Correio Econômico: Incertezas das eleições afundam a economia

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As chances de recuperação da economia a curto prazo estão cada vez menores. Esperava-se que o segundo semestre do ano fosse um período mais promissor para o consumo e a produção, mas todos os números coletados até agora por especialistas mostram que o ritmo da atividade está no chão. As incertezas em relação às eleições ajudaram a minar as possibilidades de uma reação. O Brasil está seriamente doente.

 

Na visão do economista-chefe do banco suíço UBS, Tony Volpon, com base em todos os indicadores disponíveis, é possível afirmar que o Brasil ainda não saiu da recessão. Tecnicamente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) garante que o país voltou a crescer, ainda que muito lentamente. Mas, todos os sintomas de uma profunda recessão, iniciada em 2014, estão presentes quando se avalia a evolução da atividade. Pelos cálculos do economista, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu, em média, 3,5% ao ano entre 1993 e 2010. De 2011 a 2017, o avanço foi de apenas 0,5%. Ou seja, nada.

 

“As incertezas das eleições agravam ainda mais a crise econômica. Indicadores mostram que o Brasil continua mergulhado na recessão e que o próximo presidente dificilmente conseguirá fazer o país crescer mais rapidamente”

 

Volpon explica que o conceito de grande recessão foi criado em 2008, quando o mundo afundou depois do estouro da bolha imobiliária dos Estados Unidos. Mesmo com os bancos centrais das principais economia do planeta tendo jogado as taxas de juros para próximo de zero, ou praticado juros negativos, o crescimento não voltou na velocidade esperada. Isso pode ser visto, sobretudo, por meio dos elevados níveis de desemprego na Europa.

 

No Brasil, a despeito de a taxa básica (Selic) estar no menor nível da história, 6,50% ao ano, as vendas do varejo voltaram a encolher — em julho, caíram 0,5%, quando todo mundo esperava alta. Os consumidores estão receosos em comprar a prazo temendo perderem o emprego mais à frente. Já os bancos reduzem o crédito à clientela diante do risco de calote. Sem crédito, as engrenagens da economia permanecem travadas. Quadro ainda pior se mostra no setor de serviços, que tombou 2,2% em julho.

 

Populismo

 

Volpon está convencido de que, dificilmente, o presidente eleito em outubro próximo terá condições de impulsionar o crescimento a partir de 2019, tamanho o estrago que se fez na economia. Para que o PIB cresça acima de 3% ao ano, será preciso um compromisso do governo com amplas reformas. Contudo, nenhum dos três candidatos mais bem posicionados nas pesquisas — Jair Bolsonaro (PSL), Fernando Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT) — demostra compromisso real com os ajustes que precisam ser feitos. Não por acaso, as projeções para os indicadores econômicos mostram um país em grave crise.

 

Nos cálculos do economista do UBS, que foi diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, levará pelo menos 20 anos para que o Brasil volte a ter uma relação mais saudável entre a dívida pública e o PIB. A perspectiva é de que esse indicador, que está em 77%, continue crescendo, atingindo seu pico, de 82% do PIB, em 2022. Essa situação, no entanto, pode piorar se o próximo presidente abrir mão do teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior. Há, ainda, outro complicador: a Previdência Social, que está consumindo um volume cada vez maior de recursos. Sem uma reforma do sistema de pensão e aposentadorias, o teto dos gastos implodirá antes mesmo que o governo tente derrubá-lo.

 

“O ideal, portanto, é que o futuro presidente faça o dever de casa”, diz Volpon. Contudo, se prevalecer o populismo propalado por alguns candidatos, o que já está ruim poderá ficar ainda pior. “Sempre pode piorar. Veja o caso da Argentina”, ressalta o economista. O país vizinho elegeu um presidente apoiado pelo mercado financeiro. Mas, ao optar por um ajuste gradual das contas públicas e aceitar uma inflação alta demais, o governo argentino alimentou as desconfianças que o levaram a jogar as taxas de juros para 40% ao ano e a pedir socorro ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

 

Estelionato

 

Para Volpon, a se confirmar um segundo turno entre Bolsonaro e Haddad na disputa presidencial, qualquer um dos dois que vencer as eleições dará um estelionato eleitoral. Ele lembra que o candidato do PSL diz que não precisará do Congresso para fazer o que precisa ser feito. Mas, ele sabe que terá que fechar acordos que lhe garantam a governabilidade. No caso de Haddad, boa parte do programa econômico defendido por ele ficará apenas no discurso eleitoral. O petista sabe que a promessa de uma política intervencionista é apenas para agradar aos eleitores de seu partido. No Palácio do Planalto, optará pelo pragmatismo.

 

O economista admite, ainda, que o fantasma do impeachment acompanhará de perto o futuro presidente. Portanto, será preciso que o governo não flerte com estripulias, como fez Dilma Rousseff. É importante ressaltar, também, que possíveis erros na gestão do país vão custar caro para a população. O desemprego aumentará, assim como as desigualdades sociais. Como mostrou o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o desastre econômico dos últimos anos fez com que o país ficasse estagnado na 79ª posição do ranking que mede o índice de bem-estar, atrás da Venezuela, um país em colapso. Sinal mais eloquente não há.

 

Brasília, 06h41min