“Não existem processos parados na CVM”, diz presidente Leonardo Pereira

Publicado em Economia

POR ANTONIO TEMÓTEO

Com pouco mais de seis meses para o fim de seu mandato a frente da presidência Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Leonardo Porciúncula Gomes Pereira diz que ainda não é hora de fazer um balanço de sua gestão. Está empenhado em cumprir as metas definidas no planejamento estratégico que criou em 2013. De lá para cá 53 Instruções Normativas foram editadas para aperfeiçoar os processos de fiscalização da autarquia.

Somente em 2016, 65 processos sancionadores foram julgados e 13 Termos de Compromisso (TC) foram arquivados. Além disso, o colegiado analisou 85 propostas de TC, dos quais 29 foram aceitos e 56 rejeitados. Conforme Pereira, durante sua gestão, a idade média dos processos diminuiu diminuiu de 11 para dois anos. O mesmo ocorreu com o tempo médio dos inquéritos administrados. A redução de sete para três anos. E o tempo médio dos processos que aguardam instauração de inquérito diminui de sete para um ano.

Confiante na retomada da economia brasileira e no papel do mercado de capitais nesse processo ele afirma que que a CVM está preparada para a volta do apetite dos investidores por ativos brasileiros e para acompanhar ofertas iniciais de ações. Sobre as críticas a suposta vista grossa da pasta para a corrupção investigada pela Operação Lava-Jato ele afirma que o trabalho tem sido feito.  Contra a Petrobras tramitam na autarquia seis inquéritos administrativos em fase de instrução, quatro processos administrativos já com acusação formulada e outros nove processos administrativos estão em análise. A seguir, os principais trechos da entrevista.

A CVM tem um papel apagado na Operação Lava-Jato que investiga corrupção na Petrobras, a principal estrela da Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa)?

Na questão de corrupção especificamente, não está no mandato da CVM. Nosso dever é assegurar a atuação dos administradores para que divulguem ao mercado informações de maneira correta e mantenham seus controle internos adequados. Agora, em relação a corrupção, nós temos que trabalhar junto com outros órgãos. E nós estamos trabalhando junto com o Ministério Público nesta questão. Nós temos quatro processos contra a Petrobras que já tem um relator designado e, inclusive, nas próximas semanas já podem começar a serem julgados. Temos seis processos de inquéritos administrativos que estão sendo investigados, em fase  adiantada, e nove procedimentos de análise que são basicamente questões contábeis e questões de auditor.

Como é atribuição da CVM fiscalizar todas as demonstrações contábeis das estatais, no caso da Petrobras, não era possível identificar algum indício de corrupção essas análises eram feitas?

As demonstrações tinham sido analisadas por auditores. Só a partir do momento que se tem uma denúncia a CVM atua. A questão é o que os indícios de corrupção estavam por atrás da contabilidade. O orçamento era feito e lançado, mas você tinha que verificar esses dados dentro da área de controle internos da Petrobras. Não é mandato CVM intervir em empresa. A partir do momento em que se tem uma denúncia podemos atuar. Temos inquéritos, por exemplo, sobre as refinarias de Pasadena e de Abreu e Lima.

Além da Petrobras, outras empresas envolvidas com a Lava Jato são investigadas pela CVM?

Sim, as empresas de capital aberto, mas há muitas empresas envolvidas neste imbróglio que não tem capital aberto. Então, a CVM não vê a Odebrecht, por exemplo. Ela não pode estar na nossa atuação, porque não é uma empresa de capital aberto.

Então, o papel efetivo da CVM na Lava Jato é a Petrobras?

É, eventualmente pode ser a Brakem. Ou se algum problema for identificado na Eletrobras, a CVM vai apurar. Recentemente julgamos o caso do Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil. Teve um inquérito, um processo e foi julgado.

Quais são as lições que a CVM tirou da Lava Jato? Foi possível melhorar mecanismos? Vocês perceberam que havia uma sofisticação muito grande das ações de corrupção?

Meu comentário vai ser em relação à todas as empresas abertas. Nós temos insistido muito na nossa supervisão de fiscalização das empresas, que elas tenham estruturas de controles internos não de prateleira, e que esses processos sejam acompanhados pelo controle de administração. Nós temos vários, no nosso plano de supervisão, que é público, várias coisas sobre estrutura interna.

Quais são os desafios da CVM de agora para frente, na perspectiva da retomada da economia brasileira?

Nós aproveitamos que a economia está nesse processo de transformação para alterar várias normas e tentamos fortalecer as que falam a governança das empresas, de investimentos entre outros temas. Então, nós aperfeiçoamos as normas nos últimos anos. A instrução nº 480, por exemplo, que fala como a empresa tem que divulgar suas informações para os investidores é um caso. Outra coisa, nós tivemos uma reforma ampla na questão dos fundos de investimentos, que é a instrução do nº 409. Nós fizemos uma nova regra e totalmente atualizada sobre os fundos de investimentos, a instrução nº 555. Temos feito, também, uma supervisão e divulgado o papel e responsabilidade dos auditores em estarem capacidades. Se pegar todas as instruções, de 2013 para cá, foram mais de 30. Esse momento de mercado é um momento transitório. O Brasil ainda é uma das maiores economias do mundo e o mercado de capitais tem um potencial muito grande. Então a gente quer deixar o mercado de capitais pronto para quando tiver uma estabilidade na economia e os investidores se sintam dispostos, novamente, a investir.

Então o senhor avalia que a CVM está preparada para a retomada do apetite dos investidores?

A gente tem uma instrução, que é a nº 476, que é muito importante, que a gente possibilitou que as empresas acessem o mercado de capitais de forma mais rápida com esforços de distribuição restritos. O que é isso: em vez de fazer uma distribuição ampla, pode fazer uma distribuição mais rápida com um número limitado de investidores. E isso está fazendo muito sucesso.

Dentro desse ambiente de crise econômica e corrupção, houve uma redução muito grande de investidores pessoas físicas da bolsa diante das frustrações com ofertas de acões ou escândalos. Você acredita que esse público vai voltar para a Bolsa?

A gente acredita que sim, isso porque nós fizemos um trabalho muito grande em 2012 e 2013 para pequenas e médias empresas. Sempre pensando nos investidores, porque quanto mais empresas indo para o mercado, o investidor tem mais opções. Eu vejo, no Brasil, um aumento da classe média, onde as pessoas vão viver mais. Os brasileiros estão preocupados com a sua aposentadoria, então, é natural que o mercado de capital seja um dos meios para formação de poupança.

Em relação à Operação Greenfield que investiga fraudes em fundos de pensão ficou claro que vários investimentos estruturados não geraram os resultados esperados e há indícios de fraude. A CVM atua nesses casos?

Um dos focos de supervisão é a área de fundos, justamente atualizar e assegurar que tenham gestores capazes e credenciados que estejam cientes de suas responsabilidades.

O seu mandato termina em julho. Há possibilidade de renovação? Você tem interesse em ficar?

Não, porque é um mandato de cinco anos e não há possibilidade de ser renovado.

Quais serão os focos da sua gestão nos próximos seis meses até o fim do mandato?

Fizemos um plano estratégico com diversas transformações. Eu diria que a CVM passou por diversas alterações silenciosas nos últimos anos. Então, as pessoas vão sentir cada vez mais a CVM mais focada e empenhada, apesar de todas as restrições que existem em termo de poder fazer concursos e etc. ara se ter uma ideia, a idade dos processos aguardando a instauração de inquérito diminuiu. Agora, o tempo de espera foi reduzido de sete para um ano de 2013 para cá. Isso é resultado de um planejamento estratégico que criamos em 2013 e percebemos alguns problemas que precisavam ser resolvidos

O senhor falou na questão dos concursos, há um déficit de mão de obra na CVM?

Nós temos 600 posições aprovadas e a gente acredita que, baseado nas aposentadorias, que no final de 2017 a gente pode ter um déficit de pessoa de cerca 28%.

Há perspectiva de concursos no curto ou médio prazo? Houve algum pedido ao orçamento?

Eu acho que não, porque concurso tem que está no orçamento. Nós vamos ter uma discussão até maio para quando tivermos discutindo o orçamento de 2018. Foi pedido, há dois anos, mas não foi aceito.

A redução em 0,75 ponto percentual da taxa de juros animou o mercado, com a valorização de ativos na bolsa. O senhor também está confiante na recuperação da economia?

Eu não posso emitir minha opinião sobre questões de políticas econômicas. Eu tenho certeza que o mercado de capitais alavanca o crescimento econômica. Nós temos um mercado com muito potencial e todos os instrumento para ter um mercado de capital forte e sustentável.

Há vários processos que investigam políticos na CVM e estão parados…

Não existem processos parados na CVM. Nós reduzimos o tempo médio de análise dos processos de 11 anos para dois anos. Os inquéritos reduzimos de sete para três anos. Então não tem nada parado. Existem metas em todas as instâncias da CVM para reduzir o tempo de espera por julgamento. Tudo isso pode ser acompanhado. São dados públicos. Percebemos, com isso, que se tem mais transparência do que se tinha antigamente. Nós entendemos que a sociedade cobra mais transparência.