VISTO, LIDO E OUVIDO, criada por Ari Cunha (In memoriam)
Desde 1960, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Não fosse o dinheiro suado dos pagadores de impostos, subtraídos de forma compulsória, por um Estado perdulário e um dos campeões do planeta no quesito alta carga tributária, as mais de 30 legendas partidárias que hoje parasitam o Poder Legislativo, tornando a nossa democracia uma das mais caras e ineficientes do mundo moderno, teriam vida curta ou nem mesmo nos dariam o desprazer de existir. Em outras palavras, os nossos partidos existem, simplesmente, porque lhes são franqueados boa parcela de recursos públicos. Sem essa dinheirama, contabilizada em bilhões de reais, não teríamos essa baciada de agremiações políticas que agem exatamente como clubes de argentários, no mais estrito modelo de empresa privada.
Apenas por esse aspecto sui generis, podemos inferir que a representação política, tão necessária para a manutenção do chamado Estado Democrático de Direito, realizada por meio de partidos sustentados, exclusivamente, com verbas públicas, resultam, na verdade, numa espécie de democracia do tipo estatal, tutelada pelo Estado, graças aos cofres públicos. Em outro sentido, pode-se entender que, por essa fórmula, o que os brasileiros têm em mãos para representá-los no parlamento, em todos os níveis, municipal, estadual e federal, são empresas típicas do Estado, que, ao contrário de muitas, não necessitam adotar regras de compliance ou mesmo prestar contas, aos contribuintes, dos recursos que arrecadam e dos gastos que empreendem.
A questão, nesse caso, é como alcançar uma verdadeira democracia, com igualdade de oportunidade, sabendo-se que a ponte que liga o cidadão ao Estado é inteiramente construída e alicerçada com os recursos retirados à fórceps do cidadão. Pior ainda do que ter partidos que muito se assemelham a típicas estatais, sempre bancadas pela viúva, é verificar que toda essa fortuna, carreada para as legendas, é administrada por grupos instalados dentro da máquina partidária, cuja a única função é praticar a matemática engenhosa da prestação de contas. Esse, inclusive é um outro capítulo vergonhoso do nosso sistema partidário, que por omissão e pouco zelo dos tribunais eleitorais, tornam as contas partidárias uma ficção que é submetida a infinitas manobras contábeis para fazer o dinheiro desaparecer no sumidouro da burocracia. Com isso, vale a expressão espanhola: %u201Ccriamos corvos para que eles nos arranquem os olhos.
Quando surgiu como uma força nova dentro do cenário político do final dos anos 1970, o Partido dos Trabalhadores empolgava a oposição ao regime pelo fato de obter seus recursos diretamente da população, por meio de vaquinhas, venda de camisetas e churrascos e outros meios originais e absolutamente transparentes. Essa era a força que mantinha esse partido bem ao gosto popular. Esse tempo amador, mas autêntico, vai longe, bem longe. Hoje o PT, como de resto todas as demais legendas, vive à sombra do Estado, devidamente azeitado com verbas bilionárias, fechados em si mesmos, distantes da população, hoje, chamada apenas pelo nome genérico de %u201Cbase%u201D. Fenômeno semelhante parece ter ocorrido também com os clubes de futebol.
Antigamente, era comum falar-se em amor à camisa. Eram tempos de inocência no futebol. Os times viviam praticamente dos recursos obtidos das bilheterias dos jogos. Por esse critério, o desempenho no campeonato e a boa performance contavam muito para atrair o público. Só os bons times, bem armados e treinados sobreviviam aos torneios. Esse também são tempos que já vão bem longe. Seguidas pesquisas mostram que dentre as instituições do país, aquelas que menos gozam da simpatia e da confiança dos brasileiros são justamente os partidos e seus respectivos políticos. Por aí, pode-se ver que não é o dinheiro que torna pessoas, empresas e instituições em algo respeitável e aceita pela população. Entre as coisas que o dinheiro não é capaz de franquear, uma das mais importantes, é a respeitabilidade e sua consequência direta representada pela credibilidade. Se o financiamento público, como afirmam muitos, é necessário para afastar a influência interesseira das empresas privadas, por outro lado a abundância de recursos e a sede como os políticos se atiram ao pote dos financiamentos públicos tem trazido mais prejuízos do que benefícios para o aprimoramento da democracia brasileira.
A perda paulatina e ininterrupta da confiança popular, como bem demonstram pesquisas recentes de opinião pública, jamais poderão ser contornadas com a entrada de bilhões nos cofres das legendas. Nem todo o dinheiro do mundo em propaganda seria capaz de reverter a perda de credibilidade que parece ter tomado conta dos partidos e de seus respectivos membros. Um sinal de que o dinheiro não pode tudo, é que a cada eleição aumenta o número de eleitores que simplesmente deixam de comparecer ao pleito, desencantados com nosso modelo artificial de fazer política representativa. Há inclusive estudos que mostram que, não fosse a obrigatoriedade do voto, inscrito na lei, muitos eleitores só saberiam que é eleição por se tratar de um feriado. Ao deixar de sobreviver com as contribuições diretas dos filiados e simpatizantes, os partidos políticos começaram a cortar o cordão umbilical com a sociedade que afirmavam representar.
Ao adquirirem a independência econômica, muito acima das necessidades, essas mesmas legendas se apartaram de vez da população, de quem só dependem efetivamente a cada quatro anos. Apoio efetivo só mesmo daqueles que trabalham diretamente nas campanhas e esperam recompensas. Há uma crise dos partidos que parece só ser vista por aqueles que estão do lado de fora e que é formada pelo grosso da população. Nem mesmo os mais caros e criativos marqueteiros de campanhas políticas de todo o país chamaram a atenção para esse importante fato, dando novo rumo às campanhas.
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