Tensão de curto prazo não deve afetar política monetária, diz Campos Neto

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

HAMILTON FERRARI

Questionado sobre os últimos empasses políticos, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse, em sua primeira entrevista à imprensa nesta quinta-feira (28/3), que as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) e os debates internos sobre a condução da política monetária abstraem as tensões políticas e a volatilidade do mercado financeiro de curto prazo. Ao avaliar os itens de risco para a elaboração dos cenários:  ociosidade, ambiente externo e agenda de reformas, Campos Neto reconheceu que há divergências entre os integrantes da diretoria do BC sobre “o peso de cada um desses fatores”.

De acordo com ele, a nova gestão do BC evitou mudar a forma como vinha atuando em relação às decisões de política monetária  e, por isso, não alterou a Selic (taxa básica de juros) na última reunião do Copom. “Houve enorme ganho no passado recente com essa política de tentar abstrair o ruído do curto prazo”, afirmou. “Tivemos a preocupação de manter a narrativa que tinha sido descrita anteriormente. E olhar os três fatores que têm sido determinantes”, adicionou.

Campos Neto admitiu, no entanto, que os três fatores de risco têm apresentado volatilidade recente diante do aumento das incertezas no cenário político. Mas ele acrescentou que caberá ao BC fazer a análise do balanço desses componentes na próxima reunião do colegiado.  “O Comitê tenta se abstrair da frequência do mercado. Temos momentos de incertezas, tanto na parte externa quanto na parte de reformas. Vamos sempre reavaliar e atuar quando for necessário”, afirmou.

Na última reunião do Copom,  a taxa Selic foi mantida em 6,5% ao ano, o menor patamar da história. A decisão foi unânime entre os diretores do BC, mas Campos Netos ressaltou que houve discordâncias em relação ao peso dos fatores de risco. Apesar de manter os juros, o BC alterou o balanço de risco de assimétrico para simétrico. “Nós tivemos opiniões diversas que levaram a uma conclusão que o cenário de risco mais simétrico. Houve opiniões distintas em relação aos elementos, mas, que, no entendimento final, chegamos à conclusão de que está simétrico. Mas não temos como mencionar qual foi em qual fator específico que pesou mais nessa decisão”, disse.

 

Previdência

Sobre a nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Previdência, enviada ao Congresso em fevereiro, o presidente do BC afirmou que não tem como quantificar ou fazer uma tese em relação aos prazos de aprovação do texto, mas ressaltou que o tema é fundamental para reequilibrar as contas públicas. Na avaliação de Campos Neto, ainda que, se o Congresso der o aval à proposta, a reforma poderá proporcionar um aumento de credibilidade que pode influenciar a taxa estrutural de juros.

Ontem, durante audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o ministro Paulo Guedes disse que Selic poderá cair entre 1 e 2 pontos percentuais com a aprovação do texto foi enviado ao Legislativo, prevendo uma economia de R$ 1,1 trilhão em 10 anos. Com isso, a Selic poderia chegar a 4,5% ao ano. Campos Neto evitou concordar com essa previsão e disse que o BC vai tomar a decisão que “precisar tomar”, com base no balanço de riscos. “Ele (Guedes) respeita muito isso, inclusive, e defende sempre uma atuação independente do BC”, afirmou o presidente. “O que é importante enfatizar é que as reformas são importantes para a taxa estrutural de longo prazo”, completou.

Sobre o prazo para aprovação da reforma, com base na estimativa de 2% para o crescimento econômico, Campos Neto ressaltou que o BC não tem como fazer uma previsão sobre isso, mas alegou que Guedes “está fortemente empenhado” para conseguir avançar com o tema no Congresso Nacional.

 

Novo debate

 

Ao ser questionado sobre o novo debate que vem sendo feito pelo economista André Lara Resende, que vem jogando a responsabilidade pelo baixo crescimento da economia à falta de atuação mais firme do Banco Central na condução da política monetária, porque a Selic está acima da taxa de juros estrutural, e, portanto, o BC precisaria reduzir os juros para estimular mais a atividade, Campos Neto, evitou fazer comentários. Apenas disse que trata-se de “um trabalho embrionário” e uma “tese que não cabe ser explorada”.

Coube ao diretor de Política Econômica, Carlos Vianna, elaborar mais sobre o assunto. “É um debate acadêmico válido, que pode ser produtivo, mas é mais apropriado para a academia do que na política monetária, que requer consolidação fiscal e reformas que a gente vem comunicando. O principal vetor pelo qual a política fiscal importa é na expectativa de longo prazo da dívida pública”, completou.