Fossem colocadas, lado a lado, cada linha que foi escrita apenas nos últimos três anos sobre a crise econômica, política e moral enfrentada pelos brasileiros, analisando-as apenas sob o ponto de vista da realidade crítica, sem isenções a fantasias, teríamos uma linha contínua cujo comprimento daria voltas em torno do círculo equatorial.
Muito ainda deverá ser descrito sobre as experiências que a jovem democracia brasileira teve com o ciclo de mais de uma década de governos autointitulados de esquerda. Na verdade, a divisão clara que políticos e teóricos insistem entre esquerda e direita no Brasil simplesmente não existe. Por algum motivo, quiçá antropológico ou cultural, o Brasil desenvolveu característica muito própria e sui generis que faz com que todos os movimentos e tendências que adentram nossas fronteiras e passam a integrar nosso dia a dia acabem, por fenômeno de corrosão tropical e malemolente, se degenerando em algo novo e mais adequado ao ambiente geral.
Na música, temos o exemplo do jazz. Desenvolvido pelos descendentes de escravos africanos que foram para a América do Norte, ao ser introduzido por aqui, se transformou no gênero bossa-nova. Exemplos do poder que tem a atmosfera brasileira de transgredir e desalinhar até as mais sérias teorias são incontáveis.
A frase dita nos anos1960 por Charles de Gaulle — “Le Brésil n’est pas un pays serieux”— pode ser tomada no sentido macunaímico ou pedromalazartiano. Nosso verdadeiro hino nacional é a Aquarela do Brasil, nosso Bach é Villa Lobos, nosso uísque é a cachaça e nosso caviar, o feijão. Por isso, falar em esquerdas e direitas nítidas no Brasil não cola.
O que temos são políticos e partidos manhosos, dispostos a tudo, que se aliam a qualquer um. Criam-se partidos e sindicatos apenas para garantir verbas públicas e outras benesses. Temos, isso sim, uma das elites econômicas mais corruptas e mesquinhas do planeta. A sociedade que resultou da mistura do índio e do negro oprimidos e de uma minoria europeia branca e aventureira é esta. Não é a melhor, nem a pior. É o que somos — o homem cordial, notado pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda, individualista, avesso à hierarquia, arredio à disciplina, desobediente a regras sociais e afeito ao paternalismo e ao compadrio.
A frase que não foi pronunciada
“Gastei minha cidadania acreditando no voto.”
Eleitor desiludido
Pensamento
Se fosse ouvido com atenção e compreendido, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos mudaria o futuro do país de forma simples e efetiva. Disse ele: “A educação popular só é necessária porque a outra educação é antipopular. Sempre foi assim, mas não tem que ser assim até o fim”. E mais. As experiências de economia solidária adotadas nas aldeias indígenas poderiam desencadear uma nova face da democracia.
Na ativa
Mais de R$ 1 bilhão para atacar o mosquito Aedes aegypti. Apesar do aporte, os casos de dengue, febre chikungunya e vírus zica continuam em franco crescimento.
Chão de flores
Mais serviço para a Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual. Um centro espírita de Sobradinho II foi incendiado. Uma pessoa se feriu.
Guinness
Silvestre Gorgulho entrou com a carta na administração do Guinness book para inscrever a coluna Visto, lido e ouvido como a mais longeva do país. Quem for contra, manifeste-se agora, ou cale-se para sempre. Nossos agradecimentos.
Armadilha
Roberto Silvestre, professor e astronômo, criou a mosquiteira contra todos os tipos de mosquitos. Fácil de construir e com material barato. Procure no YouTube. Vale a pena.
História de Brasília
Quando todo mundo pensava que os deputados estivessem detidos no aparelho, eis que eles descem e calmamente se dirigem para a estação de passageiros. É que a Aeronáutica esperava uma alta personalidade, não revelada, mas foi lograda na expectativa. (Publicado em 31/8/1961)
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam) Hoje, com Circe…
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