Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Brasília é o espelho das contradições mais agudas do país. O que antes se apresentava como modelo de urbanismo racional, herdeiro das ideias de Le Corbusier e do conceito de cidade-jardim, vai-se dissolvendo diante de um cenário que combina abandono institucional, degradação social e impotência política.
Nas áreas que antes eram referência de planejamento urbano, erguidas sob o signo da utopia coletiva, proliferam agora moradias improvisadas, barracos de lona e madeira que se multiplicam sob o verde rarefeito do Eixão, nas margens de avenidas largas, perto da UnB, Ceub, 213 Norte, áreas outrora pensadas para o trânsito harmônico de uma sociedade moderna.
Segundo dados da Codeplan (2024), o número de pessoas em situação de rua no Distrito Federal aumentou 86% em quatro anos, saltando de 2.938 pessoas, em 2019, para 5.470 em 2023. Relatório da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes/DF) indica que mais de 60% desses cidadãos vieram de outros estados em busca de trabalho, oportunidades ou, simplesmente, da miragem de uma capital onde o Estado ainda existisse como promessa de amparo. Ocorre que essa promessa se diluiu em meio à judicialização da política e à paralisia administrativa, fenômenos que se retroalimentam.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, de 2023, que proibiu a remoção forçada de pessoas em situação de vulnerabilidade de espaços públicos, insere-se nesse contexto ambíguo. De um lado, reafirma princípios civilizatórios e de proteção social, impedindo práticas arbitrárias de despejo; de outro, transfere ao município e ao governo distrital o ônus de administrar o colapso urbano sem instrumentos eficazes de ação. O resultado, visível a olho nu, é a expansão silenciosa das ocupações em áreas verdes, canteiros e passagens subterrâneas — transformadas em moradias improvisadas, onde a dignidade disputa espaço com o lixo, a violência e o frio.
O fenômeno, que muitos preferem reduzir à questão de ordem pública, tem raízes mais profundas. Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), publicada em abril de 2024, estima que o Brasil ultrapassou 281 mil pessoas em situação de rua, um aumento de 238% desde 2012. No Distrito Federal, o crescimento foi ainda mais expressivo proporcionalmente, refletindo não apenas a desigualdade, mas o esgotamento das políticas de moradia e a desarticulação entre os entes federativos. Em meio a um orçamento público cada vez mais engessado e programas habitacionais interrompidos ou mal executados, o Estado parece assistir de longe ao desmonte da própria cidade que deveria zelar.
Não se trata apenas de miséria material, mas de uma espécie de erosão simbólica: Brasília, que nasceu com o intuito de representar a harmonia entre o homem, o espaço e o poder, converte-se, gradativamente, em um território de ruínas sociais. A cidade-jardim de Lucio Costa e Oscar Niemeyer transforma-se em cidade-sombra, onde o contraste entre os pilotis monumentais e os barracos improvisados não é mais metáfora, mas evidência. Nas entrequadras, Setor Comercial Sul sob as marquises de concreto que antes abrigavam os ideais da convivência comunitária, multiplicam-se colchões, fogareiros e restos de esperança.
A ausência de política pública efetiva, somada à judicialização das ações administrativas, reforça um círculo vicioso: o poder local, paralisado entre a sensibilidade social e a impotência operacional, não consegue agir; o poder federal, ocupado em pautas mais vistosas, ignora o drama cotidiano que se desenrola à sombra dos ministérios. Enquanto isso, os moradores de rua tornam-se uma presença constante e silenciosa, símbolo de um país que falhou em garantir o mínimo de humanidade a seus cidadãos.
O GDF anuncia planos, elabora relatórios e promete abrigos, mas, segundo auditoria do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF, 2024), apenas 35% das vagas em abrigos públicos estão efetivamente disponíveis, e muitos desses espaços carecem de infraestrutura básica. Na prática, a cidade funciona sob um regime de improviso, onde a compaixão individual substitui a política pública e a omissão institucional é justificada por decisões judiciais que, embora bem-intencionadas, acabam por cristalizar o desamparo.
Se nada mudar, o traço de Niemeyer será engolido pelo traço da sobrevivência, e o concreto curvilíneo se tornará mera moldura para a miséria. Brasília deixará de ser símbolo de um país em construção para se converter em alegoria de um país em colapso, onde o Estado, cercado de monumentos, já não consegue enxergar os homens que dormem aos seus pés.
A frase que foi pronunciada:
“Desenvolvimento é diferente de crescimento econômico. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição fundamental para garantir um futuro melhor para a maioria da população. Mas quando o projeto social prioriza a efetiva melhoria das condições de vida dessa população, o crescimento se transforma em desenvolvimento e, portanto, trata-se de um processo de transformação social”.
Celso Furtado
História de Brasília
Aqui estão os primeiros parlamentaristas: presidente, Hélio Marcos; Primeiro Ministro Domingos José, Vice 1o. Ministro Mário Jorge; ministro da Cultura, Dimer Camargo Monteiro; Ministro da Economia, Marcelo Magno de Oliveira Veloso; ministro da Presidência, Italo. Ministro da Divulgação, Rogerio Brant Martins. Chaves; ministro de Assuntos Sociais, Rui Lemos Sampaio; Ministro de Assuntos Missionários, Ivan de Oliveira Delforge; ministro de Assuntos literários, George Ney e presidente do Banco, Paulo Cesar Vasques. (Publicada em 11.05.1962)
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