Ambientalistas apresentam nove propostas para uma reforma tributária verde

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Reforma tributária verde: sugestões de 12 organizações, entregues à Frente Parlamentar Ambientalista, não ampliam carga tributária e contribuem para simplificar o atual emaranhado fiscal

A economia verde está em pauta no mundo todo e, no Brasil, a discussão é em torno da reforma tributária. Unir as duas coisas foi o que fez o grupo de trabalho (GT) da Rede de Advocacy Colaborativa (RAC) e que resultou no documento “Reforma Tributária Sustentável”, com nove propostas, entregue formalmente aos parlamentares coordenadores dasno  Frentes Ambientalista e de Economia Verde.

“Identificamos nove pontos-chave dentro do sistema tributário nacional que, se acionados, fazem girar as engrenagens que nos permitem transitar para uma economia de baixas emissões de carbono, gerando novos empregos e bem-estar à população e atualizando nossa política tributária para convergir com o Acordo de Paris e com a Política Nacional de Meio Ambiente, de Biodiversidade e de Povos e Populações Tradicionais”, destaca André Lima do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), que coordenou os trabahos do GT.

Segundo Lima, os pontos corrigem algumas das atuais distorções que geram ineficiência ao sistema tributário e impedem que o Brasil avance na rota da descarbonização que o mundo todo está seguindo. “A reforma tributária verde é necessária e urgente para o desenvolvimento do Brasil.  Estamos confiantes que ela avançará no Congresso para que o poder legislativo mais uma vez cumpra seu papel de defesa dos melhores interesses do país”, conclui.

Grupo de trabalho

O GT da reforma tributária sustentável Sustentável é composto por representantes da Rede de Advocacy Colaborativo (RAC), Avina, Centro Brasil no Clima (CBC), CDP, Instituto Clima e Sociedade (iCS), Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Instituto Ethos, Instituto Escolhas, Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Observatório do Clima (OC),Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS), WWF Brasil.

Tendo como ponto de partida elementos e diretrizes apresentados pelo economista Bernard Appy, o trabalho foi concluído as seguintes propostas: princípios tributários ambientais gerais; criação de um Fundo de Desenvolvimento Regional Sustentável; vedação de incentivos contrários à política de clima; devolução parcial do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) conforme redução da emissão dos gases de efeito estufa; criação do IBS sustentável; municipalização do Imposto Territorial Rural (ITR) e Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) Uso do Solo; imposto seletivo com externalidade ambiental clara; aperfeiçoamento da atual Cide Combustíveis para converter-se em Cide-Carbono ou a instituição de uma Cide-Ambiental; e maiores prazos para extinção de benefícios relacionados a atividades menos intensivas, neutras ou positivas em emissões de gases de efeito estufa.

Conheça cada uma das nove propostas

1) Princípios tributários ambientais gerais

Recomenda que, sempre que possível, os tributos levem em conta os princípios da prevenção, do poluidor-pagador, do protetor-recebedor e do tratamento tributário diferenciado conforme o impacto ambiental e climático dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.

2) Fundo de Desenvolvimento Regional Sustentável

Parte dos recursos arrecadados devem ser destinados a um fundo regional para incentivar atividades econômicas sustentáveis e reduzir desigualdades regionais e sociais. A ideia é garantir um mínimo de recursos destinados a atividades que promovam o desenvolvimento regional sustentável, o combate a desigualdades sociais e regionais e a integração nacional, bem como: ofereçam bens e serviços carbono-eficientes; sejam convergentes com as metas climáticas brasileiras; e beneficiem povos indígenas, populações tradicionais e agricultores familiares.

3) Vedação de incentivos contrários à política de clima

Trata-se de uma salvaguarda justificada pelo histórico dos incentivos fiscais concedidos pelo governo brasileiro e que têm favorecido o aumento expressivo das emissões de gases de efeito estufa (GEE) pelos setores de energia, da agropecuária e dos transportes. Por mais que a proposta de reforma tributária contida na PEC 45/2019 tenha como premissa a não concessão de qualquer benefício fiscal, não há como ter certeza, neste momento, se o texto original da PEC 45/2019 será alterado para eventualmente conceder benefícios tributários a determinados setores da economia. A título de exemplo: apenas no caso do setor de petróleo, gás e carvão, entre 2013 e 2017, foram R$ 309,36 bilhões por gastos tributários e R$ 33,33 bilhões por gastos diretos, segundo estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). A média anual de subsídios nesse período foi de R$ 68,6 bilhões por ano, ou 1% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Ao considerar somente o ano de 2018, o Brasil teria arrecadado R$ 22,89 bilhões a mais em impostos caso fossem retirados esses subsídios, mesmo mantendo-se o patamar atual de produção de petróleo.

4) Devolução parcial do IBS conforme redução da emissão dos gases de efeito estufa

Esta proposta parte do mecanismo de transferência de renda via devolução parcial do IBS recolhido pelos contribuintes de baixa renda, que já é previsto na PEC 45/2019. Assim como a devolução parcial do IBS a contribuintes de baixa renda é plenamente justificável, a devolução parcial do IBS recolhido sobre bens e serviços que contribuam efetivamente com a redução de emissões de gases de efeito estufa, por meio de mecanismos compensatórios análogos, também se justifica, e caberá à lei complementar instituidora do IBS definir os mecanismos e parâmetros para a referida devolução.

5) Criação do IBS sustentável

Este é um bom exemplo de como a tributação, e não só a isenção fiscal, pode ser usada para incentivar políticas e atividades econômicas. A proposta é premiar com uma parcela maior da arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços os municípios que alcancem bons resultados em preservação e conservação ambiental, em indicadores sobre a garantia de saneamento básico à população local, além de fomento à redução das emissões de gases de efeito estufa por suas empresas e produtores. Ou seja, não há qualquer incremento de carga tributária, nem de benefício fiscal a setores específicos. Trata-se apenas de uma melhor redistribuição e aproveitamento de recursos. Como o IBS Sustentável inspira-se no ICMS Ecológico, ele já pode ter por base uma metodologia de redistribuição de recursos aos municípios com 30 anos de sucesso e presença em 18 estados.

6) Municipalização do ITR e Cide Uso do Solo

Em seu modelo atual, o ITR é ineficaz como instrumento de arrecadação e em seus objetivos extrafiscais de induzir o uso produtivo da terra, além de ser inconsistente com a legislação ambiental. Por exemplo, a alíquota é fixada com base na área total do imóvel, incluindo as áreas de preservação. Por isso, um imóvel de 6 mil hectares (ha), dos quais 5,5 mil ha sejam preservados e apenas 500 explorados, pagará uma alíquota três vezes maior que um imóvel de 1 mil ha, dos quais apenas 200 ha sejam preservados e 800 ha explorados. A proposta de municipalização do ITR resolve o problema da baixa arrecadação e fiscalização do imposto sobre a propriedade rural, fazendo-o cumprir sua função fiscal. Para dar conta da função extrafiscal do ITR, o texto apresenta ainda a proposta da Cide Uso do Solo.

7) Imposto Seletivo com externalidade ambiental clara

A proposta da PEC 45/2019 já prevê a criação de um imposto seletivo federal, que incidirá sobre bens e serviços geradores de externalidades negativas, cujo consumo se deseja desestimular. Porém, por ser genérico, esse texto poderia alcançar, em princípio, qualquer produto ou serviço, sem ser, de fato, seletivo. Caberá à legislação infraconstitucional definir quais são os produtos e serviços cujo consumo se deseja desestimular, por meio da incidência do Imposto Seletivo federal, sem que haja, no entanto, qualquer norte dado pela Constituição. Ou seja, maior clareza é necessária, explicitando que a seletividade do imposto tem finalidade de “estimular ou desestimular o consumo de determinados bens, serviços ou direitos, em razão da necessidade e dos benefícios ao bem-estar da população ou de riscos à saúde pública, à segurança pública, à estabilidade climática e ao meio ambiente”, a ser regulado por lei ordinária.

8) Aperfeiçoamento da atual Cide Combustíveis para Cide Carbono ou Cide Ambiental

A proposta é manter o mesmo desenho constitucional da atual Cide Combustíveis, com alguns aperfeiçoamentos para que a legislação ordinária possa determinar: que a alíquota da Cide poderá ser diferenciada por produto ou uso em função de seu fator de emissão de GEE; e que os recursos arrecadados também serão destinados ao pagamento de subsídios relativos a combustíveis que reduzam as emissões dos gases de efeito estufa GEE do setor de transportes, bem como ao financiamento de programas de infraestrutura de transportes que preferencialmente reduzam as emissões de GEE do setor. O aperfeiçoamento da Cide-Combustíveis para calibrá-la como uma Cide-Carbono, com fatores de emissão de CO2eq (Dióxido de carbono equivalente). A proposta prevê, como alternativa à mera conversão da Cide Combustível, a criação de uma Cide com natureza mais amplamente ambiental, ou seja, uma Cide Ambiental, que incorpore também a tributação sobre as emissões de CO2eq.

9) Maior prazo para eliminação de incentivos concedidos a atividades menos intensivas, neutras ou positivas em emissões de gases de efeito estufa (GEE)

A proposta é que a eliminação dos subsídios aplicados ao consumo de bens e serviços de baixas emissões de GEE seja diferenciada no tempo em relação aos aplicados ao consumo de bens e serviços de maior intensidade em emissões de gases de efeito estufa, com algumas indústrias de energia, agropecuária e transportes, que vêm recebendo isenções e incentivos fiscais há décadas apesar de continuarem contribuindo para o aumento das nossas emissões de carbono. A premissa é que não é justo nem isonômico tratar de forma idêntica (com a eliminação de incentivos nos mesmos prazos e intensidades) os incentivos recentes dados a atividades sustentáveis, que são menos intensivas, neutras ou positivas em emissões de GEE – e que também são geradoras de renda, emprego e desenvolvimento social.

* Com informações do WWF Brasil

simonekafruni

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