A possibilidade de votação na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (20/5), do Projeto de Lei 2633/2020, que trata da regularização fundiária no país, provocou manifestações contrárias de ambientalistas, comunidades indígenas e quilombolas, artistas, ativistas, defensores dos Direitos Humanos e até organizações internacionais. Cartas dos parlamentos inglês e alemão foram endereçadas ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), lamentando o conteúdo do PL 2633, que, se aprovado, ameaçaria as relações comerciais entre os países.
Nas redes sociais, postagens de personalidades com milhões de seguidores, como a cantora Anitta, o ator Bruno Gagliasso e super modelo Gisele Bündchen, também criticam a proposta, por estimular a grilagem e a invasão de terras públicas, sobretudo na Amazônia. O premiado fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado promoveu uma campanha internacional, para captar assinaturas contra a aprovação do PL 2633.
Em reunião virtual nesta quarta-feira, várias lideranças de movimentos pelo meio ambiente pontuaram os perigos do PL 2633, cujo texto remete à MP 910/2019, que perdeu validade ontem. Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, disse que o texto não é sequer razoável. “Não existe acordo e tampouco é o momento para votar. O desmatamento está aumentando, estamos às vésperas da temporada de fogo, com mais violência às populações locais. Além disso, a sociedade quer debater a questão e a Câmara está remota”, enumerou.
Segundo Astrini, mais de 40 empresas da cadeia da soja e da carne estão dizendo que a votação do PL 2633, que se soma aos projetos antiambientais do governo Bolsonaro, são ruins para imagem do país e por isso ameaçaram boicotar os produtores do país. “A simples entrada da MP, que ficou válida por muito tempo, incentivou o aumento da grilagem dentro de áreas indígenas e de unidades de conservação. A repercussão internacional é muito grande”, explicou. Astrini argumentou, ainda, que o PL 2633 tem um componente novo que é a disputa pelo comando da Câmara, uma vez que o relator, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), é candidato à presidência.
A assessora jurídica da Terra de Direitos Maíra de Souza Moreira alertou que o Legislativo não está considerando uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) que constatou prejuízo de R$ 12 milhões em terras tituladas. “É muita contradição isso ser desconsiderado num momento em que se estabelece teto de gastos públicos em políticas sociais”, comentou. A advogada ressaltou que o Congresso está legitimando pautas que não poderiam ser discutidas neste momento. “O ato conjunto número 2, que estabeleceu que seriam votadas prioritariamente as pautas relacionadas à crise do novo coronavírus, está sendo descumprido”, disse.
O presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos, Renan Sotto Mayor, lamentou que o PL 2633 não vá passar pelas comissões, votado sem debate. “O tema é debatido há séculos, portanto não deveria ser votado com pressa. O PL representa a possibilidade de regularizar terras públicas que foram invadidas. Na visão do conselho, é uma grave violação aos Direitos Humanos possibilitar que pessoas que invadiram terras, cometendo crimes, sejam premiadas com os títulos das terras”, afirmou.
Para Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho e presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a temática é espinhosa e vai gerar mais violência no campo. “A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) é contra a votação neste momento”, destacou.
Denildo Rodrigues de Moraes, da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), reclamou que, se a votação do PL 2633 for realizada hoje, não terá dado tempo para que a sociedade tenha direito de se manifestar. “Ainda estamos chorando nossos mortos. As comunidades quilombolas têm 3 mil territórios na Amazônia, que se encontram em várias fases de regularização fundiária. Mas não é por falta de legislação, está na Constituição, em decretos e em decisão do STF. Falta vontade política”, sustentou.
A batalha contra o PL 2633, de acordo com Luiz Zarref, do Movimento Sem Terra (MST), não é apenas entre ambientalistas e agronegócio. “É uma defesa pela vida do movimento de Direitos Humanos, de setores do próprio agronegócio, da pastoral da igreja. O aumento do desmatamento tem conexão direta com a MP, porque ela estimulou esse processo. Inúmeras terras públicas já estão sendo ofertadas. Não é o momento de se debater o PL. Não se resolve magicamente um problema de 500 anos”, defendeu.
Zarref fez uma comparação entre a pressa para votar o PL 2633 e a morosidade para aprovar pautas emergenciais de combate à pandemia. “Para dar o auxílio emergencial demora e, para aprovar esse PL, vai ser a toque de caixa. Por quê?”, questionou. “Esse processo, autoritário, de votação sem debate popular, vai abrir a porteira. Se este passar, vários outros PLs sem relação com a crise do coronavírus virão”, preconizou.
Para o líder do MST, a possibilidade de qualquer instituição fazer auditoria e até de autodeclaração, dependendo da área a ser titulada, vai favorecer a grilagem. “Temos 300 milhões de hectares de terras públicas não destinadas, o que não quer dizer que não estejam ocupadas, estão ocupadas por terras indígenas, comunidades tradicionais que estão lá há séculos. Os latifundiários expulsam essas pessoas dos territórios e vão ganhar o documento à custa de desmatamento e sangue”, criticou. “O que não se resolve desde 1822, querem transformar de forma mágica durante uma pandemia”, acrescentou.
Procurado, o deputado Marcelo Ramos, relator do PL 2633, afirmou que a proposta difere completamente da MP 910, que permitia vistoria por sensoriamento remoto até 15 módulos fiscais (na Amazônia cada módulo representa 100 hectares). “O PL estabelece limite de 6 módulos. A MP tinha necessidade de comprovação para pedir titulação a partir de 2014. No PL, o marco é junho de 2008. Quem invadiu de lá para cá não pode pedir”, comentou.
Segundo o parlamentar, o PL 2633 veda a possibilidade de titulação para quem comprou a terra de quem ocupou antes de 2008 e a vendeu, o que configuraria a grilagem. “Vou atacar os quatro argumentos que quem é contra”, disse o deputado. “Não estimula a grilagem porque estabelece que só pode ser titulado quem está no módulo de forma mansa, pacífica e produtiva. Tem que provar que está plantando na terra”, pontuou.
Sobre o segundo argumento, de que o PL vai estimular a devastação ambiental, Ramos destacou que as áreas tituladas tem 130% menos desmatamento. “É condição para titular provar que vai recompor reserva legal, reflorestar a reserva se tiver desmatado. Hoje o que estimula a queimada é que os órgãos prendem quem está desmatando mas não quem é o dono da terra, porque não se sabe quem é. Se for identificado, vai ser preso e perder o título”, justificou.
“Também não estimula invasão em terra indígena, quilombola ou unidade de conservação, porque se estiverem em processo de regularização a titulação é suspensa e bloqueada”, continuou. Para quem sustenta que o PL não pode ser votado na pandemia, o deputado também tem uma justificativa. “Quem defende isso ignora o pequeno agricultor, para quem a legislação se destina. Eles também são vítimas da crise atual. Se ajudamos o pequeno empresário e os informais, por que não podemos ajudar o pequeno agricultor? Só com título da terra eles terão acesso ao crédito e aos programas governamentais”, completou.
Conforme o parlamentar, 109 mil agricultores e produtores têm até 6 módulos fiscais e 75 mil, até um módulo.
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