Os diálogos entre uma aliança política para reduzir o desmatamento no Brasil e setores do agronegócio estão avançando. Dois encontros de quatro agendados com a cadeia da soja já foram realizados. Nesta quinta-feira (27/8), ocorreu a segunda reunião com o setor pecuarista, que contou com participação de especialistas e autoridades brasileiras e chinesas. A China é o principal comprador da carne brasileira.
O evento virtual foi conduzido pela Aliança para as Florestas Tropicais (TFA, na sigla em inglês), plataforma que reúne múltiplos interessados no objetivo comum da busca e implementação de soluções para o combate ao desmatamento resultante de atividades comerciais em áreas de florestas tropicais. Fabíola Zerbini, diretora regional da TFA para a América Latina, explica que o objetivo final é erradicar o desmatamento associado à produção de commodities, mas ainda há muito a percorrer.
No Brasil, o foco tem sido nas cadeias de soja e gado. “Existem mecanismos para tornar a produção sustentável e responsável nas regiões do Cerrado e da Amazônia brasileira”, sustenta. “Tem se falado muito em ações e há comprometimento de representantes das cadeias. Uma das alternativas é o pagamento por serviço ambiental (PSA), porque, para o produtor produzir só em área aberta, tem um custo. E o PSA é uma estratégia nessa agenda de transição”, explica. “Sabemos que não é a bala de prata, não tem a intenção de resolver tudo. Outras iniciativas precisam ser combinadas”, diz. Os diálogos têm sido um canal de debate para encontrar soluções.
No diálogo desta quinta-feira, segundo Fabíola, o que ficou pactuado é que a China pode ser um bom driver para melhoria da pecuária brasileira no sentido da sustentabilidade. “O governo chinês participou e foi muito incisivo na questão da mudança do padrão de consumo, por conta da covid-19. A proteína tem que ter alta segurança sanitária, porque os protocolos vão ser cada vez mais rigorosos”, conta. Essa mudança de padrão, segundo a participante do Institute of Finance and Sustainability, Jieyi Liu, se reflete na compra e na perspectiva de investimento por parte dos chineses.
Do lado do Brasil, explica Fabíola, existe um movimento de modernização da pecuária, por conta da pressão dos clientes, consumidores, mídia e investidores. “A indústria vai, cada vez mais, trabalhar a transparência e o monitoramento. Amazônia e legalidade já têm uma ação setorial, dos grandes supermercados e três grandes frigoríficos. Mas cada empresa tem o seu programa de rastreabilidade”, destaca. O rastreamento permite identificar se o produtor do início da cadeia desmatou área ilegal para produzir.
Do que o país produz de carne, 20% são exportados e 80% ficam no mercado nacional. Desses 80%, 33% são consumidos pelas grandes redes Carrefour, Walmart e GPA (Pão de Açúcar, Extra, Compre Bem e Assaí). Porém, 67% são consumidos de forma difundida e é aí que está o perigo. “Por isso, essa modernização precisa ser concebida como projeto de Estado. A implantação do código florestal é ponto zero para isso”, ressalta a diretora da TFA.
De concreto, saíram da reunião desta quinta-feira três pontos principais, segundo a especialista. “A questão da regularização ambiental e fundiária é fundamental para dar segurança jurídica, junto com políticas sanitárias e de uso da terra, porque o mercado consumidor vai exigir, sobretudo no pós-covid-19”, pontuou. A segunda definição foi a dinâmica de investimento. “O investidor vê uma oportunidade na modernização. Mas precisa de outros mecanismos associados, como mercado de carbono neutro e pagamento por serviços ambientais”, explica.
Por fim, Fabíola diz que é necessário ampliar o debate para além da China, apesar de o país asiático ser o maior comprador de commodities do agronegócio brasileiro. “Temos que trazer essa discussão para a Europa, para a América e para o mercado nacional de forma a não ter impactos indesejados”, ressalta. Segundo a diretora da TFA, embora o entendimento de que o desmatamento deve ser contido seja um caminho sem volta, mesmo com a necessidade de ampliação da produção de alimentos, a perspectiva de soluções é de médio prazo.
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