Enquanto no Plano Piloto, 84% da população tem planos de saúde, a poucos quilômetros, na Estrutural, esse número cai para apenas 5,6%.

CPI

» Na era das delações, feitas diante do pavor da prisão iminente, o país vai conhecendo um pouco do submundo dos bastidores políticos. Num desses últimos relatos, nada mais, nada menos, feito pelo ex-líder do governo no senado, Delcídio do Amaral, ficamos sabendo que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) vinham sendo usadas apenas para achacar empresários, principalmente em época de eleições.

Deflexão

» Com os desdobramentos da Operação Lava-Jato, nesta nova fase intitulada Deflexão, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Marco Maia (PT-RS) e o atual ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) e ex-senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), respectivamente, relator e presidente da CPI da Petrobras, terão de prestar contas à Justiça sobre denúncias de que teriam recebido R$ 5 milhões de um clube de empresários para livrá-los da convocação a fim de prestar depoimentos à Comissão.

História de Brasília

Em Goiânia, outro dia, nenhum funcionário do Ipase compareceu à repartição, exceto um servente, que dava a seguinte explicação às pessoas que procuravam a autarquia: “O pessoal está todo doente”. (Publicado em 19/9/1961)

Circe Cunha

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Circe Cunha

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