Brasil está entre os países que mais concentram desmatamento, diz WWF

Compartilhe

Com desmatamento em alta na Amazônia e Cerrado, país perde biodiversidade, afeta o clima global e pode ser o centro de origem de novas zoonoses, revela relatório.

Um novo relatório do WWF-Internacional coloca o Brasil entre os campeões de desmatamento e de fragmentação de florestas e outros ecossistemas entre 2000 e 2018. O fato de o Brasil ter duas frentes simultâneas de destruição, os biomas Amazônia e Cerrado, acende o farol amarelo sobre as possibilidades de o país ser o local de origem de zoonoses. Fruto de uma pesquisa em 29 países, o relatório Frentes de desmatamento: vetores e respostas em um mundo em evolução, divulgado nesta quarta-feira (13/1), busca compreender onde o desmatamento e a fragmentação da floresta ocorreram, identificar suas principais causas e oferecer respostas.

O estudo se concentrou em 24 frentes de desmatamento na América Latina, na África Subsaariana, no Sudeste Asiático e na Oceania, onde ocorreram mais da metade (52%) da devastação total registrada nessas regiões — uma área de 43 milhões de hectares, quase a mesma extensão do Marrocos. Pelo menos dois terços da perda de cobertura florestal global nesse período ocorreram nessas regiões tropicais e subtropicais. Não por acaso, o surgimento de novas doenças é elevado em regiões tropicais, biodiversas e historicamente cobertas por florestas e savanas que estão passando por mudanças no uso da terra.

“Quando saudáveis, as florestas oferecem uma proteção contra doenças como a covid-19. No entanto, quando as florestas se encontram sob ataque, suas salvaguardas são enfraquecidas, o que leva a uma disseminação de doenças”, explica Marco Lambertini, diretor do WWF-Internacional.

A degradação florestal está entre os principais fatores para o surgimento de doenças zoonóticas como HIV/AIDS, Ebola, SARS, Febre do Vale Rift e, agora, a Covid-19. Isso ocorre porque o aumento da densidade de animais em áreas desmatadas eleva as doenças nessas populações de animais selvagens que, por sua vez, têm mais interações com pessoas devido à maior presença humana nas áreas de floresta degradada. Resultado: mudanças no uso da terra contribuíram para quase metade das doenças zoonóticas que afetaram humanos entre 1940 e 2005.

“Embora os números sejam alarmantes, o processo de recuperação da pandemia da covid-19 pode proporcionar uma oportunidade para mudanças transformadoras que são essenciais para salvaguardar nossas florestas”, diz Fran Raymond Price, líder da Prática de Florestas no WWF Internacional. “Neste momento, em que governos criam políticas para lidar com os impactos econômicos e sociais da pandemia global, devemos valorizar mais a saúde e a natureza. Isto é do melhor interesse da humanidade: mudanças no uso da terra são um dos principais vetores de novas zoonoses, portanto, se não enfrentarmos o desmatamento enquanto podemos, podemos perder a chance de evitar a próxima pandemia.”

Combate à crise climática

O combate ao desmatamento deve ser reconhecido como um componente vital para a mitigação da crise climática. “Os setores agrícola, florestal e de uso da terra são responsáveis por cerca de um quarto de todas as emissões globais de gases de efeito estufa”, destaca Pablo Pacheco, cientista líder de florestas do WWF. Enfrentar o desmatamento é essencial para cumprir também as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e outros acordos globais.

Nove das 24 frentes de desmatamento estão na América Latina, uma região que experimentou um declínio particularmente dramático nas populações da fauna selvagem, da ordem de 94%, segundo a edição de 2020 do Living Planet Report. Outras oito estão na África e sete na Ásia-Pacífico. Quase metade dos ecossistemas nessas frentes (45%) sofreu algum tipo de fragmentação. Isso é alarmante porque os trópicos abrigam 45% das florestas do mundo, além de outros ecossistemas extremamente relevantes.

Em todo o mundo, a agricultura comercial, especialmente em larga escala, é a principal causa do desmatamento de áreas para pecuária e o cultivo de commodities. A mineração e a expansão da infraestrutura, tais como redes de estradas de ferro e rodovias, que conectam as zonas de produção aos mercados domésticos e de exportação, são outros dois importantes vetores.

Cenário brasileiro

Dados consolidados do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (NPE), indicam que a área desmatada na Amazônia brasileira chegou ao nível anual mais alto desde 2008: 11.088 km² entre agosto de 2019 e julho de 2020. No Cerrado brasileiro, onde vivem 5% dos animais e plantas do planeta, o desmatamento varreu um terço (32,8%) de sua área para a produção de gado e soja somente entre 2004 e 2017. Em 2020, o desmatamento desse bioma aumentou 13% com relação ao ano anterior.

“O Brasil tem duas frentes simultâneas entre as regiões mais devastadas do planeta”, destaca Edegar de Oliveira Rosa, diretor de Conservação e Restauração do WWF-Brasil. Segundo ele, o governo brasileiro relaxou as regulamentações e fiscalizações ambientais, com aumento da extração ilegal de madeira, garimpos ilegais e desmatamento.

Entre agosto de 2019 e julho de 2020, o Ibama aplicou o menor número de multas administrativas por desmatamento ilegal desde sua criação: 42% a menos que no período anterior, caindo de 3.403 para 1.964 autos de infração. “Desmatar para produzir commodities agropecuárias é uma ironia, pois já começa a afetar diretamente as safras e a qualidade das pastagens por causa da redução das chuvas”, diz Rosa.

Mariana Napolitano, gerente de ciências do WWF-Brasil, lembra que “a Amazônia brasileira está perto de atingir um ponto de inflexão, no qual a floresta não será mais capaz de manter seus ciclos e processos naturais, e as porções mais afetadas sofrerão diminuição das chuvas e períodos de seca prolongados.”

Segundo ela, a tendência de alteração do clima no país é reforçada pela destruição do Cerrado brasileiro, que desempenha um papel essencial no apoio ao ciclo da água no Brasil como fonte de oito das 12 bacias hidrográficas do país. O desmatamento contínuo pode reduzir a precipitação e aumentar as temperaturas locais, colocando em risco a vegetação remanescente, a subsistência e a produção de alimentos.

* Com informações do WWF Brasil

simonekafruni

Posts recentes

Mudança climática extinguirá principalmente espécies típicas

As mudanças climáticas podem extinguir espécies de plantas e animais nos lugares mais biodiversos do…

3 anos atrás

Reciclagem de vidro traz benefícios ambientais, econômicos e sociais

O vidro pode ser totalmente reaproveitado no ciclo produtivo, porém é necessário melhorar sua coleta…

3 anos atrás

Potes sustentáveis preservam o meio ambiente ao reduzir consumo de plástico

A Bio Mundo lança uma coleção de potes de vidro retornáveis, que visam reduzir o…

3 anos atrás

Energia eólica chega a 18 GW de capacidade instalada no Brasil

Dados de fevereiro de 2021 da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) mostram que o…

3 anos atrás

Campanha alerta investidores sobre aplicação em ouro da Amazônia

Consulta pública pretende colher subsídios para uma proposta de regulação, a ser apresentada ao Banco…

3 anos atrás

Instituto Nacional da Mata Atlântica comemora sete anos nesta sexta

Criado em 2014, o INMA incorporou o Museu de Biologia Prof. Mello Leitão, um dos…

3 anos atrás