Seja andando pelas ruas da capital Estocolmo ou percorrendo áreas remotas ao norte do país, na Suécia uma regra é clara: não importa se é jovem ou velho, rico ou pobre, o cuidado com o lixo produzido é uma preocupação de todos. O país escandinavo, que ocupa uma área menor que o estado da Bahia e cuja população soma pouco mais de 10 milhões de pessoas, é referência global em sustentabilidade e vem mostrando ao mundo que cuidar do seu lixo não é só uma prática que faz bem ao meio ambiente: agrada ainda mais ao bolso.
A grande sacada da Suécia foi colocar o cidadão como principal ator – e beneficiário – das ações de sustentabilidade. Assim, latinhas de alumínio e garrafas de plástico devolvidas ao supermercado garantem descontos em compras futuras. O mesmo vale para roupas velhas, que, uma vez entregues à loja para reaproveitamento, dão direito a descontos em roupas novas. Até o lixo produzido em casa vira dinheiro ao passar por processo de incineração em usinas de energia que abastecem as cidades. É um processo tão ecológico que até as cinzas produzidas nesse processo de queima do lixo acabam sendo também recicladas.
Para alcançar esse patamar de reciclagem, que chega a 99% de todo o lixo produzido no país, no entanto, os suecos partiram da premissa segundo a qual o que não é medido não pode ser gerenciado. O primeiro passo foi realizar a chamada gravimetria de resíduos sólidos, processo que permite verificar qual é o desperdício de comida. Com a técnica, por exemplo, é possível saber exatamente o que está sendo desperdiçado em alimentos, se casca de ovo, arroz, massas carnes etc.
Essa mesma metodologia foi posta em prática em um experimento realizado conjuntamente por pesquisadores suecos e brasileiros em Taguatinga-DF. Em novembro de 2019, durante um dia, todo o lixo de uma rota que passava por bairros residenciais foi triado, pesado e separado. Ficaram de fora, portanto, restaurantes, lojas e outros comércios, para que os pesquisadores pudessem avaliar, com maior precisão, apenas o lixo produzido pelas famílias de Taguatinga. E, embora os resultados encontrados não possam ser tomados como uma realidade de todo o país, a quantidade que comida jogada indevidamente no lixo foi considerada impressionante: nada menos que um terço dos alimentos jogados fora seria evitável.
A ideia do estudo era gerar informações confiáveis sobre o desperdício de alimentos para que o setor público pudesse propor ações para combater esse problema, segundo explica a pesquisadora Kelly Dalben, consultora sênior no Brasil da Agência de Proteção Ambiental da Suécia. “Hoje, no Brasil, a gente está no escuro. Não há dados específicos estruturados e abrangentes para saber qual é o desperdício de alimentos que temos nas capitais, porque o desperdício do brasiliense é diferente do carioca, que, por sua vez, é diferente do baiano. Com a metodologia sueco-brasileira de gravimetria, a ideia é medir esse desperdício para poder direcionar a resolução desse problema. Saber se é uma questão de embalagem, de distribuição. Então, essa diretriz ajuda também os gestores a fazerem escolhas, até para questões de compostagem, biogás, outras questões que derivam do resíduo alimentar”, diz Kelly.
A falta de dados a respeito do desperdício no Brasil é problema tão antigo e complexo quanto a própria perda de alimentos em si. Há dois anos, pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e da Fundação Getulio Vargas (FGV) já haviam feito um estudo que considerava outra abordagem para o desperdício. Durante um período, voluntários mandavam fotos de seus pratos após a refeição, para que pudesse se pudesse perceber o que não havia sido consumido.
A pesquisa com 1.764 famílias em todo o país identificou que o brasileiro joga fora cerca de 130 quilos de comida por ano, uma média de 41,6 quilos por pessoa. Os alimentos que mais vão para o lixo, por percentual do total desperdiçado, são: arroz (22%), carne bovina (20%), feijão (16%) e frango (15%).
A abordagem do estudo gravimétrico, no entanto, é no próprio lixo. Essa metodologia inclusive será utilizada novamente em um novo estudo que será realizado em 2021 nas feiras de rua de São Paulo. O estudo, conduzido por pesquisadores da Universidade de Boras, na Suécia, tem como objetivo produzir uma base de dados que será usada para treinar gestores públicos de prefeituras e governos municipais para lidarem com o problema do desperdício de alimentos no Brasil.
A ideia é que, de posses dados, os gestores possam implementar medidas que permitam ao país cumprir as metas do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), que prevê, entre outras coisas, o fim de todos os lixões no Brasil até 2024.
O desperdício de alimentos em um país onde milhões passam fome produz um paradoxo igualmente visto nos vizinhos sul-americanos. Dados mais recentes da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostram que, em toda a América Latina e Caribe, 11,6% dos alimentos são perdidos todos os anos. Isso equivale a 220 milhões de toneladas de alimentos, com uma perda econômica estimada em US$ 150 bilhões.
Só no Brasil, todos os anos, são quase 37 milhões de toneladas de lixo orgânico — basicamente, restos de alimentos. É quase 50% de todo o lixo recolhido no país.
O assunto é tão sério que levou a FAO a estabelecer este ano, em 29 de setembro, o primeiro Dia Internacional de Conscientização sobre Perda e Desperdício de Alimentos. O problema do desperdício também terá destaque no Innovation Weeks, evento global promovido pela Suécia para discutir ideias e soluções inovadoras em áreas como sociedade, tecnologia e meio ambiente.
No Brasil, como parte das Semanas de Inovação Suécia-Brasil 2020, a Embaixada sueca realizará no dia 17 de novembro um webinar sobre prevenção de resíduos alimentares. O evento vai reunir pesquisadores suecos e brasileiros para dividir experiências de ambos os países na prevenção do desperdício de alimentos. Este ano, por conta da pandemia, toda a programação será online e gratuita.
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