Em seis meses, Congresso custou R$ 4,6 bi para não fazer quase nada

Publicado em Economia

ALESSANDRA AZEVEDO E MURILO FAGUNDES

Há uma semana do recesso parlamentar, o balanço das atividades no Congresso Nacional no primeiro semestre de 2018 deixa a desejar, mas não surpreende. O gasto da Câmara dos Deputados e do Senado para manter congressistas, servidores e estrutura foi, como sempre, bilionário — pelo menos R$ 4,6 bilhões até junho, de acordo com levantamento feito pelo Correio — cifra que, para especialistas, não faz jus ao desempenho dos representantes da população, que é quem paga essa conta.

 

Se os parlamentares seguirem o ritmo, a próxima metade do ano também será mal empregada. Nas 48 sessões deliberativas (ou seja, com votações) feitas até agora no Senado, foram aprovadas 33 matérias. Com apenas sete sessões abertas para discutir projetos, o pior mês na Casa foi junho, que é tradicionalmente fraco pelas festas juninas, mas este ano também sofreu reflexos da Copa do Mundo e das eleições, que dispersam os parlamentares para suas bases, longe de Brasília. No mesmo mês do ano passado, por exemplo, o Senado teve o dobro de sessões deliberativas.

 

Devido à eleição, em outubro, a expectativa é que a atuação continue sendo “pífia” depois do recesso, como descreveu o analista político Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, em relação ao observado no primeiro semestre. Professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer acredita que a aprovação do Orçamento, em novembro, deve ser o movimento mais importante dos parlamentares no semestre que vem, já que eles terão pouco tempo devido às campanhas.

 

Boa parte do escasso tempo que os parlamentares passaram no Congresso este ano foi empregado em discursos, em sessões não deliberativas, sobre questões como a greve dos caminhoneiros, entre maio e junho, ou em discussões sobre segurança pública, especialmente nos primeiros meses do ano. Do ponto de vista da segurança pública, eleito o assunto prioritário pelo governo assim que enterrou a reforma da Previdência e decretou a intervenção federal no Rio de Janeiro, no início do ano, o que se conseguiu foi aprovar a criação do Ministério da Segurança Pública e do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), além de projetos menos complexos, como os que endurecem penas para alguns tipos de crimes. As duas principais medidas ainda precisam de regulamentação.

 

Já outros projetos da lista de itens prioritários do governo, anunciada em janeiro, como privatização da Eletrobras, autonomia do Banco Central e extinção do fundo soberano, seguem empacados. Alguns já no formato de projeto de lei ou Medida Provisória (MP), outros ainda no plano das ideias, sem muitas chances de irem para o papel este ano. Queiroz, do Diap, citou a saída de vários ministros, a desorganização do governo e a disputa entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) como fatores que prejudicaram o avanço da atividade parlamentar. “Do ponto de vista fiscal, foi aprovada a reoneração da folha de pagamentos, única matéria relevante”, avalia.

 

Caminhoneiros

 

A reoneração, no entanto, só foi tocada, e às pressas, devido à greve dos caminhoneiros, que paralisou o Brasil por 11 dias e virou o principal assunto não só nas ruas, mas também no Congresso. A matéria foi aprovada em um momento em que Legislativo e Executivo precisaram juntar forças para fazer o país, literalmente, voltar a andar. Para garantir a aprovação, teve que deixar de reonerar alguns setores — inclusive do transporte de cargas, ponto assinado no acordo com os grevistas. Além disso, a arrecadação esperada, de R$ 3 bilhões este ano, será destinado integralmente para bancar a prometida subvenção ao óleo diesel, o que garante os R$ 0,46 de desconto no combustível na bomba.

 

Mas, embora a reoneração tenha sido aprovada para fazer frente a parte dessa nova despesa, a MP 838, que institui a subvenção ao diesel, ainda está na fase inicial de discussão do assunto, na comissão mista. Não há perspectiva de que seja votada pelo colegiado nesta última semana de trabalho antes do recesso, já que a agenda da comissão está vazia. Na semana passada, o presidente, senador Dário Berger (MDB-SC), adiou, sem estipular uma nova data, a segunda audiência pública do colegiado, que seria na tarde da última quarta-feira. A apresentação do relatório, que ainda precisará passar pelos plenários da Câmara e do Senado, segue indefinida.

 

Outra MP voltada para as demandas dos caminhoneiros está mais avançada. Aprovada na semana passada pela comissão mista, a MP 832, que trata da tabela de frete mínimo, está pronta para ser pautada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Um acordo tem sido costurado entre lideranças partidárias para que a votação possa acontecer tanto na Câmara como no Senado antes do recesso — ou seja, entre terça e quarta-feira, antes da votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), pautada para às 13h de quinta-feira pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (DEM-CE), que preside a sessão conjunta do Congresso. O receio é de novas paralisações, ameaça que já foi proferida por caminhoneiros que acompanham o andamento da matéria.

 

Como toda medida provisória, os textos em questão já estão em vigor — começam a valer assim que publicados no Diário Oficial da União (DOU) —, mas dependem de aprovação do Legislativo para que sejam consolidados definitivamente na legislação. Além da MP 838, outras 12 medidas provisórias ainda estão na fase inicial de tramitação, nas comissões mistas. Entre elas, a que extingue o fundo soberano, uma das prioridades do governo, e a que prevê recursos para o Fundo Nacional de Segurança Pública. Essas duas não estão no radar para os próximos dias, e devem ficar para o semestre que vem.

 

Outras nove MPs, além da que trata do frete, já passaram pelas comissões e aguardam votação na Câmara. Uma delas, a MP 824, está na pauta desta semana e ainda tem chances de ser votada pelos deputados nesta semana, até pelo conteúdo pouco controverso. A medida evita a perda do lote de projeto público de irrigação para o poder público se estiver hipotecado perante banco oficial devido a financiamento ligado à plantação irrigada. Outra que pode ser analisada é a MP 827, que muda dispositivos relativos à jornada de trabalho dos agentes comunitários de saúde e de combate às endemias. O resto está esperando a comissão mista ou a sanção do presidente.

 

Também podem ir para a frente nesta semana, na Câmara, o projeto de lei que viabiliza a privatização de seis distribuidoras de energia controladas pelas Eletrobras, que tem sido discutido nas últimas sessões; as mudanças (destaques) no texto que torna automática a inclusão de consumidores no cadastro positivo; e o projeto que regulamenta a criação e fusão de municípios.

 

Cessão onerosa fora da pauta

 

O projeto da cessão onerosa, que permite a revisão de um contrato firmado entre a União e a Petrobras, em 2010, que concede à estatal a exploração exclusiva de 5 bilhões de barris de petróleo da camada pré-sal na Bacia de Santos, concluído na quarta-feira na Câmara, não deve ser prioridade no Senado. Essa foi a sinalização do presidente do Senado, Eunício Oliveira (DEM-CE), que pautou a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) na quarta-feira, às 13h, pelo Congresso Nacional. Na prática, quando a LDO é votada, os parlamentares já entram em recesso. As opções seriam pautar a cessão onerosa na terça ou na quarta-feira de manhã.

 

Eunício, entretanto, ainda não pautou o PL da cessão onerosa. Por enquanto, a sessão deliberativa do Senado, marcada para as 11h de quarta, prevê a votação de algumas propostas pendentes, como o regime de urgência para o projeto de lei que permite a readmissão ao Supersimples das empresas excluídas por dívidas tributárias. A agenda pode mudar até lá e ele pode incluir outros itens a qualquer tempo, mas Queiroz acredita que, nesta última semana de expediente, os parlamentares não devam ir muito além, mesmo com a possibilidade de sessão na terça, com a desclassificação do Brasil da Copa do Mundo. “Por não ter jogo da Seleção, algumas matérias podem andar. Mas os parlamentares vão, no máximo, além de concluir a LDO, tratar das MPs e concluir as matérias aprovadas”, diz o analista.

 

A agenda anunciada por Eunício atrapalha a do governo, que conta com a votação da cessão onerosa o mais rápido possível, para poder fazer um megaleilão de petróleo que pode garantir até R$ 100 bilhões para os cofres públicos ainda em novembro. Não é a primeira vez que Eunício frustra os planos do presidente Temer. Com a mesma estratégia, inclusive. No fim do ano passado, ao votar a Lei Orçamentária Anual (LOA), o que liberou os parlamentares para o recesso de fim de ano, ele minou qualquer chance de votação da reforma da Previdência.

 

O autor do projeto, deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), diminuiu o impacto de não se votar o projeto da cessão onerosa no Senado ainda este semestre. Para ele, “não seria tão grave” deixar para depois do recesso. “A Câmara fez o seu papel. Agora, o Senado tem o direito de discutir também”, observou. O recesso “de apenas duas semanas”, segundo o deputado, não deve atrapalhar o andamento do tema.

 

Brasília, 20h53min