O mundo e o Brasil ainda investem muito mais em energia fóssil do que em energia limpa. É o que aponta um novo banco de dados, coordenado pelo centro de pesquisa canadense International Institute for Sustainable Development (IISD) e lançado por uma rede internacional composta por 14 organizações de diferentes países. O Energy Policy Tracker descreve como os governos do G20 vêm apoiando o setor energético neste cenário de crise da covid-19 e servirá como um termômetro internacional para saber se as decisões quanto às políticas energéticas e seus comprometimentos financeiros tornaram-se ou não mais aderentes às diretrizes de sustentabilidade.
A plataforma classifica os investimentos em energia como “limpas”, “fósseis” e “outras”, de acordo com o tipo de energia que recebeu apoio governamental. Os primeiros resultados mostram que, entre o começo da pandemia no início de 2020 até 1º de julho, os países do G20 comprometeram US$ 135 bilhões em combustíveis fósseis, ante US$ 68 bilhões, ou metade dos investimentos, em energia limpa na criação de estímulos e pacotes de recuperação na economia (os números atualizados hoje estão no contador abaixo).
Essa discrepância foi um dos destaques do discurso do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, na cúpula sobre Transições para Energia Limpa da Agência Internacional de Energia, em 9 de julho.
“Por enquanto, a maioria das ações visando um Green New Deal – como estão sendo chamadas as tentativas de recuperação verde pelo mundo – ainda não passa de um discurso, pelo menos no setor energético”, afirma Livi Gerbase, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). No Brasil, o Inesc, em parceria com a Universidade de Columbia, será o responsável pelo monitoramento e inserção das informações sobre o país no Tracker. Veja as últimas informações do contador:
No caso brasileiro, até a publicação do Tracker, foram identificadas 27 políticas energéticas: 10 delas estão classificadas como “fósseis”; sete, como “limpas” e 10, na categoria “outras”. “É possível identificar o apoio ao setor de combustíveis fósseis”, lamenta Livi Gerbase. Se observados os comprometimentos financeiros quantificáveis, os valores mais altos foram para o setor elétrico, seguido pelos financiamentos para energias renováveis.
O Inesc também alerta sobre a necessidade de contextualizar o desempenho do Brasil no Tracker. “O país tem uma das matrizes energéticas mais renováveis do mundo. Todavia, a construção de grandes hidrelétricas, em especial na Amazônia, apesar de resultar em energia renovável, acaba causando sérios danos sociais e ambientais, indo contra a ideia de desenvolvimento sustentável”, explica. “O Tracker não olha para o que foi feito antes da pandemia.”
Outra ressalva sobre o Brasil está na manutenção por décadas dos incentivos fiscais aos combustíveis fósseis, que, segundo o Inesc, destinaram R$ 85 bilhões ao setor em 2018. A maior parte desse valor se refere à redução das alíquotas da contribuição social do Programa de Integração Social (PIS) para diesel e gasolina.
A assessora do Inesc lembra, ainda, que desde o início do governo Bolsonaro, vem havendo um desmantelamento das políticas socioambientais. “Nos cinco primeiros meses deste ano, houve uma queda no gastos orçamentário para o combate às queimadas, de R$ 17,4 milhões alocados em igual período no ano passado, para os R$ 5,3 milhões em 2020.”
“Enquanto a União Europeia vem defendendo uma recuperação econômica verde, o Brasil, um dos países mais afetados pelo vírus Sars-Cov-2, demonstra pouco interesse em priorizar a agenda ambiental nos planos de recuperação econômica, estendendo apoio ao setor de combustíveis fósseis”, conclui o Inesc.
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